Guilherme Belido Escreve - SOS presidente
18/08/2018 15:44 - Atualizado em 21/08/2018 13:41
Num olhar menos superficial e imediatista, não constitui absurdo o entendimento de que poucas vezes em nossa história política o Brasil precisou tanto de um presidente lúcido, capaz e determinado a recolocar o Brasil nos trilhos, quanto agora.
Diria que dos anos 50 para cá (já exagerando no recuo de tempo) o momento atual reflete a quarta vez em que essa necessidade – a de ter um grande presidente – emerge com força incomum.
Nem precisa dizer, em tese cada pleito busca o melhor candidato. Ou, dizendo diferente, se deveria buscar. E isso vale para o Brasil ou qualquer outro país, muito embora na prática a teoria seja bem outra.
Mas, voltando ao tema central, de alinhar quase sete décadas com o tempo presente, o leitor há de estar boquiaberto com o disparate do titular em não enxergar que ao longo de 68 anos o Brasil atravessou crises políticas mais graves e agudas que a do momento e em número superior a ‘apenas’ quatro.
Explico: ocorre que em algumas épocas de instabilidade já instaladas ou iminentes, não houve, no tempo devido, como abortá-las ou reverter quadro já desenhado; bem como em outras, o cenário desfavorável se mostrara irreversível. Daí que as tais quatro oportunidades – somando com esta – foram para evitar terra arrasada ou de futuro infértil.
Em 1954, crise poderia ser pior
Não se está aqui a montar um castelo de areia, fazendo parecer verdades esculpidas em pedra. Ao contrário, apenas uma análise plausível. Vejamos:
Getúlio Vargas retorna em 1950 pelo voto direto, mas a crise política instalada 2/3 anos depois no Catete – numa sucessão insuportável de denuncismos – não teria como ser evitada. Naquele período de sobressaltos, só um nome forte e popular poderia abortar o infortúnio. E como esse nome não surgiu de imediato, Vargas, o maior político da história do Brasil, não deixou por menos: determinado a não sair pela porta dos fundos, deu o tiro no peito que, paralelamente, atingiu todos os seus adversários e triunfou.
Mas o nome surgiu. Na realidade, esteve sempre presente, mas por estratégia evitou o olho do furacão, só se lançando candidato em outubro de 1954 para a eleição do ano seguinte. Poucos meses depois, a crise de 54, que poderia ser devastadora, perdeu força ao vislumbrar Juscelino Kubitschek. Desta feita o Brasil teve o nome lúcido, capaz e determinado, que governou cinco anos reforçando a democracia e fazendo o Brasil crescer.
Para alguns, a articulação de Juscelino frustrou o golpe já esboçado. Mesmo abrindo as portas para a inflação, o legado foi o de estadista e JK, um político de habilidade singular, abortou o pior.
Com Jango, faltou o nome
Eleito com expressivo apoio popular, Jânio Quadros foi um personagem surpreendente, que lançou o Brasil no abismo político quando se esperava calmaria.
Cumprindo sete meses de um governo de desatinos, renunciou em agosto de 61 com o vice João Goulart na China, como quem desejasse ver o circo pegar fogo.
O Brasil segurou mais uma, mas não por muito tempo. Na queda de braço entre os que não aceitavam Jango e os que o queriam presidente, prevaleceu a democracia, em outro momento no qual o golpe espreitou.
Para Goulart assumir, o Brasil negociou e adotou o parlamentarismo. E não haveria espaço para o retrocesso se tivesse prevalecido. Mas os que garantiram a posse de Jango queriam mais, queriam o controle, e o Brasil retomou o presidencialismo.
Descampando para toda sorte de instabilidade e insegurança, num estado de greve generalizada e desordem que o próprio João Goulart não queria – mais fora pressionado – faltou o tal nome diferenciado, que uniria o Brasil, e a brecha resultou no Golpe de 64 – o regime que prometia eleições para o próximo ano, mas que virou ditadura e ficou duas décadas.
A tragédia institucional da despolitização só foi superada pela tragédia das torturas e dos assassinatos. Conclusão: o Brasil, ao contrário da vez anterior, não conseguiu uma liderança capaz de evitar o período negro. Dizendo melhor, até conseguiu, na figura de Carlos Lacerda. Mas o então governador da Guanabara preferiu um atalho, apoiando a Revolução que depois o cassou, tirando-lhe definitivamente da cena política.
E... de novo... faltou
Para não transformar o texto num tratado interminável, resumidamente os generais resolveram, 21 anos depois, devolver o País. Esperavam eleger Mario Andreazza, mas Paulo Maluf – desde sempre rejeitado, para não dizer renegado – bagunçou o coreto do PDS, que preferiu a chapa adversária, Tancredo/Sarney, ao malufismo.
Tancredo morre antes de tomar posse e, após intensa articulação nos bastidores – que a história, em parte, mantém encoberta –, Sarney vira presidente. Algo inusitado: a ditadura sai de cena, mas deixa um amigo do regime no Planalto.
Não havia como reclamar. Depois do governo dos porões, por menos confiável que fosse, Sarney, quando pouco, era um civil eleito no Colégio Eleitoral. Um governo incompetente, marcado por “planos econômicos” estapafúrdios, que depois de cinco anos deixou o Brasil com 100% de inflação ao ano.
E aí veio o ‘x’ da questão: no período de maior transitoriedade da política nacional, em que o Brasil, já livre das botinas, precisava consolidar os pilares democráticos e criar bases para o crescimento econômico, caiu no estelionato de Fernando Collor, que culminou em novo período de insegurança e instabilidade.
Nesse momento o País experimentou o terceiro revés a que nos reportamos, só não transformado em colapso graças à rapidez com que reagiu a Collor, pondo-o porta afora do Planalto e impedindo o pior. Mas, seja como for, o atraso e o risco institucional ocuparam o espaço onde faltou um estadista.
2018: o Brasil ante o futuro
Em rápidas pinceladas e dando saltos nos acontecimentos, coube a Itamar Franco aprumar o Brasil que Collor jogou na aventura, derrubar a inflação de 30 anos com o Plano Real que estabilizou o País e dar equilíbrio político com o lançamento da candidatura de Fernando Henrique.
Único a ser eleito e reeleito em 1º turno pós voto direto, FHC colocou a democracia em ponto irreversível, modernizou o Brasil e fez o País subir vários degraus no mapa mundial.
Substituído por Luiz Inácio Lula da Silva, o petista pôs em prática avanços sociais históricos – uma inclusão de verdade – e elevou a qualidade de vida do brasileiro, sem perder de vista o crescimento econômico.
Veio o Mensalão... e tanto o líder do PT quanto o Brasil, aos trancos e barrancos, sobreviveram – mas com marcas indeléveis. A reeleição empurrou para debaixo do tapete o que seria de grande benefício para o País se tivesse sido revelado. E veio Dilma 1, Dilma 2, Petrolão, estelionato eleitoral, corrupção, crise política sem precedentes e recessão econômica.
Com todos os senões e falta de legitimidade, Temer poderia ter projetado um Brasil melhor. Mas o áudio de Joesley Batista exibiu a face vergonhosa, escandalosa e corrupta de quem teria que dar o exemplo. Sem comentário.
E agora? – Emprestando ao termo ‘indefinição’ conceito bem acima do que costumeiramente é empregado, o Brasil está (quase) à deriva. Não enfrenta tormenta, mas tampouco avista porto seguro.
Perdeu quatro anos a partir de 2014. Poderia ter sido bem pior? Poderia. Mas deveria ser muito melhor. Isso sem falar da bizarra situação de ter um ex-presidente da República, condenado e preso, como líder das pesquisas eleitorais.
Com o destino nas mãos e vários caminhos a seguir – umas de vielas escuras, outras de avenidas iluminadas – o pleito de 2018 vai definir se o eleitor brasileiro terá a sensibilidade de eleger um nome que seja mola propulsora que lança ao alto, ou âncora que prende ao fundo.
É o quarto momento. O quarto em número, que haveremos de torcer para que não seja o quarto do pânico.

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