Esmaecer
Ronaldo Junior 07/05/2022 14:00 - Atualizado em 07/05/2022 14:24
Fonte: Pixabay.
A escrita tem seu ponto de partida na omissão, na arbitrariedade de quem toma para si a incumbência da palavra.

Por isso os textos têm sempre uma perspectiva própria, uma parcialidade que, por mais que se esforce para ser ampla, é sempre tendenciosa para aquilo que foi dito (o que fica de fora lá está por um motivo).

E isso faz do texto, por diversas vezes, um espaço de opressão, pois a narrativa é, quase invariavelmente, uma forma de induzir a interlocução em determinado sentido.

Deixadas de lado, todas as demais narrativas são parte da história - não contada.

E, assim, se diz pelo não dito. Se diz no silêncio da colonização do outro. E o texto se posiciona pelo que deixa de lado, impondo sigilo nas cadeias paradigmáticas capazes de dizer pelo que se excetua ao que é proferido.

Até porque não é preciso desdizer o que não fora dito, guardando apenas o que fica com o registro das arbitrariedades, deixando espaço somente para explicações do que está explicitamente posto, não do que se oculta em ausência.

Ao se contentar com a fragmentariedade das palavras selecionadas, esmaecendo as nuances que foram emudecidas, o autor toma partido da linha em branco, fazendo dela um espaço daquilo que está nas ideias, mas não se declara – qual seria sua razão?

Não saber, porém, pode até ser um privilégio para viver unicamente a superfície do agora, sem os sofrimentos de suas funduras. Por outro lado, forçar o esquecimento é perpetuar, uma vez que as marcas vividas se perdem para reaparecer mais intensamente com outras faces

Na parede da memória, a palavra não dita - falada, porém, no avesso da enunciação que se ausencifica - fala ainda mais alto pela humanidade que passa despercebida.


*Ronaldo Junior tem 26 anos, é carioca, licenciando em Letras pelo IFF Campos Centro e escritor membro da Academia Campista de Letras. www.ronaldojuniorescritor.com
Escreve aos sábados no blog Extravio.

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    Ronaldo Junior

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    Professor e membro da Academia Campista de Letras. Neste blog: Entre as ideias que se extraviam pelos dias, as palavras são um retrato do cotidiano.