O Estrangeiro: Basta apenas um chinês para três mateusinhos
Edgar Vianna de Andrade 16/01/2018 13:01 - Atualizado em 16/01/2018 15:54
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Nosso tempo se tornou ambíguo. Por um lado, o modelo industrial, militar, policial e de inteligência tornou o indivíduo obsoleto. Não há mais lugar para heróis e grandes detetives. O sistema os substituiu. Cada indivíduo é agora uma engrenagem do todo. Que se veja o caso de Edward Snowden, um funcionário de uma empresa de inteligência dos Estados Unidos que só se tornou conhecido por ter divulgado informações secretas. Claro que o cinema criou um drama para valorizá-lo.
Por outro lado, como compensação, fora dos grandes sistemas, a economia estimula o individualismo, o consumismo e o narcisismo. Nunca houve tanta exposição pública como hoje. Nas redes sociais, basta uma foto do joelho de uma pessoa para que todos a curtam. Exatamente por este motivo, um filão bem-sucedido de filmes explora a figura do herói solitário que substitui todo um sistema complexo de inteligência e é capaz de derrotar um exército de homens treinados.
Imaginemos um homem chinês de 61 anos de idade que lutou nas guerras do Sudeste Asiático, recebeu treinamento especial dos Estados Unidos, perdeu mulher e filhas, aposentou-se, adquiriu cidadania britânica e foi morar em Londres onde tem um restaurante. Sua única filha viva morre num atentado terrorista do Exército Revolucionário Irlandês (IRA), ressuscitado do por jovens e apoiado por veteranos. Imaginemos a dor desse homem, que perde toda a família e se culpa por não tê-la protegido devidamente. O caminho desse homem é a vingança. Mas contra quem? Mais que a superpreparada polícia britânica e seu serviço de inteligência, o chinês solitário Quan (Jackie Chan), pelo faro, descobre a ponta do fio que o levará a vingar a filha morta. Mais que toda a polícia, ele persegue o mais que suspeito vice-ministro irlandês Liam Hennessy (Pierce Brosnan), que suspeita de alguém próximo, mas que nada sabe.
Mais que o próprio IRA, ele usará explosivos para alcançar seu alvo sem ferir ninguém. Ele é capaz de entrar em qualquer lugar sem ser percebido. Ele vence um homem jovem treinado, conseguindo arrancar dele as informações que deseja. Ele chega até a célula terrorista e mata todos os homens, poupando a mulher, antes que o esquadrão antiterror a invada. Ele volta pra casa pacificado consigo mesmo.
Poderíamos invalidar o filme por impossível, mas ele tem sentido. Primeiro, ele trata do problema da imigração e do terror, muito atual. Coloca-se um chinês no centro da trama. De longa data, chinês é sinônimo de artes marciais, de táticas de ocultação e de fuga. O roteiro de David Marconi toma como base um livro de Stephen Leather. A direção está nas mãos do experiente Martin Campbell. Acima de tudo, o gaiato Jackie Chan consegue desempenhar muito bem um papel dramático. O finado Bruce Lee estava acostumado ao drama com pontadas de humor. Jackie Chan está acostumado a comédias com pontadas de drama. Mas a idade chega e não é mais possível exibir a agilidade da juventude. Então, o artista precisa revelar outros dotes.
Embora inverossímil, Chan desempenha muito bem o seu papel. Condenar o filme por não ser convincente seria jogar fora a série “Busca implacável” e “Os mercenários”, nos quais o herói ou heróis já veteranos agem solitariamente ou em grupo de forma marginal e sempre se saindo vitoriosos. O mocinho sempre chega primeiro, resolve tudo a seu modo e a polícia sempre lhes é grata.

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