Ouvir disparates, como uma possível interferência no nosso código genético ou brincadeiras idiotas como virar jacaré ou chipanzé, nos remete à época em que Edward Jenner fez a descoberta da vacinação, observando que camponeses que ordenhavam vacas infectadas e contraíam a varíola bovina, por alguma razão, passavam a sair ilesos dos surtos de varíola humana. Passou a retirar o pus das bolhas localizadas nas mamas das vacas doentes e inocular em cobaias humanas, comprovando o poder protetor do pus infectado com a varíola animal.
Na época, parte da população brasileira, sem entender como a vacina funcionava, ficava em pânico contra esta novidade científica. Um dos medos era que a imunização, em vez de prevenir, causasse a varíola e levasse à morte.
Antes da vinda para o Brasil, Dom João VI fez seus filhos serem vacinados em público, com a finalidade de diminuir o temor dos súditos portugueses, já que seus irmãos e a própria Carlota Joaquina foram vítimas da doença. Essa resistência à vacina perdurou por longo tempo, fazendo o D. Pedro II decretar a vacinação obrigatória, não conseguindo, entretanto, surtir o efeito esperado. Assim a varíola matou mais de 300 milhões de pessoas de 1900 a 1979, somente sendo controlada e erradicada após uma ampla campanha mundial de vacinação pela OMS.
Isso mostra que a negligência do brasileiro em relação às vacinas é histórica. Antes da pandemia já vínhamos com uma queda preocupante nos níveis de cobertura vacinal no país. As pessoas que hoje têm 30,40 e 50 anos foram amplamente vacinadas contra o Sarampo e a Poliomielite e, com o desaparecimento destas doenças, essas faixas etárias nunca conviveram com as sérias doenças, que vêm ameaçando de novo seu retorno.
A vacinação com o objetivo de conter uma epidemia e, no caso, uma pandemia, deve ser uma ação coletiva de saúde pública. Se não for desta forma continuaremos a conviver com as sequelas desta grave doença. Não precisa que seja obrigatória, mas que haja um comprometimento de todos, principalmente dos gestores públicos e os órgãos oficiais. Explicar, desmistificar e, principalmente, acreditar na ciência.
Quem desconfia da rapidez da descoberta destas vacinas não acompanha a evolução magnífica biotecnológica que estamos vivenciando nos últimos 30 anos. Essas plataformas de desenvolvimento vacinal não são de agora, mas de muitos anos atrás. Quando tivemos o risco das pandemias dos coronavírus de 2002 e de 2012 houve uma grande corrida para a fabricação dessas vacinas e assim foi trilhado um excelente caminho, facilitando em muito as grandes empresas de imunobiológicos neste tempo atual.
Vacinas aprovadas nas já ouvidas fases I, II e III nos oferecem resultados robustos de segurança e eficácia. Logo, não há o que temer. Vacinas não mexem em nosso código genético. Só especulam esse tipo de coisa ignorantes científicos que não conhecem a imunofisiologia.
Bem, estou aguardando e estarei na fila para receber qualquer vacina, seja qual for a nacionalidade, torcendo para que os nossos valorosos Butantã e Fiocruz possam, através do SUS, vacinar toda a nossa gente, assim que estiver aprovada e autorizada pelos órgãos nacionais e internacionais. O brasileiro conhece e valoriza seu Programa Nacional de Imunização (PNI), que durante décadas tem sido elogiado e louvado por muitos países.