Marcelo Lessa: Histórias recontadas
- Atualizado em 05/05/2021 21:47
Durante cinco anos a operação Lava Jato fez o povo brasileiro acreditar que seria possível refundar o seu sistema político, nas bases da probidade administrativa, dando um basta aos esquemas de corrupção estrutural cujas entranhas foram dissecadas e expostas à mais profunda biópsia.
Mesmo que essa crença tivesse aberto as portas para um oportunismo que, pouco tempo depois, se revelaria tão desastroso quanto o status quo ante, ainda subsistia a esperança de que isto pudesse ser apenas uma etapa de um lento e penoso processo de evolução, que não teria mais retorno.
A troca de seis por meia dúzia (a depender, para tal constatação, apenas da perspectiva observada e das expectativas depositadas), parecia menos sofrida enquanto se olhava somente para frente, mirando num futuro não tão distante, que pudesse enfim trazer um ponto de equilíbrio e a certeza de que a premissa da probidade não teria mais volta, e que, claro, poderia, nessa nova etapa do processo evolutivo que se imaginava viria, ser conciliada com serenidade, equilíbrio, humanidade, capacidade técnica, coerência, apreço à Ciência, senso democrático e decoro com os cargos mais altos da República.
Ser honesto não é virtude; é pressuposto! Ser honesto não dá a nenhum governante o direito de ser tosco, arrogante, negacionista, distorcer os fatos e a História, fomentar crises e se alimentar delas, para criar instabilidade institucional, como estratégia de perpetuação de poder (estratégia essa, diga-se de passagem, fadada ao insucesso, graças à maturidade que as Instituições republicanas atingiram no Brasil, que lhes permitiu perceber que são muito mais importantes do que as pessoas que momentaneamente as representam). Nem o Trump conseguiu se manter assim...
Mas esses modelos que se sucederam — e, ao que parece, podem voltar a se suceder — estão longe de se completarem. Ambos são, à sua moda, flagelos de um retrocesso que assombra a memória dos mais experientes e dos que conseguem deixar de lado as idolatrias acéfalas. São, em verdade, duas faces de uma mesma moeda que carrega o peso de, jogada num lago de esperança, afundar com ela.
É perturbador imaginar o Brasil numa roda cíclica (com o perdão do pleonasmo simbólico) e depositar em determinadas figuras carimbadas pela História a esperança de uma correção de rumos em diversos setores da gestão pública (inclusive a política sanitária, que é o que mais preocupa ou, nesse cenário bipolar, a que mais deveria preocupar).
Que triste alternativa se desenha pela frente!

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