Sob iminência do terror belgas respondem
22/11/2015 | 11h18
Fim de domingo e Bruxelas (Bélgica) já se encontra há dois dias sob o Estado de sítio decretado pelo governo como forma de proteger a população de possíveis e iminentes ataques terroristas. O aparato policial vasculha bairros e a área central. A polícia federal pediu às mídias e aos internautas que não façam nenhum tipo de postagens nas redes sociais; solicitou que respeitassem o silêncio sobre as operações policiais que acontecem no momento, na capital do país. A instrução foi plenamente compreendida e a resposta dos internautas foi maciça. Acataram a orientação de não comentar as ações de busca, pois, poderiam sem querer ajudar os terroristas a escapar do cerco policial. Os belgas então inundaram as redes sociais, Twitter e Facebook , de imagens gaiatas de gatos, acompanhadas da hashtag #BrusselsLockdown,  quer dizer: Bruxelas trancada. Vejam algumas dessas imagens que rodam nas redes nesta noite tensa da cidade. IMG_7277-1 IMG_7279 IMG_7280-1 IMG_7278  
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'Charlie Hebdo' e os atentados terroristas
18/11/2015 | 12h50
[caption id="" align="aligncenter" width="400"]Capa da edição que vai às bancas nesta quarta-feira (18) do semanário satírico francês "Charlie Hebdo" "Eles têm armas. Eles que se f..., nós temos champagne!"[/caption] O jornal satírico "Charlie Hebdo", alvo do ataque terrorista que dizimou a redação em 7 de janeiro de 2015, vai às bancas hoje, quarta-feira (18) e faz uma provocação direta aos terroristas na capa do especial sobre os atentados que mataram 129 pessoas em Paris, na última sexta-feira (13). A capa, assinada pela desenhista Coco, mostra um homem em atitude festiva, garrafa e taça de champanhe na mão, com o corpo repleto de buracos de bala por onde escapa o vinho espumoso, sobre o fundo vermelho. "Sem perceber, os parisienses em 2015 se transformaram nos londrinos dos anos 1940, determinados a não se render ao medo, não importa o que seja. É a única resposta que nós podemos mostrar aos terroristas", disse o cartunista Riss, atual editor-chefe da publicação. O desenho é uma referência direta aos ataques terroristas da semana passada: todos em lugares vinculados ao lazer, como a casa de shows Bataclan, o Stade de France e bares e restaurantes, que deixaram 129 mortos e 400 e tantos feridos. "Imaginávamos que aos atentados de janeiro se seguiriam outros. Esperávamos, resignados, que nos caísse sobre a cabeça, como um espada de Damocles", indica o desenhista e atual diretor da publicação, Riss, no editorial da revista que estará nas bancas. O diretor da publicação pediu que "não cedam, nem ao medo nem à resignação. É a única resposta possível". Em outra charge publicada no site da revista, Charlie Hebdo mostra três fantasmas com boinas pretas e baguetes, uma alusão ao modo de vida francês, com a frase: "Os franceses retornam à vida normal". A publicação se distingue por críticas aos extremismos religiosos de todo tipo e foi alvo dos ataques terroristas por ironizar em diversas edições o profeta Maomé. Após o atentado de janeiro, Charlie Hebdo retornou às bancas com uma capa em que Maomé aparecia chorando e a manchete "Tudo está perdoado". Na imagem, o profeta segurava um cartaz que reproduzia o slogan popularizado após essas ações, "Je suis Charlie".
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Humanidade ferida: França declara guerra
15/11/2015 | 09h20
Com 129 mortos e mais 415 pessoas que deram entrada nos hospitais de Paris, feridos (muitos graves) ou em estado de choque, a capital francesa e o mundo vai lentamente deglutindo um dos mais assustadores e articulados atos terroristas do Estado Islâmico (EI). Qualquer indivíduo que tenha sensibilidade e defenda a democracia como princípio se estarreceu ao acompanhar o noticiário sobre a carnificina. Estamos atônitos, boquiabertos passando por horas e mais horas suspensas pelo terror que invadiu a Europa. De pronto o presidente François Hollande reconheceu o Estado de Guerra contra o EI e decretou o Estado de Urgência. E assim se sucederam as declarações das autoridades e dos formadores de opinião francesa. O editorial do jornal francês 'Le Monde' de hoje, domingo (15), abre com a seguinte frase " É uma guerra, uma guerra verdadeira. Nós o sabíamos, mas, no fundo, preferíamos não enxergar". E prossegue sombrio, "Esta guerra, agora cada um a compreende, só está iniciando". Também hoje, domingo, no final do dia, o ex-presidente francês Nicolas Sarkozy, em entrevista à televisão francesa TF1, pegou ainda mais pesado. Propôs que aqueles franceses já fichados "S" (são pessoas com algum tipo de passagem policial, classificadas como suspeitas de potencial ato terrorista contra a república) sejam postas "em residência vigiada ou em prisão domiciliar com bracelete eletrônico para que a polícia saiba onde estão, o quê fazem e possa avaliar a periculosidade delas". Para Sarkozy, "Não é realista deixá-las soltas na natureza e fazer de conta que não representam perigo eminente", ao lembrar que são 11.500 pessoas fichadas "S". Segundo ele, 520 jovens franceses se encontram entre a Síria e o Iraque: "Todos os que retornam ao país devem ser imediatamente presos", frisou. Tudo faz crer, a exemplo das 20 bombas lançadas, hoje, pelos caças da armada francesa em bases do Estado Islâmico no leste da Síria, que os líderes dos países ocidentais, finalmente cheguem a um acordo político e intensifiquem ações militares na Síria e no Iraque contra o inimigo comum. [caption id="" align="aligncenter" width="547"]Os presidentes dos Estados Unidos, Barack Obama, e da Rússia, Vladimir Putin, durante a cúpula do G20 neste domingo (15) (Foto: RIA-Novosti, Kremlin Pool Photo via AP) Os presidentes dos Estados Unidos, Barack Obama, e da Rússia, Vladimir Putin, durante a cúpula do G20 neste domingo (15) (Foto: RIA-Novosti, Kremlin Pool Photo via AP)[/caption]  
fontes. Le Figaro e Le Monde
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HUMOR OU BLASFÊMIA?
08/11/2015 | 08h35
  A revista de humor francesa Charlie Hebdo enfrenta nova confusão com a reação furiosa de Moscou às recentes charges sobre o acidente com o avião russo. Putin as classificou de blasfêmia e exigiu desculpa formal do Estado francês. Peças e destroços de uma aeronave em queda livre e mesmo um passageiro caindo do céu e atingindo um combatente islâmico armado. Na legenda do desenho lê-se apenas : “Daesh: a aviação russa intensifica os seus bombardeios". É assim que pode ser descrita uma das ilustrações publicadas pelo jornal satírico “Charlie Hebdo” da quarta-feira passada (04), acerca do acidente com o Airbus russo que caiu no Sinai no qual morreram 224 pessoas. Todos indícios caminham por confirmar ter sido uma ação terrorista, no qual uma bomba interna teria explodido a certa altura. No segundo desenho (da direita), também um cenário do desastre nos fala dos “perigos das viagens russas de baixo custo" e mostra os destroços de um avião enquanto uma caveira diz que o melhor seria “ter viajado pela Air-Cocaína”, em referência ao aparelho recentemente interceptado no Líbano com carregamento da droga, supostamente destinado ao financiamento dos radicais islâmicos na Síria. 2015-11-06-cartoon.PNG O porta-voz do Presidente russo foi enfático: “Na nossa opinião, isto tem um nome: blasfêmia. Não tem nada que ver com a democracia, nem com a liberdade de expressão”, disse aos jornalistas Dmitir Peskov. Depois do atentado sofrido em sua própria redação, do qual resultaram 12 mortos, para o jornal, esta é apenas mais uma das tantas polêmicas às suas edições, cujo teor ascende inúmeras discussões sobre a liberdade de expressão e os seus limites.
fonte. Le Figaro
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Aos que veladamente "condenaram" o humor do Charlie Hebdo
05/05/2015 | 06h50
No domingo passado (03), dois homens armados abriram fogo contra um centro de conferência onde se realizava um concurso de caricaturas sobre o Maomé, em Garland, subúrbio de Dallas. Tudo indica que pela primeira vez o grupo terrorista Estado Islâmico seja o responsável pelo ataque nos Estados Unidos, no qual os dois terroristas saíram fuzilados por agentes policiais do Texas (antes, os dois haviam ferido um guarda). [caption id="attachment_8908" align="aligncenter" width="400"]IMG_5321 Foto divulgada dos dois terroristas mortos pela polícia norte americana[/caption] Oficialmente, em seu canal de rádio nesta terça-feira (05), o Estado Islâmico (EI) reivindicou o ataque em solo americano, mas, a Casa Branca acha cedo para confirmar se o atentado foi mesmo do EI ou se pegaram carona em busca de popularidade. “Nós avisamos a América: ataques futuros serão maiores e mais amargos. Vocês assistirão a coisas horríveis por parte dos soldados do Estado Islâmico com a graça de Deus”, ameaçou o grupo djhadista. Se os americanos pensavam ainda que atentados tipo “Charlie Hebdo” ficariam reservados a uma Europa incapaz de integrar os seus muçulmanos, o episódio veio comprovar o oposto. Para aqueles que de forma velada culparam os jornalistas e chargistas do Charlie Hebdo, por "provocarem" (como se a função social do Humor não fosse exatamente a de provocar) a sociedade - de forma ampla, geral e irrestrita -, fica o alerta de que ceder à censura nunca será a solução, mesmo em tempos de intolerância religiosa. O fato serve para o Brasil tomar todas as providências de segurança para as Olimpíadas de 2016. Quem desejar se lembrar do ataque terrorista à redação do jornal/revista Charlie Hebdo, ver aqui e aqui.
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Fuga em massa
03/05/2015 | 10h25
Somente neste fim de semana, foram resgatados quase 6000 imigrantes nas águas do mar Mediterrâneo, em operações de salvamento conduzidas pela Itália e França. Este total é um dos mais altos realizado em apenas 24 horas. Foram 17 embarcações salvas na costa da Líbia (segundo o jornal francês Le Figaro), número que poderá ser ainda maior, visto que as operações de resgate continuam em curso. Os corpos sem vida de sete pessoas também foram encontrados em dois barcos infláveis. [caption id="attachment_8897" align="aligncenter" width="600"]Europe Migrants The Boats (AP Photo/Daniele La Monaca, File) Europe Migrants The Boats[/caption]   A nacionalidade dos imigrantes não foi oficialmente divulgada ainda que se saiba que a maioria é africana e que há sírios em grande quantidade. Todos foram conduzidos a Itália. Nos primeiros quatro meses de 2015, mais de 1750 pessoas morreram ao tentar atravessar o mediterrâneo, sem conseguirem chegar a solo europeu. O número assusta. É 20 vezes maior se comparado ao período equivalente em 2014. No ano passado, segundo a ONU, através de sua agência de refugiados, foram 3.419 imigrantes que perderam a vida tentando fazer a travessia. De acordo com as projeções divulgadas pela Organização Internacional para as Migrações, 30 mil imigrantes poderão morrer este ano no Mediterrâneo. Para um mar que já foi berço de civilizações humanas a continuar assim se transformará em cemitério de refugiados. Fonte. Le Figaro
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É da Vida (e de morte). Não dá para calar
28/04/2015 | 12h32
Ontem, morreu Inês Etienne Romeu, aos 72 anos, de insuficiência respiratória. A ex-guerrilheira, única sobrevivente da Casa da Morte - espaço macabro clandestino de torturas, execução e desaparecimento montado pela ditadura militar, no início anos anos 1970, em Petrópolis -, morreu da morte desejada por todos: em casa dormindo. Inês foi a última presa política a ser libertada no Brasil. A única prisioneira a sair viva da Casa da Morte após atravessar 96 dias de tortura. Ela foi importante na construção do direito à memória e à verdade da nossa frágil democracia: só a partir de um depoimento escrito por ela no hospital, em 1971, e entregue à OAB em 1979, quando terminou de cumprir pena, foi possível localizar a casa e identificar parte dos agentes que atuavam no local — entre eles o colaborador dos torturadores, o médico Amílcar Lobo.
— Ela se foi em paz, com tranquilidade, disse um dos irmãos, o jornalista Paulo Romeu. Também ontem foi divulgada, justo ontem, a suspensão pelo STF, através da ministra Rosa Weber, do processo criminal contra o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra. Ustra foi chefe do Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), do II Exército, órgão utilizado para reprimir e torturar opositores do regime de exceção. Na ação suspensa, Ustra é acusado pelo MPF por suposto sequestro e cárcere privado de Edgar de Aquino Duarte, fuzileiro expulso das Forças Armadas e que desapareceu em 1974 após ser preso por outros militares. Há exatos três anos, em 2012, escrevi o post "Casa da Morte". Como na época afirmei, "De deixar qualquer ser normal enojado".  Para que permaneçamos alertas na resistência ao autoritarismo, à repressão e às violações aos direitos humanos, para que nunca mais aconteça, nesse espaço contei, ver aqui.  
[caption id="attachment_4152" align="aligncenter" width="550"] Casa da Morte[/caption] [caption id="" align="aligncenter" width="552"] Inês Etienne, presente![/caption]   “O Corpo dela (da cobra) ao se deslocar, arranhou o meu; chegou a sangrar. Mas o maior trauma foi o cheiro que ela exalava, um fedor que custei a esquecer”. Depoimento de Danton Godinho, jornalista mineiro torturado.
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Campos: da baixada às baixarias
14/04/2015 | 09h03
Se da Baixada Campista tem vindo a invasiva fumaça, da política goytacá tem vindo fenômeno pior. É a baixaria bruta, não lapidada. Faltam mãos de fino manejo e mentes de almas limpas. Em Campos, há décadas, essas almas de encosto nefasto, rastejam pela planície nas costas de um e outro. Agora, escolheram atacar profissionais da imprensa e da rede de blogs locais. Não toleram o questionamento, menos ainda a independência. Exigem o cerco da corte. Caluniam, difamam, inventam. Mentem acintosamente como se a mentira, repetida como artilharia, pudesse transformar-se em verdade. Esquecem-se de que a realidade em movimento fala mais alto, dita o ponto e vírgula e confere o ponto final. Um dia, mesmo a aqueles que se enganaram e acreditaram no discurso, o ouvido trava. E tudo o mais dito soa como uma brutal poluição sonora. Distorção em alto grau. Perda de tempo. Bem como a decomposição incômoda da turfa em brasa não é bem-vinda às narinas humanas, esses, por mais processos e ameaças de processos, não mais encontram eco. [caption id="attachment_8849" align="aligncenter" width="422"]turfa queimando foto. campos24horas.com.br[/caption] Saravá!  
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IRRESPONSÁVEL E SUBMISSOS
25/02/2015 | 12h09

Assim descreveu Luz - um dos poucos caricaturistas que sobreviveu à matança aos jornalistas da então pequena publicação satírica francesa Charlie Hebdo -  autor da nova capa do exemplar que foi às bancas, hoje, quarta-feira, 25/02. No desenho, um cãozinho com o jornal entre os dentes perseguido por uma matilha furiosa representada, entre outros, por um cardeal, um jhadista com um fuzil entre os dentes, pelo representante da extrema direita francesa Le Pen, pelo ex-presidente francês Nicolas Sarkozy, por um banqueiro e pelo microfone da rede televisiva BFM-TV.

Após uma parada de seis semanas terá tiragem de 2,5 milhões de exemplares. "C'est reparti!", ou "Aqui estamos de volta", brada o hebdomadário. " Estou contente de ter feito algo alegre", disse Luz, autor também da capa "Tudo está perdoado" editado logo após o massacre que trucidou a redação do Charlie Hebdo, por terroristas islâmicos no mês de janeiro , ver aqui e aqui. O desenhista se disse radiante de ter desenhado animais, sobretudo cachorros:  são animais irresponsáveis e submissos. Irresponsável é o Charlie. Submissos são todos os demais que correm atrás dele", descreveu Luz em entrevista à imprensa francesa.

A equipe de redação sobrevivente quis demonstrar que a vida retoma seu curso e promete após está interrupção de seis semanas a retomada do ritmo normal com o reforço, inclusive, de dois novos caricaturistas. Para um jornal que antes do massacre, colocava nas bancas 50 mil exemplares e que agora atinge nada menos do que 200 mil assinantes, o ofício de expor a realidade com absoluta irreverência, livre do tradicional puxa-saquismo da grande imprensa tem que continuar.

Da Chacina, relembre.
O ataque à redação do "Charlie Hebdo" no dia 7 de janeiro deixou 12 mortos, entre eles os cartunistas Stéphane Charbonnier, conhecido como Charb, e o lendário Georges Wolinski. Dois policiais também morreram, um deles alvejado na rua durante a fuga dos atiradores, identificados como os irmãos franceses descendentes de argelinos Chérif e Said Kouachi. Ambos disseram "vingar o profeta Maomé", por uma caricatura publicada do Maomé.
[caption id="attachment_8735" align="aligncenter" width="401"]nova_charlie_hebdo Capa da nova edição do Charlie Hebdo, nas bancas hoje, 25/02.[/caption] Fonte: Le Figaro
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Pra pensar 3
19/01/2015 | 08h14
É tentador ceder a pressões ainda mais quando feitas pelo senso comum (maioria). Pode ser cômodo ao profissional que não deseja se expor, mas, é um desserviço ao exercício da profissão. Dito isto, trazemos outra análise sobre as repercussões dos atos terroristas de extremistas islâmicos  (fanáticos) que levaram a República Francesa ao dilema do momento: lutar pela defesa intransigente dos valores universais do livre pensar e da livre expressão - dois direitos fundamentais da laicidade, um não existe sem o outro,  esboçados na quebrada do século 18, confirmados pela lei de imprensa francesa, em 29 de julho de 1881. Para simples esclarecimento, na França, diferentemente que em outros países europeus, como na Alemanha e Grécia, não existe o delito (crime) de blasfêmia. Lá, pode-se criticar tudo, inclusive religiões, resguardado ofender pessoas que professam suas religiões. Paradoxalmente, o que garante o direito à livre associação religiosa e a todas as convicções é justamente a laicidade. [caption id="attachment_8667" align="aligncenter" width="400"] Paris, Praça da República, 11 janeiro 2015. Ft. Joel Saget AFP[/caption]  

Charlie Hebdo: Ironia e tragédia

Aqueles que promovem a guerra contra o terror e os que semearam o terrorismo por todos os cantos do mundo estão tentando se apropriar dos ataques.


Alejandro Nadal (La Jornada)
A luta para se apropriar de um duelo político tem longa trajetória, sobretudo quando o luto tem origem em um crime. Plutarco narra, em Vidas paralelas, como, depois do assassinato de César, no Senado romano, as distintas facções batalharam para ocupar o vazio que engendra o desolamento público para se consolidar no poder. Cássio e Brutus disputam a aflição popular com Antônio, mas este conseguiu com sua elegia fúnebre colocar o povo de Roma contra os assassinos de César e desencadear uma guerra civil.

Um paralelismo pode ser traçado com os esforços para recuperar espaços públicos após o ataque contra a Charlie Hebdo. Esta sempre foi uma revista irreverente com o poder, militar ou econômico, iconoclasta com todos os símbolos de hierarquias, laicas ou religiosas. É e foi inimiga do racismo e da discriminação em todas suas manifestações. Sempre lutou contra as ditaduras e a arbitrariedade, o poderio militar e o intervencionismo neocolonial. Mas agora, em pleno duelo social, buscam de todas as formas se apropriar dos símbolos e bandeiras que acompanharam a Charlie em sua luta. Estão buscando instrumentalizar a tragédia para promover o terrorismo de Estado. Hoje, corre-se o risco de transformar tudo isto em um episódio mais da luta contra o terror e do suposto choque entre civilizações.

A concentração em Paris, no domingo passado, teve dois públicos. No primeiro, o povo e suas organizações, sindicatos, associações civis, manifestando repúdio ao covarde assassinato dos redatores da Charlie Hebdo e dos reféns do metrô de Paris. Muitos deles seguiram de perto a épica luta do semanário e de seu predecessor, Hebdo HaraKiri, desde 1969. Luta a partir da esquerda contra o despotismo, exploração, engano e intimidação. Mas, naquele dia, marcharam em Paris também chefes de Estado e líderes políticos de partidos e organizações que sempre abriram as portas para a guerra, para o comércio de armas e para o capital financeiro. Marcharam lado a lado Merkel, Rajoy e Renzi, chefes da austeridade neoliberal que atualmente destrói a Europa. Não faltaram Netanyahu e outros amigos do militarismo. Também se somaram a eles alguns notáveis como guardiões da ordem moral burguesa e da obesa hipocrisia dos bons costumes, amigos do racismo e da descriminação. Faltaram somente Marine Le Pen e os neonazistas para completar o quadro. Outros, nem sequer tiveram que viajar a Paris para explorar o momento. Em Atenas, o primeiro-ministro aproveitou a oportunidade para fazer investidas contra o Syriza por sua postura sobre a imigração. Do México, o governo manifestou seu pesar: deve saber que isso não anula sua grave responsabilidade nos assassinatos (Tlatlaya) e desaparecimentos (Ayotzinapa). A ironia é brutal: os inimigos da Charlie Hebdo estão lutando para disputar o duelo, os que promovem a guerra contra o terror e os que semearam esta praga por todos os cantos do mundo. Criticou-se a imprudência dos caricaturistas da Charlie Hebdo. Mas é preciso responder com uma reflexão política, porque é disso que estamos falando, de política, não de bons costumes ou de etiqueta. Por que é tão importante a liberdade de expressão? A resposta é clara: a liberdade de expressão é irmã gêmea da liberdade de consciência, e as demais liberdades carecem de sentido sem elas. Em particular, sem liberdade de expressão, a liberdade de associação política fica sem sentido. Não é exagero afirmar que a liberdade de consciência e a liberdade de expressão são as mais importantes do catálogo de liberdades republicanas. Por isso, os limites da liberdade de expressão são apenas três: a não incitação à violência ou um crime e a difamação. A blasfêmia não é uma das restrições, como deixa claro a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789. Na imprensa internacional, sobretudo no mundo anglo-saxão, a Charlie Hebdo tem sido apresentada como um veículo obstinado em ridicularizar o fundamentalismo islâmico, como se este tivesse sido seu único trabalho. Nada mais afastado da verdade. Os primeiros inimigos da Charlie foram o fascismo, o racismo, o neocolonialismo, o militarismo e a pena de morte. O fanatismo religioso e seu apoio hipócrita a estruturas de exploração esteve sempre em seu catálogo de inimigos a vencer, mas não é o único nesta lista. O luto público é a parteira de uma análise política fraca porque a dor e a sede de vingança escurecem o raciocínio e tornam a racionalização difícil. Por isso, o oportunismo encontra nas lamentações um terreno fértil para suas estratagemas. Hoje, mais do que nunca, é necessária uma análise política cuidadosa. A tragédia em Charlie Hebdo não é parte dessa farsa chamada guerra contra o terror, nem de um suposto choque de civilizações. Fonte: Carta Maior Tradução de Daniella Cambauva
       
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Sobre o autor

Luciana Portinho

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