Bispos de Campos esperam equilíbrio do próximo Papa
Aluysio Abreu Barbosa, Cláudio Nogueira, Gabriel Torres e Mário Sérgio Junior 03/05/2025 08:37 - Atualizado em 03/05/2025 08:37
Bispos Dom Roberto Ferrería Paz e Dom Fernando Rifan
Bispos Dom Roberto Ferrería Paz e Dom Fernando Rifan / Divulgação
O próximo Papa deve trazer equilíbrio para a igreja. Essa foi a opinião compartilhada pelos bispos de Campos, Dom Roberto Ferrería Paz e Dom Fernando Rifan, entrevistados dessa sexta-feira (2) no programa Folha no Ar, da rádio Folha FM 98,3. Há menos de uma semana do conclave, com início no próximo dia 7, eles analisaram o legado do Papa Francisco, os critérios para escolha do novo pontífice, os cardeais mais cogitados e os desafios da Igreja nos novos tempos. Dom Roberto, bispo da Diocese, e Dom Fernando, tradicionalista da Administração Apostólica Pessoal São João Maria Vianney, também analisaram a posição da Igreja em relação à inclusão de mulheres e homossexuais e as questões em torno da missa em latim.
Próximo Papa
Dom Fernando — “Acho que vai ser um equilíbrio e o equilíbrio não aparece tanto. Os radicais aparecem mais”.
Dom Roberto — “Eu também penso que vai ser um candidato de distensão, talvez de apaziguamento, mas também de avanços. Eu acredito nos avanços, a igreja sempre avança”.
Três preferências
Dom Roberto — “Vou aceitar, como um dom de Deus, aquele que triunfar e vou amá-lo. Agora, eu gostaria do Peter Tukson, do Pizaballa, pelas razões que foram aventadas aqui, a união das três religiões abrahâmicas. E também gosto de Dom Leonardo, porque vai agrupar o que se chama a grande Amazônia, que é o futuro da criação. É uma bandeira de Francisco e a crise climática pode nos levar cada vez mais a um problema de sobrevivência. Então, Dom Leonardo Steiner brasileiro, eu votaria nele também”.
Dom Fernando – “Eu preferiria o Pizzaballa, que é lá o patriarca de Jerusalém, o Sara. Esses dois e o Erdo, o húngaro. Esse é muito bom, canonista”.
União
Dom Roberto — “Ele (Francisco) conseguiu colocar na mesa o presidente dos Estados Unidos, o anterior a Biden, Obama e Raul Castro. Conseguiu colocar o presidente de Israel e da autoridade palestina. Conseguiu colocar o presidente Santos, representante das Farc, para chegar a um acordo de desarmamento na Colômbia. Fora, às vezes, que também interveio no sentido de rezar pela Ucrânia. E outros momentos de aliviar a tensão, evitar. Porque para ele a guerra é sempre um desastre, é uma derrota”.
Dom Fernando – “O Papa procurou a paz quando estava vivo e depois de morto também. Agora no sepultamento dele, numa sala lá do Vaticano, duas cadeiras assim, conversando Zelensky e Trump. Muito bonita aquela foto, os dois conversando. Quer dizer, até o Papa, no seu velório, estava promovendo a paz. Então, isso aí conta muito. Agora, os jesuítas sabem como eles são missionários, e o Papa é jesuíta, que é companhia de Jesus o nome, fundada por Santo Ignácio de Loyola, para missões”.
Espírito missionário
Dom Fernando — “O Papa Francisco, como jesuíta, procurou fazer essa igreja, que Dom Roberto salientou bem, em saída. Ou seja, vamos buscar as pessoas que estão fora da igreja, não vamos ficar só na sacristia ou só na igreja. Vamos para fora, vamos buscar. Trazer essas pessoas é o espírito da missão. Essa igreja em saída quer dizer isso, ter mais espírito missionário para trazer. Conservar, claro, aqueles que já estão dentro, mas buscar aqueles que estão fora. Quanta gente que se afasta da igreja por motivos banais até, perdeu a fé porque foi desapontado. Muita gente se afastou da igreja. É preciso ir atrás, buscar essas ovelhas que se dispersaram, não por convicção, mas por fraqueza, às vezes. Então, acho que o grande Papa missionário foi o Papa Francisco.
Dom Roberto – “O Papa Francisco fez jus a seu nome de Francisco. Houve, no começo, quando ele assumiu, uma dúvida. Inclusive, o Jesus Hortal, que é um jesuíta, dizia, não, deve ser Francisco Borgia, que era missionário. Não, ele não é Francisco de Assis. Então, eu acredito que o franciscanismo do Papa Francisco foi o mais franciscano dos jesuítas”.
Papas de todos os tipos
Dom Fernando — “Já tivemos Papa de tudo quanto é tipo. Papa Júlio II, que andava de armadura, ia montado a cavalo. Tivemos Papas guerreiros. Ele foi o Júlio II, o grande mecenas de Michelangelo. Então houve papas mundanos, papas monges, teve todo tipo de papas que já teve. Eu quando estava em Roma na época do Conclave, não esse agora, o outro, o cardeal Castilhão conversando comigo falou assim: ‘olha, pelo que eu conheço dos cardeais, São Pedro não teria a menor chance de ser eleito’. Porque São Pedro era uma pessoa simples, só falava uma língua e dava uns fora de vez em quando, era temperamental, acabou negando Jesus de medo. Então, mas ele foi escolhido para ser a pedra. E o Papa é sucessor de São Pedro. Ou seja, São Pedro, que tinha a pedra Cristo, e pedra é a segunda pedra. São Pedro é Pedro por causa de Cristo. Apesar das fraquezas humanas, das dificuldades dele, ele foi escolhido para ser o Papa. E o Papa é sucessor de São Pedro. Então tem que olhar isso, o Papa não é um santo que resolve tudo. Ele também tem seus problemas, suas dificuldades, porque quem sustenta a Igreja é nosso Senhor Jesus Cristo”.
Amor ao próximo
Dom Roberto — “O amor ao próximo é a norma áurea, é o básico para seguir a Jesus Cristo, um Deus que se apresenta como um Deus amor para o São João. Amar, onde está todo o fundamento da revelação do próprio Pai no Filho”.
Dom Fernando — “É a marca de Jesus, porque Jesus falou, eu vos dou um novo mandamento, amai-vos uns aos outros como eu vos amei. Jesus amou até o fim, até morrer por nós. Essa é a marca do cristão”.
Bento XVI e Francisco
Dom Fernando — “Os dois se completavam, não eram antagônicos. Um completava o outro e completou. Eu acho que são duas faces da mesma moeda, é o cristianismo. Talvez o Bento, a gente pode salientar mais a solidez na doutrina, na liturgia, tudo isso. E o Papa Francisco mais a missionariedade, trabalhar para as missões, para conquistas”.
Dom Roberto — “É uma caminhada, a Igreja sempre se constrói a partir dos outros. Ninguém inventa a roda. O magistério cresce, evolui. Por exemplo, o Papa Francisco teve a Caritas In Veritatis, que fala muito da criação também. Na Caritas Veritatis, por exemplo, o Papa Bento diz, da maneira que tratamos o corpo, nosso corpo, vamos tratar a criação. Da maneira que tratamos a criação, vamos tratar o nosso corpo também. Ouve uma evolução da doutrina social também com Bento XVI”.
Francisco e a Argentina
Dom Fernando — “Eu perguntei ao pároco da catedral de Buenos Aires, que é muito amigo dele, inclusive sucedeu ali na Catedral de Buenos Aires, é muito amigo do Bergoglio. Eu disse, por que o Papa não voltou aqui? Ele falou, ele não voltou porque tudo aqui na Argentina vira política. Qualquer palavrinha que ele falasse. Uma divisão. Então, melhor ele não ir, porque tudo vai virar guerra política”.
Dom Roberto — “Ele foi o primeiro papa latino-americano e ele soube, sem ser também bairrista, mas levou toda aquela reflexão de Aparecida para a igreja universal. Essa ideia da necessidade de uma iniciação à vida cristã, essa ideia de uma evangelização mais profunda e justamente uma igreja em saída, mas que guardasse a comunhão sinodal. O sínodo foi também a grande pedagogia do Papa Francisco, escutar e que todo mundo participasse na igreja. Uma igreja onde cabem todos, todos, todos.
Força da Igreja
Dom Fernando — “Eu acho que uma coisa emblemática foi a morte e o velório do Papa. Cento e vinte chefes de Estado que vieram. Ali tinha gente até de briga, tinha o Zelensky, o Trump, o pessoal dos países árabes. Todo mundo ali no velório do Papa. Então, eu acho que isso aí mostra a força da igreja. A força da personalidade do Papa como tal, independente de ser Bergoglio, ser Bento. É a força do Papa como tal, como atrai essas pessoas e vão lá. O mesmo aconteceu na morte de João Paulo II. Estava ali a autoridade palestina. Estava todo mundo junto. Então, mostra a força da igreja, como eles estão juntos. Não teve briga no velório, teve ali união”
Igreja conservadora
Dom Fernando — A igreja é conservadora por si mesma. Ela não pode começar do zero. Ela tem que ver todo o legado que já veio atrás. Essa questão da abertura às mulheres, eu acho que já houve bastante. Depois do Conselho Vaticano II, já houve bastante abertura. As mulheres hoje são catequistas, elas participam na igreja, são ministras da eucaristia, ministra da sagrada comunhão, elas fazem leitura na igreja. Então não era aquele sistema antigo em que a mulher não podia falar nada. Acho que já houve bastante progresso. Agora, ela não pode ser padre, nem diaconisa, porque isso é da construção da igreja, Jesus escolheu homens. Então a igreja tem que ser fiel a esse legado de Jesus. Mas as mulheres já têm bastante participação. (…) Agora, quanto à missa (em latim), isso depende do Papa e depende também dos católicos que gostam. Nós conservamos a missa antiga como um dos tesouros da igreja, mas em perfeita comunhão com Dom Roberto. Quando eu estou com Dom Roberto, celebro com ele a missa atual, não se trata de briga. A igreja tem 24 ritos diferentes de missa. Tem os ritos orientais, bizantinos, maronitas, melquitas, siro-malabar, da Índia. A igreja é plena de ritos diferentes. A missa é uma só”.
Dom Roberto – “Para nós, os cristãos, o progresso é ir cada vez mais ao acontecimento Cristo. Conhecer mais a vontade de Cristo, conhecer mais o tempo da graça, que foi o tempo apostólico, os fundamentos. Então, a igreja, na verdade, quando se diz progressista, não é que está acompanhando somente o tempo, mas está voltando às raízes. Quando falamos da participação das mulheres, não devemos esquecer que o Cristo ressuscitado se apresentou primeiro a Maria Madalena, que é considerada apóstola dos apóstolos. Apóstola apostolorum. Então, isso foi vontade de Cristo. Isso é registrado. Então, o espaço da mulher, eu ainda penso, que deve aumentar”.
Homossexualidade e a igreja
Dom Roberto — “Podemos dizer que a igreja vai aumentar sim, na pluralidade, na diversidade. Em relação aos homoafetivos, há uma compreensão de acolhê-los. Não vejo como não acolher uma pessoa”.
Dom Fernando — “Na nossa igreja tem muitos. Estão lá e se sentem muito bem acolhidos”.
Neutralidade da Igreja
Dom Roberto — “É interessante que muitas vezes se coloca, como na Unesco, em várias entidades internacionais, uma nação que seja pequena. Por quê? Por exemplo, se é uma superpotência, é difícil que um papa seja de lá porque isso impede a neutralidade da igreja. Cria essas dificuldades para o Papa”.
Conclave
Dom Roberto — “Quando uma pessoa entra no Conclave tem que jurar que defenderá os direitos da igreja, que defenderá a fé, que não permitirá que nenhuma ideologia ou tendência do mundo, poder temporal, interfira na eleição. E depois, quando você vai fazer o voto, você se ajoelha e diz “Invoco a Jesus, ao Senhor, como minha testemunha, que eu estou votando naquele que eu considero melhor”. Então, de repente, claro, você pode seguir a Francisco, mas você vê que o melhor é outro. E você vota, porque de acordo com a sua consciência. Penso que estamos diante de Deus nesse momento”.
Dom Fernando – “A parte muito importante do Conclave é agora, antes do Conclave, porque agora é que eles estão conhecendo um ao outro. Eu conversei com um cardeal antes, lá em Roma, ele falou que o problema é que ninguém conhece ninguém. São muitos cadeais novos, a gente não conhece. Então agora é que eles estão se conhecendo, a linha de cada um, trocando ideia, nas convenções antes. Porque no Conclave vai ser um tempo de oração e de votação, mas eles já estão com a ideia mais ou menos formada, dependendo muito agora dos discursos que eles vão ouvir agora nesse sistema, nessa novendiale pré-conclave. É claro que o avanço do Papo Francisco, um coração de abertura, isso continua. Agora, precisa ver algumas coisas que podem ser melhoradas. Depende muito de como eles vão agir agora. Mas que há um desejo de uma certa tranquilidade e estabilidade, isso há entre eles”.
Futuro
Dom Fernando — “Eles vão olhar o melhor para a igreja hoje. Não vão escolher o Papa medieval. Eles vão conhecendo a personalidade de cada um. Quem sabe esse vai ser melhor para a igreja toda, para trazer a paz, para trazer a unidade, continuar o progresso que tinha. Eles vão escolher tudo. Eu gosto muito do Erdo, da Hungria, que é muito bom, é canonista, teólogo. Esse seria um excelente candidato. O Sara talvez eles não escolham, embora seja excelente, mas como ele é muito da linha tradicionalista, pode ser que jogue o peso muito para um lado. Eles têm que escolher um equilíbrio. Já o Zuppi é muito para o lado progressista. Eu acho que eles vão escolher uma linha intermediária. Todo mundo é candidato. Mas cotado, por exemplo, esse Besungu não garanto que vai muito. Parolin, eu sempre achava que ele seria um bom candidato. Mas ele foi um pouquinho atingido pelo acordo com a China, que não foi muito bom para a igreja. O campo diplomático é muito difícil. O acordo com a Igreja Patriótica da China, com o governo da China para nomeação de bispos. (…) Mas a gente pede a Deus que eles sejam bem inspirados e escolham o melhor para a igreja hoje e que tragam a união para a igreja”.
Dom Roberto – “Outro aspecto é o contexto internacional, por exemplo. Em tempos de guerra, escolheram Bento XV e Pio XII. Sabiam que eram Papas diplomáticos. Também intervém o aspecto da evangelização para o futuro. Nós precisaríamos, e é o meu candidato, um da África e um da Ásia, porque são dois continentes que a Igreja ainda precisa crescer muito. É um desafio das demandas. Termos mais proximidade, chegar mais a esses dois continentes. Porque o catolicismo tem 1 bilhão e 300 milhões. Mas da Ásia tem pouco. Da África tem mais, claro que sim. Inclusive, no corpo cardenalício, tem muito mais da África que da Ásia. Eu optaria pelo Turkson. Porque o Turkson foi relator do Congresso do Sino da África e também é uma pessoa muito próxima à doutrina social que o Papa Francisco pregou. Mas é uma pessoa também que guarda a tradição.
Homossexualidade e sacerdócio
Dom Fernando — “O Papa Francisco já falou que não deve. Isso não quer dizer que seja discriminação. Existem certas coisas que fazem parte do regulamento da entidade”.
Dom Roberto — “Tem que se ver se essa tendência condiciona realmente o sacerdócio ou não. Pode ser apenas periférico ocasional, pode ser um defeito de formação. Então tem que se fazer um discernimento, e é no seminário que vai se fazer esse discernimento com os peritos e o próprio reitor, que é o principal. Agora, isso não significa que não devemos acolher e que não existam pessoas homossexuais que tenham sido ordenadas. Agora, em princípio, há uma instrução que inclusive trata disso, é que às vezes a homossexualidade leva a uma imaturidade e leva as pessoas a se expor a determinados tipos de extorsão. Penso que a homossexualidade, como o próprio catecismo diz, é um mistério. Não se sabe a origem. Nós não estamos contra as pessoas homossexuais. Ao contrário, a igreja é uma das instituições mais abertas a valorizar a dignidade da pessoa”.

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