Possível empréstimo provoca dúvidas e reações
Paulo Renato Pinto Porto - Atualizado em 27/01/2021 08:26
Expedientes já utilizados em Campos pela para aliviar dificuldades nas finanças da Prefeitura, um novo empréstimo e o uso de recursos da PreviCampos como solução para o pagamento de uma folha de salários e parte do 13º salário em atraso do funcionalismo são alternativas recebidas com reservas, restrições e questionamentos por economistas ouvidos pela Folha da Manhã. As dívidas com o funcionalismo deixadas pelo prefeito Rafael Diniz (Cidadania) chegam a R$ 106 milhões.
Professor de economia da Universidade Estácio de Sá, Igor Franco não vê a possibilidade de mais um empréstimo como ruim. “Por si só não vejo como algo ruim contrair empréstimos para solução de problemas de curto prazo como o pagamento aos servidores. O problema é que para solucioná-lo é preciso equacionar problemas de longo prazo que passam pela contenção ou corte de despesas em contratos ou reajustes de salários, entre outras despesas. O governo federal e os estaduais lançam mão deste tipo de solução porque tem um raio de ação muito maior, para contrair estes gastos, mas os municípios, e Campos em particular em razão de dificuldades que conhecemos, não têm muita margem de manobra em suas regras orçamentárias para fazer esta operação sem estes ajustes sob pena de comprometer ainda mais a situação”, avaliou.
A possibilidade de utilização de recursos do Instituto de Previdência dos Servidores de Campos (PreviCampos) como solução do problema é temerária, na visão de Igor. Ainda que seja legal, não sou contra esta hipótese. Os padrões mais elevados de governança no setor financeiro não recomendam este tipo de relação entre entidade patrocinadora e o próprio fundo de pensão. Isso não é interessante, é preferível que isso não aconteça. Não diria que seja uma relação promíscua entre as partes, mas existe uma confusão de papéis. Isso aumentaria o risco de inadimplência futura, diante dos cofres municipais já em dificuldades, seria aumentar muito o risco para servidores com perspectivas de aposentadoria mais próxima risco. Seria um risco muito elevado”, analisou.
O economista José Alves de Azevedo Neto critica os dois últimos governos de Rosinha Garotinho e depois Rafael Diniz por não terem feito os ajustes de gastos na Prefeitura. “Endividar a Prefeitura é complicado porque desde 2014 o diagnostico tem sido este: o de queda contínua de receitas e que indicava a necessidade de ajustes na máquina pública. Foi o que o governo Rosinha não fez, houve ajuste muito superficial com secretarias que viraram superintendências, mas nada de mais. Rafael disse que ia fazer, mas não fez. E agora Wladimir fala em trazer dinheiro novo para solucionar o problema. Eu espero que não seja mais um empréstimo porque os bancos querem uma garantir. A Prefeitura hoje tem a oferecer alguma garantia? Creio que não. Antes havia os royalties, mas com os dois empréstimos anteriores não tem mais", ponderou.
— Acho muito arrojado pegar recursos da PreviCampos porque o dinheiro para financiar aposentadorias do servidor dá só para mais 10 anos apenas. Há hoje lá um valor de R$ 800 milhões, quando em 2015 havia um R$ 1,5 bilhão resultado do que o governo Rosinha apanhou há alguns anos. De lá para cá, o fundo sofreu redução de valores em mais de R$ 500 milhões. Cabe aos servidores fazerem esta avaliação. Será que vale a pena sacrificar o futuro em nome do presente? É uma avaliação de risco — alertou.
Economista conclui que há mais dinheiro
De janeiro e outubro, a execução orçamentária da Prefeitura de Campos contabilizou receitas da ordem de mais de R$ 1,3 bilhões (R$ 1.322.555.000,00). Deste montante, 52% foi destinado a pagamento de pessoal e mais 42% em outras gastos, somando 94% de gastos em custeio. Somadas as receitas correntes e deduzidas as despesas houve um superávit acumulado de R$ 82,7 milhões com restos a pagar de R$ 42,4 milhões, lembra o economista Alcimar Chagas Ribeiro, da Universidade Estadual do Norte Fluminense.
— Neste caso, deduzindo a rubrica dos restos a pagar teriam restado em caixa cerca de R$ 40 milhões. O prefeito Wladimir Garotinho precisa explicar isso porque ele disse ter encontrado em caixa apenas R$ 3,9 milhões quando esses indicadores não mostram esta falta de recursos. Os números não batem — declarou o economista.
Para Alcimar Chagas, seria um “tiro no pé” lançar mão de recursos do PreviCampos para equacionar o problema dos salários em atraso e parte do 13º “Seria uma decisão temerária. A solução seria fazer cortes, reavaliar gastos com terceirizações ou repactuar contratos com outras empresas prestadoras de serviços que absorvem uma boa soma do orçamento municipal. A estrutura da prefeitura é muito pesada, é preciso medidas que tornem a máquina administrativa mais enxuta. Vai ser preciso cortar na carne, fazer uma reengenharia para manter o que realmente agrega valor”, enumerou ainda Alcimar.
José Alves Neto compartilha da opinião de Alcimar sobre a necessidade de priorizar um ajuste fiscal com corte nos gastos para tornar a máquina mais enxuta com corte nos cargos comissionados, entre outras despesas. “Wladimir disse cortou R$ 10 milhões cargos confiança. Ora, isto representa em comparação com o custeio fixo de 2019 apenas 1%. Se não fizer este sacrifício as gerações futuras irão pagar por este endividamento porque as políticas públicas ficarão comprometidas, com menos recursos na saúde, educação e outras áreas essenciais”, concluiu.
Recorrer ao fundo do servidor é “arriscado”
O economista Roberto Rosendo, professor e diretor da Universidade Federal Fluminense (UFF/Campos), também concorda basicamente com o diagnóstico e o receituário de seus colegas. “A situação é bastante delicada. O prefeito Wladimir enfrenta várias crises: é a crise recessiva da economia nacional que já impacta as finanças locais há alguns anos; é a crise sanitária com a pandemia; e a crise do petróleo que reduziu a produção e a cotação da maior receita do município. Vai ser preciso reduzir gastos com ajustes nos contratos com as empresas prestadoras de serviço, como a de limpeza e remove o lixo e entulhos e as que fazem manutenção, além de tentar a rolagem das dívidas correntes. Enfim, ele terá que otimizar a máquina”, comentou Rosendo.
Para o professor da UFF, recorrer ao fundo do PreviCampos seria um arriscado. “Seria um risco porque os gastos com as despesas previdenciárias tem aumentado nos últimos anos com a maior longevidade das pessoas, o que gera a necessidade de mais recursos para o PreviCampos”, admite.
Numa das últimas reuniões de que participou com os servidores, Wladimir admitiu lançar mão de um novo empréstimo pela Prefeitura ou utilizar recursos do fundo do PreviCampos. O prefeito disse que o empréstimo seria uma saída razoável, mas ponderou que os trâmites tornam a operação demorada, e os servidores tem pressa. Quando se cogitou na utilização de recursos do PreviCampos, o gestor disse que deixaria a decisão para os servidores.
— Eu só faço com a autorização de vocês e dos vereadores. A autorização tem que passar também pela Câmara — lembrou.
Mas a hipótese, nas últimas assembleias no Sindicato dos Servidores Públicos Municipais (Siprosep), sequer foi cogitada para ser incluída na pauta.
 

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