Dora Paula Paes
15/10/2025 11:20 - Atualizado em 15/10/2025 11:22
divulgação
As gerações mudam, assim como o modelo do professor em sala de aula. Os rígidos deram lugar ao acolhimento da “Professora Helena”, famosa personagem da novela infantil Carrossel. Na atualidade, ganham espaço ainda àqueles que usam do humor e para chegar a um público maior e tem como ferramenta a internet. O mundo caminha para a Inteligência Artificial, mas é com professores como a também influenciadora, Clara França, que as portas das salas de aula se abrem ao mundo. A campista, que nasceu em um berço de professores, furou a “bolha da internet”. O auge foi quando criou, como personagem, a oferta de uma escola para bebê reborn, neste ano. Seus seguidores ficaram confusos se ela estava falando sério ou era apenas uma sátira ao modismo momentâneo. Clara, no entanto, tem certeza que a internet é um grande espaço para dialogar com colegas, escolas, governos, pais e alunos. Neste 15 de outubro, Dia do Professor, ela assinala que o maior vilão da atualidade na Educação é a falta de respeito.
Folha da Manhã - Como começou sua história com a educação?
Clara França - Venho de uma família de professores. Tudo começou com a minha avó, que foi a primeira da família a seguir essa profissão e ela se tornou uma grande inspiração, não só para mim, mas também para os meus tios. Cresci em um ambiente cheio de histórias, músicas e atividades, com minha mãe sempre recortando coisas e preparando materiais para suas turmas. Porém, não escolhi a Pedagogia de imediato. Minha primeira formação foi em Serviço Social, e foi durante o estágio, em um CIEP perto da minha casa, que eu me apaixonei pela educação. Ali, eu percebi o poder transformador que a escola tem na vida das pessoas. Atuo como professora há quatro anos e desde o início enfrentei muitos desafios. Foi justamente deles que surgiu o desejo de me conectar com outros professores.
Folha - Então foi neste momento que você encontrou espaço na internet para se comunicar com seus pares?
Clara - Comecei a postar nas redes sociais mostrando minha rotina: as propostas pedagógicas, os relatórios, o dia a dia real de uma sala de aula. O humor veio depois, quase como uma extensão natural disso tudo. Eu pensei: “Por que não contar o que acontece na sala de aula com humor?”. O humor aproxima, cria empatia, faz o outro entender uma realidade diferente da sua. E foi aí que as coisas começaram a acontecer. O primeiro vídeo que “furou a bolha” foi o dos materiais recicláveis que os professores guardam, algo muito simples, mas que muita gente se identificou. Outro momento marcante foi o vídeo com mágicas para o Dia do Circo, que também repercutiu bastante. E mais recentemente, o vídeo da escola para bebê reborn levou minha página para um público ainda maior, não só professores, mas também estudantes, famílias e pessoas curiosas.
Folha - Você, assim como o Diego Almeida (professor que também chama atenção nos seus canais pelo humor em torno do cotidiano dos educadores) e outros mais, conseguem chamar atenção para a vida do professor, de forma divertida. Essa forma sutil de sátira ajuda a levar mais rápido as mensagens, já que a vida do professor nem sempre é leve, (mal remunerado, desvalorizado, sobrecarregado), toda uma gama de mazelas... Brincar é a melhor saída para mostrar esse universo?
Clara - Como eu costumo dizer, o humor conecta as pessoas. Quando eu conto uma situação de sala de aula, não é só o professor que se identifica, as famílias também conseguem se enxergar ali. Muitas vezes, uma mãe ou um pai assiste e pensa: “Poxa, isso acontece com o meu filho!”, e pela primeira vez consegue olhar para o outro lado, o olhar da professora. Acho que esse é o poder do humor: ele aproxima, cria empatia e faz as pessoas refletirem sem que eu precise apontar diretamente o problema. Ser professora é muito desafiador. É uma profissão exigente e a gente lida com tantas dificuldades: desvalorização, sobrecarga, cansaço… Mas quando eu trago isso com humor, o público entende sem se afastar. Eu acredito muito que o brincar e o rir são caminhos potentes para gerar reflexão. Em vez de assustar ou afastar, o humor acolhe e faz o outro pensar: “Nossa, o professor vive isso todos os dias”. Acredito que brincar, fazer humor, é uma das melhores formas de mostrar esse universo e de criar pontes de entendimento entre professores, famílias e sociedade.
Folha - Qual o maior sonho do professor?
Clara - O maior sonho do professor é ser valorizado, não apenas financeiramente, mas também como profissional e como pessoa. O professor sonha em ser reconhecido pelo papel essencial que exerce. Afinal, todas as profissões passam por um professor em algum momento. É ele quem orienta, quem ensina, quem desperta talentos e abre caminhos. O que desejamos é esse reconhecimento: que a sociedade olhe para o professor e entenda o quanto ele é importante.
Folha - Na mesma balança, o maior pesadelo?
Clara - O maior pesadelo, por outro lado, está justamente no oposto disso, na falta de respeito e de valorização. Hoje, infelizmente, muitos professores enfrentam salas cheias de desafios e, muitas vezes, lidam com a perda do respeito dentro e fora da escola. Existem famílias que já não ensinam mais aos filhos a importância de respeitar o professor. E quando isso acontece, o ambiente escolar se torna mais difícil, mais cansativo e desmotivador.
Folha - A Educação tem um vilão?
Clara - Para mim, o maior vilão da educação hoje é a falta de respeito. Porque quando falta respeito, falta empatia, falta escuta e também falta vontade de construir algo melhor. A desvalorização começa quando um jovem diz que quer ser professor e ouve que “vai passar fome”, que “não é uma profissão de futuro”. Isso é muito triste. A profissão perde o encanto quando a sociedade deixa de enxergar o professor como alguém essencial.
Folha - Neste 15 de outubro, de professor para professor...
Clara - Por fim, eu quero dizer a todos os professores o quanto é necessária a nossa união. Infelizmente, às vezes, enfrentamos situações de comparação e competição dentro da própria categoria, e isso não soma, não fortalece. Quando os professores se unem, eles têm o poder de transformar a sociedade. Aos jovens que estão escolhendo a pedagogia, eu digo: sigam em frente. Essa profissão tem, sim, muitos desafios, especialmente na relação com as famílias e com as mudanças do nosso tempo, mas também é uma das mais gratificantes que existem. Ser professor é se realizar ao ver o aprendizado acontecendo, é enxergar nos alunos um potencial enorme e poder ajudá-los a trilhar caminhos bonitos. Nós precisamos, sim, ser valorizados, porque somos uma profissão essencial. Mesmo com todo o avanço da tecnologia, nada substitui a presença de um professor. A inteligência artificial pode explicar muitas coisas, mas nunca vai acolher com empatia, nem ensinar com amor como um ser humano faz. Ser professor é isso: é ser insubstituível.