Nélio Artiles: Fadiga da camisinha
Nélio Artiles Freitas 02/12/2021 15:28 - Atualizado em 02/12/2021 15:29
Infectologista Nélio Artiles
Infectologista Nélio Artiles / Rodrigo Silveira
Nossos adolescentes precisam de orientações. Em geral são instáveis, ambivalentes e ansiosos. Estão entre ser uma criança ou ser um adulto e, em geral, não sabem exatamente o que desejam. Será que eles estão preparados para fazer sexo sem uma orientação adequada? Tesão, orgasmo, gravidez, Aids, condiloma, gonorreia ou sífilis, está tudo junto e misturado, e se basear nas orientações de amigos ou internet certamente não será suficiente.
Não é possível fugir de uma conversa antes de uma primeira vez. Em 2018 tivemos mais de 450 mil nascidos vivos de gestação em adolescentes. O índice de gravidez na adolescência no Brasil está bem acima da média mundial. Em 2020, por exemplo, registrou-se que a cada mil brasileiras entre 15 e 19 anos, 53 tornaram-se mães. No mundo, este número é de 41, conforme relatório lançado recentemente pelo Fundo de População das Nações Unidas (Unfpa). Somos comparados a países como o Sudão, na África, e ainda abaixo da Índia e Paquistão.
Quanto tempo se dedicam pais, pediatras ou mesmo professores a conversar sobre sexualidade com estes jovens? E adolescente transa. Esta é a vida real e os pais tomam atitudes negacionistas não querendo enxergar. O PeNSE (Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar) divulgou em 2015 dados impactantes, pois demonstram o comportamento do adolescente. Os alunos responderam a um questionário sobre aspectos socioeconômicos, contexto familiar, hábitos alimentares, prática de atividades físicas, experimentação de tabaco, álcool e outras drogas, saúde sexual e reprodutiva, violência, segurança e acidentes e utilização de serviços de saúde. Nesta pesquisa 27,5% dos adolescentes já transaram (38% não usaram preservativo).
Os dados de 2019 ainda não foram publicados, mas já há informações que serão piores. Há uma crise hoje mundial no uso da camisinha que está sendo chamada de “fadiga do preservativo”. Os dados demonstram taxas de 50% usando e não usando. Não há adolescentes temerosos como algum tempo atrás. Qual a estratégia para proteger esta galera? Apenas falar sobre camisinhas masculinas e femininas não será suficiente, pois a qualidade deste material distribuído na rede pública é ruim e isso aumenta muito a falha.
O uso inadequado, como colocação tardia e retirada precoce, não deixar espaço na ponta, não desenrolar completamente, retirada incorreta e até mesmo reutilização são causas importantes de falha do método. A própria colocação pode, em alguns, diminuir a ereção e assim acabam arrancando no meio da relação sexual. A ruptura também pode ser um problema sério. A menina com atividade sexual ativa precisa ficar protegida duplamente, seja com o uso de preservativos na relação, mas há necessidade de considerar o uso de dispositivo intrauterino com o médico ginecologista.
Lembro de uma estratégia pedagógica em países orientais, em que os pais adquirem pintinhos logo que saem dos ovos para as meninas cuidarem. É um encantamento aquele filhotinho para cuidar. Mas começam a sujar tudo e vão crescendo e a menina começa a perceber o problema que seria uma gravidez antecipada e não desejada nesta fase tão linda e importante da vida.
É preciso conversar com os jovens, considerando e respeitando a privacidade, a confiabilidade e ficar sempre aberto para angústias e dúvidas sobre esta questão tão importante nos dias atuais. A prevenção contra Aids e todas as ISTs (infecções sexualmente transmissíveis) passa pelo inevitável diálogo.

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