Luiz Otávio Damasceno: Epistemicídio - você sabe o que é?
- Atualizado em 27/11/2021 04:05
Luiz Otávio é promotor em Itaperuna
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Na semana da Consciência Negra, é oportuno falarmos sobre o “epistemicídio”, termo que pode, num primeiro momento, espantar o leitor, mas que consiste num importante conceito a merecer, cada vez mais, o conhecimento do grande público. A primeira parte da palavra vem de “episteme”, ligada ao estudo do conhecimento elaborado pelo ser humano e às próprias fontes do saber. Por sua vez, o sufixo “cídio” remete à ideia de extermínio, de aniquilação.
Assim sendo, nas palavras do pensador português Boaventura de Sousa Santos, “o genocídio que pontuou tantas vezes a expansão europeia foi também um epistemicídio: eliminaram-se povos estranhos porque tinham formas de conhecimento estranho e eliminaram-se formas de conhecimento estranho porque eram sustentadas por práticas sociais e povos estranhos. Mas o epistemicídio foi muito mais vasto que o genocídio porque ocorreu sempre que se pretendeu subalternizar, subordinar, marginalizar, ou ilegalizar práticas e grupos sociais (...)” (SANTOS; Pela Mão de Alice: o social e político na pós-modernidade, 2018)”
Cuida-se, portanto, de fenômeno no qual os saberes dos povos historicamente dominados (ou das chamadas minorias) figuram como mais um elemento de menosprezo e de apagamento por parte dos povos dominantes, de modo que passa a haver uma indesejável hierarquização do conhecimento, transmitindo a falsa sensação de que determinados segmentos sociais são os únicos ou legítimos detentores de certos discursos, práticas ou ciências.
No caso da população negra, por exemplo, merecem menção os estudos de doutoramento da filósofa Sueli Carneiro, da USP, para quem o epistemicídio é causa de inferiorização intelectual, de deslegitimação do negro como portador e produtor de conhecimento, bem como de rebaixamento de sua capacidade cognitiva.
A própria filosofia ocidental, de Aristóteles a Immanuel Kant, é um nítido exemplo desse deletério processo, visto que, desde cedo, somos apresentados aos saberes gregos da antiguidade, às teorias dos europeus modernos, mas, dificilmente, nos são oferecidos conhecimentos africanos ou de origem assemelhada, os quais igualmente contribuiriam para nossa percepção de mundo.
Contudo, observamos que a questão está evoluindo, isso diante da crescente popularidade de autores como Djamila Ribeiro, Silvio Almeida, a nigeriana Chimamanda Adichie ou o camaronês Achille Mbembe, todos engrossando a fileira de nomes do passado como Frantz Fanon ou Abdias do Nascimento.
De todo modo, que ampliemos nosso leque intelectual, que visitemos as inteligências de outras culturas, e que exploremos, sem medo, todas as formas de aprendizado, crendo que mulheres, pretos, indígenas e minorias em geral são, sim, merecedores da máxima visibilidade nas estantes de nosso saber.

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