José Eduardo Pessanha: Imbróglios da gestão pública (parte 1)
- Atualizado em 15/01/2021 10:39
José Eduardo  Advogado e professor universitário
José Eduardo Advogado e professor universitário
A Lei complementar 101 de 2000, notadamente um avanço no controle contra a corrupção, popularmente conhecida como a “Lei da Responsabilidade Fiscal” pressupõe uma Gestão Fiscal planejada e transparente, com prevenção de riscos e desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, atentando para as metas e obediência a limites e condições, principalmente quanto a renúncia de receita, geração de despesas com pessoal, da seguridade social e outras, além de dívidas consolidadas e mobiliárias, operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de garantia e afins. Notem que por esta parte preambular, em verdade, apenas detalha preceitos que estão inseridos como Princípios na Constituição Federal de 1988, outro inegável avanço legislativo e democrático.
A questão toma vulto quando transmudamos tais obrigações de gestão para o campo operacional, pois planejamento e transparência, em si, já ensejam o intuito de correção e caráter na Administração, o que dificulta as manobras e chicanas em busca de verbas oriundas da corrupção. Um Governo sério apresenta um Planejamento consolidado, não apenas para cumprir quesitos, mas que, de fato, será imprimido com seriedade, de forma que o signatário do poder (o Povo) possa, caso queira, constatar as fases implementadas. Por sua vez, a Transparência evita que ações espúrias sejam realizadas à surdina e que negociatas e privilégios, ilegais, sejam implementados.
As despesas com pessoas e seguridade social (pública ou própria) tem sido um dos desafios de maior relevância em todos os contextos administrativos, pois são o estopim para a derrocada do controle das contas públicas, notadamente pelos excessos cometidos no tempo e que se consolidam, de forma agrupada, ao final, culminando por apresentar uma condição de bancarrota pública.
Poderia ser algo distante, mas tal cenário se amolda, lamentavelmente, a nossa amada cidade de Campos dos Goytacazes. Inúmeros anos de gestões que visavam encontrar as lacunas entre os dispositivos legais, especialmente da LC 101, trouxeram seus efeitos aos dias atuais. A folha de pagamento, que se não bastasse dos servidores concursados (que somente por seus números já deveriam ser suficientes para mover todo aparato do município), tem ainda a anomalia legal da construção da pirâmide de RPAs, na verdade uma criação para acomodar os mais próximos e construir ou manter um “capital político”.
Ainda que decisões corajosas tenham sido tomadas ao longo do tempo para romper com parte desta cadeia destrutiva, o fato é que o efeito cumulativo de inúmeras irresponsabilidades, inclusive financeiras, espelham um futuro de enormes dificuldades e de necessárias novas medidas estruturais rígidas e que promovam uma mudança de trajetória no respeito a gestão fiscal do município. O momento é de “fazer mais com menos” (“ou mais com quase nada!”). Assim, reduções forçadas de folhas de pagamento, com corte longitudinal de remunerações, alterações drásticas de gratificações e cargos comissionados, exclusão das cessões, especialmente as com custo para o município, bem como dos famosos “à disposição” (normalmente de cônjuges e de parentes de autoridades), fim das licenças, inclusive algumas “médicas” sem qualquer base legal/técnica (mantidas as transferências de servidores apenas quando na forma de permuta), e o uso apenas dos servidores próprios para movimentar a máquina, com alocação de pessoal internamente, sem o uso de RPAs, inicialmente, parece ser a medida única que se vislumbra.
Seria o início de uma quebra (real) de paradigmas, atrelado a manutenção do mínimo necessário, em um espaço de tempo delimitado, para reajuste da curva de despesas, a fim de imprimir um senso de substanciamento às realizações governamentais. Certamente não será ano de promessas aventureiras, muito menos de discursos de campanha. Todos servidores devem ser convocados à realidade, a começar pelos maiores gestores. Não há outra saída! Não haverá ninguém disposto a investir “dinheiro novo” (honesto) em um município que funcionaria como um “ralo”, por onde escoam as boas ideias. Somente com seriedade, coragem e sacrifício da própria imagem política poder-se-á promover mudanças que nossa cidade necessita, urgentemente. São ideias simples, mas sua operacionalização custa “o sangue político” do gestor (que muitos não querem sangrar) e urge implementa-las. Continuaremos no assunto!

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