O Planejamento de Ações Imediatas no Combate ao Covid-19 é para Engenheiros Sim
- Atualizado em 24/07/2020 11:09
BNB CIÊNCIAS
Por Joaquim José da Cunha Júnior*
Artigo**
Planejamento e implantação de ações imediatas de combate ao COVID-19: é coisa de Engenheiro sim! A pandemia ocasionada pelo novo coronavírus (COVID-19) impõe à sociedade contemporânea a criação de soluções para problemas que até então eram desconhecidos.
Em essência, a engenharia deve, naturalmente, contribuir para a construção dessas soluções por meio do emprego de todo o seu conhecimento científico e a serviço do conforto e desenvolvimento da humanidade.
A falta de medidas farmacêuticas para o combate à desta doença e sua facilidade de proliferação obrigaram populações ao redor do mundo a se isolarem socialmente alterando a dinâmica do comércio, indústrias, educação e com grandes reflexos no quotidiano das pessoas.
Do ponto de vista das políticas públicas de enfrentamento a pandemia, para além de toda a operacionalização das atividades do sistema de saúde em si, existem dois grandes desafios: primeiro, estimar o volume de pessoas que contrairão a doença e seus respectivos impactos na capacidade de atendimento dos serviços de saúde e, segundo, avaliar a efetividade das políticas públicas de enfrentamento(como, por exemplo, o uso de decretos que restringem o funcionamento do comércio e impõem o isolamento social).
No que diz respeito ao primeiro desafio, que é estimar o volume de pessoas infectadas, a questão central é estabelecer uma metodologia tratável e confiável que permita projetar o volume de indivíduos que serão infectados e os respectivos desdobramentos decorrentes dessas infecções.
Pacientes que contraem coronavírus podem ser assintomáticos, situações nas quais, embora, na maioria das vezes, não saibam que contraíram a doença, podem contribuir de forma silenciosa para sua propagação.
Há outros casos, porém, em que os pacientes apresentam apenas sintomas leves, podendo, nesses casos, tratar da doença sem necessidade de buscar atendimento hospitalar.
Uma parcela dos infectados se tornam pacientes com sintomas graves, situações que demandam atendimento médico-hospitalar e, por fim, há os casos que evoluem para o quadro crítico, demandando terapia intensiva o que, no limite, é principal gargalo do SistemaÚnico de Saúde do Brasil dadas as limitações de leitos de em CTIs e UTIs.
Esta projeção, embora dependa de fatores muito específicos como o período de incubação da doença e sua infectividade, estudados pelos especialistas em infectologia, pode ser apoiada pelo emprego de técnicas suporte a decisão frequentemente ensinadas e utilizadas no contexto da Engenharia.
A PesquisaOperacional, por exemplo, unidade curricular frequente nos cursos de engenharia e tecnologia e que reúne um conjunto de técnicas para dar suporte a decisões comuns no contexto de gestão e operações como a sequência com que itens são produzidos em uma fábrica, a melhor forma de alocar recursos em um projeto até a construção de horários de aulas em instituições de ensino, pode e vem contribuindo para a construção de cenários de transmissão do COVID-19.
Com base nos dados de países que identificaram os primeiros casos da doença há mais tempo que o Brasil como a China, Coréia do Sul e Estados Unidos e em um modelo epidemiológico compartimentado que divide indivíduos de uma localidade em susceptíveis, expostos, infectados ou recuperados existe um grupo de trabalho que é liderado por dois engenheiros (o Engenheiro Químico, Prof. Dr. BraulioCouto, pesquisador da Biobyte Sistemas e por mim, Engenheiro de Produção) e um médico infectologista (Dr. Carlos Starling, da Sociedade Mineira de Infectologia) que vem projetando cenários e apoiando as ações de enfrentamento à doença.
Basicamente, a metodologia se baseia em modelo matemático de otimização não-linear (uma das técnicas da Pesquisa Operacional) que é capaz de estimar o número básico de reprodução, também conhecido como R0, para diferentes fases da doença.
Na prática, utiliza-se uma técnica de minimização dos erros existentes entre previsões da quantidade de indivíduos infectados e as quantidades que realmente ocorreram naqueles países cuja doença já apresenta um histórico maior dado o intervalo de tempo transcorrido desde o registro do primeiro caso.
Com base nessa informação é possível então criar cenários para o avanço da doença em diferentes localidades no Brasil.
Essas projeções permitem aos gestores públicos planejar, de maneira mais fundamentada, ações futuras como a abertura de novos leitos hospitalares, aquisição de equipamentos de proteção individual, respiradores ou até mesmo, num cenário mais crítico, a demanda por sepultamentos ocasionados pelos óbitos oriundos da infecção.
Outro aspecto importante é que o comportamento da curva de infectados pode mudar de acordo com a efetividade das políticas públicas implantadas e também devido a fatores regionais como o clima, cultura e comportamento da comunidade.
Nesse aspecto, o monitoramento da forma como a doença vem sendo transmitida também pode ser uma importante ferramenta de apoio no processo de gestão dos atores públicos.
A efetividade de um decreto que proíbe a abertura de comércio e restringe a circulação das pessoas, por exemplo, é frequentemente questionada.
Em Belo Horizonte, por exemplo, é possível notar após a implantação do primeiro decreto municipal restringindo o funcionamento de grande parte do comércio, houve redução importante do número básico de reprodução da doença na cidade.
Essa avaliação se tornou possível, novamente, pela utilização de um modelo matemático capaz de calcular o valor instantâneo dessa constante R0 para cada dia desde o registro do primeiro caso.
Além disso, para simplificar a sua análise e torna-lo uma ferramenta de monitoramento da evolução da transmissibilidade da doença, utilizou-se o conceito de média centrada móvel, comum em processos de planejamento da produção com base em séries temporais.
Assim é possível, além de avaliar os reflexos (positivos ou não) das ações que foram tomadas, realizar nossas projeções do avanço no número de pessoas infectadas no futuro.
Uma outra discussão muito polêmica que enfrentamos hoje diz respeito a efetividade ou não do isolamento social. Embora haja consenso entre os infectologistas acerca do potencial de redução da transmissibilidade da doença por meio dessa ação, há ainda quem discuta a sua aplicabilidade ou necessidade no Brasil.
Nesse sentido, existe um estudo deste mesmo grupo denominado “Restrições de mobilidade para o controle da epidemia de COVID-19."
-----------------------------------------------------------------------------------------------------
*Joaquim é  Engenheiro de Produção, Mestre em Produção e Logística e Doutor em Pesquisa Operacional, e  partir da próxima segunda será o reitor da UniRedentor, Itaperuna-RJ.
**Artigo publicado originalmente no jornal  O Estado de Minas, dentro de texto do médico infectologista e Mestre em Medicina Carlos Starling

ÚLTIMAS NOTÍCIAS

    Sobre o autor

    Nino Bellieny

    [email protected]