Luta por indenização milionária para praia de Atafona
Arnaldo Neto 26/06/2020 21:56 - Atualizado em 30/07/2020 18:04
Ressaca e maré alta em Atafona
Ressaca e maré alta em Atafona / Divulgação
O processo de erosão costeira em Atafona, distrito de São João da Barra, está no noticiário regional desde os anos 50 do século passado, como mostra a edição de 17 de fevereiro de 1959 do extinto jornal campista “Folha do Povo”. E também é desde então que se discute, inclusive com promessas de políticos, um projeto que possa conter ou desacelerar o avanço do mar. Mas nada passou do campo das discussões. Nos últimos anos, movimentos populares começaram a tomar as ruas cobrando providências. Um deles, o SOS Atafona, ganhou personalidade jurídica e agora acionou a Justiça Federal, nessa quarta-feira (24), buscando uma indenização de R$ 100 milhões, tendo como réus a União, a Agência Nacional de Águas (ANA), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o Instituto Estadual do Ambiente (Inea), o Estado do Rio de Janeiro e o município de São João da Barra. A ação também pleiteia que Atafona seja considerada patrimônio cultural brasileiro. Presidente do SOS Atafona, Verônica Ammar diz que a ação representa a voz da comunidade. Já o ecohistoriador Aristides Soffiati não acredita que a ação possa prosperar, inclusive por questões técnicas.
Estão entre os principais objetivos da ação civil pública, com pedido de tutela antecipada, estão a “preservação da faixa litorânea e a abertura do canal navegável, no interesse dos pescadores, já que a foz do rio hoje está obstruída, além de recomposições diversas relativas ao meio ambiente”, bem como “devolver à praia de Atafona o mínimo de segurança e tranquilidade para aqueles que ali vivem especialmente a comunidade pesqueira e os que ali vão ter, em busca de qualidade de vida”.
Na peça, os advogados do SOS Atafona, Geraldo Machado e Luiz Rocha, da diretoria da associação, observam que o processo erosivo da costa tem influência direta com a perda de força do Paraíba do Sul desde os anos 1950. Neste período, segundo o texto, mais de 500 casas — de pescadores, moradores locais e veranistas — foram levadas pelo mar. “Praticamente tudo se iniciou da construção da Usina Santa Cecília, de que resultou o sangramento do rio para abastecer a cidade do Rio de Janeiro e Região Metropolitana [sistema Guandu]: após isso, o rio começou o seu declínio e, posteriormente, com a construção de diversas outras usinas, as barragens são meios efetivos de perda de força fluvial e consequente assoreamento”, observa o texto do SOS Atafona.
Ação é apontada como a voz da comunidade
Presidente do SOS Atafona, Verônica Ammar, lembra que ao longo dos últimos anos muitos protestos foram realizados na tentativa de sensibilizar o poder público quanto à necessidade de intervenções para conter o avanço do mar e também solucionar a questão do assoreamento da foz do Paraíba, que mais uma vez se fechou, com a união do que sobrou do Pontal e da Ilha da Convivência:
— A propositura da ação representa a voz de toda comunidade de Atafona, a fim de mobilizar todos os demais entes a apresentar uma solução plausível ao fenômeno erosivo; levando em consideração a omissão dos entes públicos, e, sobretudo do município de São João da Barra nos mais de 50 anos de luta, sem uma solução a ser apresentada a comunidade pesqueira que ali habitam.
Verônica destaca que a atual ação é mais abrangente do que propostas anteriores. “Inclusive há o pedido de retirada da areia acumulada (dunas) e sua respectiva recolocação na faixa (engordamento), pagamento do benefício de auxílio moradia em atraso, além do mais permitir maior navegabilidade aos pescadores com obras de desassoreamento do leito do rio Paraíba do Sul”, pontuou.
Soffiati: “Natureza não foi feita para o nosso deleite”
O ecohistoriador Aristides Soffiati classifica como fracos os argumentos da ação que pede a indenização de R$ 100 milhões e o tombamento da praia de Atafona. Ao destacar a existência de um lado sentimental, que respeita, Soffiati diz que o processo natural tem que ser observado sobre o prisma científico, não adequando aos desejos do homem:
— Tem gente que fala: “Ah, a duna não deixa eu ver esse mar maravilhoso”. A natureza não foi feita para o nosso deleite, você não pode organizar a natureza de acordo com as suas vontades. É mais fácil examinar a questão por um prisma mais científico, tentando explicar os barramento no rio Paraíba, transposição de água, elevação do nível do mar. Tudo está mundo e precisa ser levado em consideração. Não vai ser com um abraço, nem com as pedras que vai resolver isso.
O ecohistoriador lembrou que na década de 1990 foi realizada uma ação para retirar as dunas e a impressão foi que o mar avançou com maior intensidade. Sobre o assoreamento do Paraíba, citou o projeto do Eduardo Bulhões, que prevê o bombeamento constante da areia para o engordamento da praia como o mais viável para a realidade de Atafona.

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