Encontrar vestígios de corpos é "praticamente impossível", diz presidente de comissão
20/02/2020 07:48 - Atualizado em 10/03/2020 14:51
Marcus Vinícius Carvalho participou do Folha no Ar
Marcus Vinícius Carvalho participou do Folha no Ar / Genilson Pessanha
Presidente da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, o advogado Marco Vinícius de Carvalho afirmou, em entrevista ao programa Folha no Ar, da rádio Folha FM, nesta quinta-feira (20), que é “praticamente impossível” de encontrar qualquer possíveis vestígios dos corpos de 12 presos políticos que teriam sido incinerados nos fornos da Usina Cambaíba, em Campos, pela ditadura militar, como relatado pelo do ex-delegado do Departamento de Ordem e Política e Social (Dops) Cláudio Guerra. Advogado e assessor da ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos Damares Alves, Carvalho também disse que, se fosse da família Ribeiro Gomes – proprietária da usina durante o período – entraria na Justiça contra Guerra para buscar uma reparação financeira. O presidente da comissão declarou que não há ingerência do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) no trabalho do grupo, porém, assim como Bolsonaro, ele nega a existência da ditadura, a qual chama de “governo militar”.
O MPF concluiu inquérito, no ano passado, na qual afirma que os depoimentos de Cláudio Guerra são verdadeiros e pede seu indiciamento por ocultação e destruição de cadáveres. A ação corre na Justiça Federal de Campos e, ainda dentro das investigações, a promotoria realizou uma reconstituição com a presença do ex-delegado do Dops em Cambaíba em 2014. Seis anos depois, o local onde ficavam os fornos da usina virou ruína. Marco Vinícius e dois peritos criminalistas estiveram no antigo parque industrial na última quarta-feira (19), porém, o presidente da comissão descreveu o que viu como “caótico”.
— Nos deparamos com uma situação caótica. Os locais onde supostamente foram incineradas as pessoas estão totalmente destruídos. Não temos elementos sequer para começar qualquer trabalho nesse sentido porque tudo virou escombro. E nesse momento surgem várias especulações, como a de que membros do governo foram lá e derrubaram. O governo não tem a menor intenção de encobrir qualquer situação desta, muito pelo contrário. Nossa comissão tem o dever e o compromisso principalmente com familiares das pessoas. Estamos ligados ao Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos e entendemos como direito humano da família sepultar seus mortos.
A partir das condições encontradas em Cambaíba, Marco Vinícius praticamente descartou a possibilidade de se identificar qualquer eventual vestígio. “Essa situação aconteceu nos anos de 1970, essa usina ficou operando até 1998, esses fornos atingiram as temperaturas de aproximadamente 1000ºC e ficavam funcionando por cerca de seis meses. Depois, eles eram raspados para retirar as cinzas e, segundo as informações dos atuais donos, esse material era misturado ao vinhoto e descartado. É muito difícil que se encontre alguma situação ali. Vamos supor que se encontre algum vestígio de material orgânico humano. Dado essas circunstâncias, seria possível extrair material genético? Acho muito difícil”.
Para ele, Cláudio Guerra pode ser responsabilizado na Justiça caso suas declarações não sejam comprovadas. O advogado disse, inclusive, que se fosse da família Ribeiro Gomes buscaria alguma indenização. “Ele se coloca na posição de poder ser responsabilizado civilmente e até criminalmente por aquilo que escreveu. Nós da comissão não temos qualquer relação com isso, nosso trabalho é tentar identificar qualquer vestígio, o que, no momento, é praticamente impossível. Se eu fosse membro dessa família, procuraria a Justiça para buscar reparação contra o Cláudio Guerra. Esse tipo de afirmativa, embora diga que quis fazer uma limpeza de consciência, talvez esteja implicando pessoas que podem não ter nada a ver com isso”.
Apesar de presidir a Comissão sobre Mortos e Desaparecidos Políticos que apura casos que aconteceram na ditadura, Marco Vinícius não reconhece o período como “ditadura” e o chama de “governo militar”.
— Sobre a ditadura, eu, particularmente, chamo de governo militar. Existe uma guerra de discurso e é natural com relação como cada um vê o que aconteceu e trabalhamos em perfeita harmonia com o governo. Não somos tolidos em nenhum tipo de situação que tenhamos de fazer. Havia, sim, um ambiente de uma certa repressão porque havia grupos antagônicos ao governo. Eu costumo dizer que precisamos tratar esse período como de guerra interna. E com recorrência da utilização de instrumentos de guerra mesmo, com armas, guerrilhas. Quando você entra para um ambiente de guerra, costumo dizer que ninguém tem razão. O que questiono é que só se verifica os excessos cometidos pelos militares.
Confira entrevista completa:

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