Crítica de cinema: Feitiço desnecessário
*Felipe Fernandes 19/10/2019 10:51 - Atualizado em 23/10/2019 17:31
Divulgação
(MALÉVOLA — A DONA DO MAL) —
Dentro da proposta da Disney de refazer em live-action seus maiores sucessos, atualizando seus personagens para as novas gerações, “Malévola”, no filme lançado em 2014, foi uma dos que mais fugiram do desenho original. A começar pelo fato de a história ser narrada buscando o ponto de vista da vilã e não da Bela Adormecida, passando por mudanças consideráveis que fizeram do filme mais que uma mera cópia. Muito desse efeito também é proveniente da atuação imponente de Angelina Jolie, ponto mais forte do longa.
Com o sucesso de bilheteria, uma continuação era inevitável, mesmo que totalmente desnecessária. “Malévola: A dona do mal” chega aos cinemas dando sequência à trama do sucesso de 2014 e trazendo Jolie de volta a um de seus papéis mais marcantes.
Na trama, a princesa Aurora (Ellen Fanning) e o príncipe Phillip (Harris Dickinson) vão se casar, e essa união promete por um fim aos conflitos entre os reinos dos humanos e das criaturas mágicas. Aurora e Malévola (Angelina Jolie) são convidadas para um jantar com os pais do noivo. Durante o evento, as coisas saem do controle, Malévola é acusada de enfeitiçar o rei, e a rainha Ingrith (Michelle Pfeiffer) assume o controle da situação e do matrimônio.
Desde seu primeiro momento o filme demostra a falta de cuidado com sua narrativa. O pedido de casamento já acontece no primeiro encontro do casal. Em nenhum momento a relação deles é minimamente trabalhada, eles se amam e pronto. O jantar de confraternização se torna o ponto principal deste primeiro ato, onde rapidamente conhecemos os personagens e, com muito pouco (e isso não é um elogio), descobrimos que o Rei é um pacifista ingênuo, e a rainha a vilã sórdida, dona das frases de efeito.
Esse primeiro ato do filme é agradável. A preparação de Malévola, o humor, a tensão na mesa e o desenrolar das açõe realmente funcionam. O problema é ao término dessa sequência. Os roteiristas demonstram que não sabem o que fazer com a história, provando ainda mais o quão desnecessária é essa continuação.
O filme se torna basicamente o plano da Rainha dando certo; Aurora cada vez mais perdida, renegando a mãe adotiva e fazendo dela vilã, um artifício já usado no primeiro filme. E a protagonista assume uma história secundária, onde ela encontra outros seres como ela e simplesmente tem um arco dramático, que não é o foco principal do filme e a deixa com pouco tempo em cena.
A personagem-título é deixada em segundo plano, em uma trama cheia de conveniências que não acrescentam nada dramaticamente. Eles buscam criar uma espécie de mitologia para a personagem, mas a própria Malévola não demonstra muito interesse pela história, nem por seus iguais. Essa subtrama só contribui para a pirotecnia das batalhas.
O terceiro ato do filme mostra a guerra entre os reinos, uma batalha longa que cansa o espectador pela falta de tensão e criatividade. As mortes não são sentidas, não têm peso dramático, é tudo muito superficial, e Malévola ainda surge como um deus ex machina que resolve praticamente tudo sozinho, em mais uma demonstração da fragilidade do roteiro.
A pá de cal é a conclusão, onde tudo se resolve literalmente em um passe de mágica. Absolutamente tudo é esquecido em prol do final feliz. Tudo bem que se trata de um filme teoricamente infantil, mas isso nunca pode servir de desculpa para um desfecho preguiçoso.
Merece destacar o visual do filme, que é realmente exuberante, muito colorido, bonito de apreciar. Os efeitos especiais também são muito competentes, as criaturas são carismáticas pelo aspecto visual, apesar de haver pouca diversidade, afinal estamos falando de um reino.
O diretor norueguês Joachim Ronning faz um trabalho burocrático, uma direção sem inspiração, sem personalidade, uma característica que se espalha por todo o filme.
A trinca de atrizes é a parte boa do filme. Angelina Jolie tem pouco tempo de tela para uma personagem que leva o título o filme, um fator preocupante que demonstra a bagunça que é essa produção. Mas, sempre que surge em cena, ela rouba as atenções. Sua presença imponente e até o humor desajeitado dela funcionam. Elle Fanning até se esforça, mas sua personagem não é cativante, e ela acaba sucumbindo em meio às duas atrizes tão envolventes. A grande adição ao filme é Michelle Pfeifer, que, apesar de interpretar um clichê, consegue engrandecer a personagem, e fica a sensação que esse mérito é somente do trabalho dela.
“Malévola: A dona do mal” é um filme realizado pelos motivos errados e que demonstra isso em diversos momentos. Não acrescenta nada de relevante para a personagem, além de deixá-la grande parte do filme fora do foco principal, um erro que não dá para entender, ainda mais quando você tem Angelina Jolie tão à vontade no papel. Em um ano tão especial para a casa do Mickey, a continuação de Malévola é o ponto negativo fora da curva.

ÚLTIMAS NOTÍCIAS