Brumadinho: 9 meses do crime. Não esqueceremos! Veja fotos que fizemos lá
27/10/2019 22:20 - Atualizado em 30/10/2019 17:17
Texto e fotos por: Thaís Tostes
Há 9 meses, completos na última sexta-feira (25), o Brasil viveu talvez o que tenha sido sua maior tragédia sócio-ambiental: o rompimento da Mina do Córrego do Feijão, da Vale, em Brumadinho-MG. Nós do blog, midiativistas e ativistas de Direito Animal e Direitos Humanos, estivemos lá na semana do rompimento da barragem de minério de ferro (o Ibama demorou tanto que quase chegamos antes dele) e logo que pisamos na cidade a atmosfera que sentimos era uma atmosfera fúnebre. Milhares de vidas foram interrompidas: vidas de animais humanos e não-humanos. É impossível fechar essa conta. Pela cidade, muitas velas derretidas por todos os lados, flores, carros e mais carros dos Bombeiros, Defesa Civil e outros órgãos de resgate e segurança. E os moradores locais como que num estado meio de choque, meio paralisados, quase não conseguindo falar com a gente - e nem insistimos, também.
Estivemos lá para ajudar o máximo que conseguíssemos e, também, registrar algumas imagens, que você pode conferir abaixo. O cenário era totalmente desolador - batia uma tristeza tão profunda, porque envolveu a interrupção de tantas almas, que levamos algum tempo para nos recuperarmos psico-emocional-espiritualmente do período em que estivemos lá. Focamos nossas ações nos setores que menos estavam recebendo ajuda, tanto da Vale quanto de voluntários: os animais (que foram abandonados nas casas e pelas ruas), os índios Pataxó da aldeia Naô Xohã e os sem-terras do Acampamento Pátria Livre (que fica em São Joaquim de Bicas-MG, divisa com Brumadinho).
Na ocasião, já havia dias do rompimento da barragem e do impacto completo sobre o Rio Paraopeba, que virou não um mar de lama (porque não era lama, era minério!), e a Vale ainda não havia levado água para os índios e nem para os sem-terras. Muitos animais (como cavalos, galinhas, cachorros e gatos) estavam morrendo de sede e fome (muitos morreram, de fato) por várias regiões da cidade, a despeito de uma liminar expedida pela Justiça que obrigava a Vale a socorrer todos os animais vítimas do crime. A liminar, na verdade, serviu mais para impedir que os ativistas fizessem os resgates, porque após a liminar apenas a Vale poderia pegar esses animais, bloqueando a ação dos defensores de Direito Animal. A Vale chegou a colocar tapumes de madeira para impedir que ativistas chegassem com carros até os locais onde os animais estavam agonizando no minério de ferro.
Além disso, para quem não se lembra ou não acompanhou, vale recordar: a Vale foi responsável pelo assassinato de animais com tiros disparados por fuzil, de cima de helicópteros, como relatou, na época, um repórter do Estado de São Paulo, que estava fazendo a cobertura dentro de uma mata. Foi a Polícia Rodoviária Federal que sobrevoava o local com uma aeronave que tinha como meta executar, com tiros, animais ilhados, presos na lama ou feridos.
A Vale feriu tanto os Direitos Humanos quanto o Direito Animal, porque ela deveria ter um plano de emergência de resgate humano e animal, para caso a barragem viesse a se romper. Assim, imediatamente iniciariam as buscas por animais humanos e animais não-humanos, simultaneamente - a busca por vidas, e não a busca por algumas vidas, em detrimento de outras. Ela falhou em tudo.
Nós presenciamos patinhos nadando no minério de ferro (não sabemos quantos minutos de vida eles teriam pela frente, depois de mergulharem na contaminação), bagres (os últimos peixes sobreviventes) dando os últimos suspiros sob a água marrom-minério, micos no meio das matas morrendo de sede e recebendo como água apenas a água cheia de plástico de garrafas-pet, que foi levada até eles pela misericórdia dos índios. Durante todo o tempo em que estivemos na aldeia, presenciamos também a pontualidade dos trens de minério de ferro, que não pararam de passar por ali, a despeito das milhares de mortes. As crianças indígenas, que tomavam banho no rio, tomavam banho de tanque, com a pouca água que eles tinham, racionalizada. Os animais, muitos ficavam presos, para não mergulharem no rio contaminado.
Nove meses após o crime (falamos em crime porque a cidade não encarou o episódio como uma tragédia, um "acidente"), recebemos a informação de que muitos indígenas estão passando fome na aldeia, porque o "boom" do caso já diminuiu, assim como os holofotes, e então o voluntariado reduziu. Algumas famílias indígenas receberam suporte da Vale, depois de muita demora, mas muitos estariam com o suporte em atraso e outros ainda nem o teriam recebido.
A Polícia Civil disse que o inquérito que apura as causas e aponta os responsáveis pelo rompimento deva ser concluído em breve. A perícia necessária para identificar o que provocou o rompimento da barragem B1 já foi realizada e a equipe trabalha, agora, na elaboração dos laudos para a conclusão do inquérito, que já possui mais de 5 mil páginas impressas. Mais de 170 pessoas foram ouvidas. 
Pretendemos voltar em breve.
“A gente fez o que pôde, realmente fomos derrotados no rompimento dessa barragem que matou tanta gente. Nos dói muito, porque a gente se esforçou muito para que isso não acontecesse. Mas agora que aconteceu, não temos outra opção senão seguir lutando por justiça e para que isso não aconteça com mais ninguém.", disse, em entrevista, Carolina de Moura Campos, coordenadora-geral da Associação Comunitária Jangada e integrante da luta por justiça por Brumadinho. Carolina, na companhia do advogado Danilo Chammas (da organização Justiça nos Trilhos) e da vítima Marcela Rodrigues (do Movimento Águas e Serras de Brumadinho), está na Europa para pedir ajuda internacional neste caso. “Estamos preocupados com algumas práticas econômicas agressivas ao meio ambiente e às populações, como o agronegócio e a mineração.", disse Danilo.
LUTO POR BRUMADINHO
JUSTIÇA PARA BRUMADINHO

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