O livro que Osório Peixoto escreveu, mas repudiou
- Atualizado em 02/06/2019 07:41
Ano -1970.
Osório Peixoto, socialista, acossado por violenta crise financeira, vira a noite fazendo um livro de cordel para Alair Ferreira, líder da Arena no Estado do Rio.
No dia seguinte, Osório vai ao escritório do deputado, na rua 13 de Maio, e apresenta-lhe o cordel de sua vida política.
Alair lê, atento, e pergunta:
— Quanto vou pagar por isto?
— Não sei, o senhor é quem faz o preço. Se eu pedir, peço muito pouco. E tem mais! O cordel deve sair com o pseudônimo de Zé dos Campos — recomenda Osório.
Alair concorda com o pedido. Quanto pagou pelo livro não se sabe, mas o jornalista e poeta assegurou pelo menos três meses de comida, água, luz e outras coisas.
Como tudo não são flores na vida de um poeta, Osório, dias depois, encontra-se com o advogado Elmar Martins. Com um sorriso sarcástico, Elmar dispara:
— Descobrimos o Zé de Campos, essa pessoa que, de vez em quando, goza alguém na cidade!
— De que maneira descobriram o tal sujeito? Quem é? — pergunta Osório, aflito.
Elmar estende ao poeta um livro branco, miudinho, com o título “O Deputado da Gente”. A princípio, Osório não entende nada, mas Elmar pede que dê uma olhada mais atenta no livro.
Na segunda página, em destaque, está lá:
“Obrigado, Osório Peixoto! Somente você, com sua inteligência e sensibilidade, poderia escrever tão bem sobre minha vida. Muito obrigado! Alair Ferreira”.
Osório, atônito, sai em direção à rodoviária, onde pega um ônibus com destino a Atafona. E se enfurna ali por 15 dias para passar a ressaca moral com o fato de as pessoas tomarem conhecimento de que ele, crítico da ditadura, produzira um livro para um deputado da Arena.
Sorte dele que o período era de inverno e havia pouca gente na praia.

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    Sobre o autor

    Saulo Pessanha

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