Movimentos em defesa de Atafona oscilam com a maré
Avanço do Mar em Atafona
Avanço do Mar em Atafona / Paulo Pinheiro
Atafona tem seu encanto. Não é a mais bela das praias, não tem água clara, não oferece opções de lazer como outros balneários próximos. Mas tem charme. E um saudosismo que reúne muita gente. São histórias da infância e da adolescência, relatos de encontros onde hoje tudo está submerso, recordações que fazem muita gente viajar no tempo, ao começar uma conversa sobre a praia. E outra característica de Atafona é a hereditariedade da paixão. Quem vive na praia é amigo de veranista, os filhos de quem lá reside também vai ser amigo dos filhos dos que veraneiam e assim segue, ao longo de muitos anos, sucessivamente. E essa relação tão forte só se quebra — ou distancia — quando o mar, como tem feito há muito tempo, leva mais um pedaço do litoral sanjoanense.
Nos últimos anos, movimentos populares ganharam voz na defesa por uma obra de contenção do avanço do mar. Mas esses movimentos ganham e perde força junto com a maré. Basta o mar acalmar por um tempo, recuar um pouco, que os grupos arrefecem. Por outro lado, quando a força das águas vem lambendo mais um patrimônio, um pedaço da vida e da história de alguém, todos se inflamam novamente. Talvez seja por isso que ninguém tenha visto até hoje nada de efetivo para tentar contornar — não controlar, porque é impossível — a força da natureza.
Não precisa pesquisar muito para encontrar no extinto jornal campista Folha do Povo, de fevereiro de 1959, no qual o então deputado estadual Simão Mansur (1915-1968) informava que lutaria por um projeto com “'Espigão' para garantir sobrevivência do Pontal, em Atafona”. De lá pra cá, muitos foram os deputados que fizeram a mesma promessa, de tentar salvar o que restava do Pontal, até que hoje não reste mais nada.
O interesse verbalizado por políticos, de diferentes correntes partidárias, nem sempre resulta em ações práticas. A cada audiência pública para tratar do tema, parece ser menor o número de participantes. Isso é o reflexo prático da descrença quanto à solução, ainda que paliativa. E quando se fala em ações paliativas, não são aqueles sacos de areia que surgem em grande escala no período de maré alta.
O município de São João da Barra tem atualmente dois projetos que são viáveis para tentar conter o mar em Atafona. O primeiro, apresentado desde o governo do ex-prefeito Neco (MDB), é o do Instituto Nacional de Pesquisas Hidroviárias (INPH). O estudo tem como base experiências exitosas em outras praias do país. O outro é do conceituado professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) Eduardo Bulhões, apresentado recentemente à população e à prefeita Carla Machado (PP). Ele prevê, em suma, o bombeamento constante de areia para aterrar a área na qual o mar avança.
O primeiro é considerado muito caro, como já foi dito exaustivamente nas notas oficiais da Prefeitura. O segundo, está em análise e, para a municipalidade, é economicamente viável. Não dá mais para continuar esperando. A burocracia precisa ser ultrapassada e começar a ter retornos práticos dessas promessas de recuperação da orla.
E também não dá para achar normal que um município produtor de petróleo, com orçamentos gigantescos nos últimos anos — que sofreu também, obviamente, com a queda de sua principal receita recentemente —, uma população pequena e com pouca extensão territorial, não tenha pensado ao longo dos anos em contingenciar parte do orçamento pensando nessa questão do litoral. E a crítica aqui não é a um governo, mas aos sucessivos que pegaram receitas crescentes.
O saldo do petróleo para SJB foi, infelizmente, o de um inchaço da máquina pública, transformando a Prefeitura na principal empregadora da cidade. Campos tem maus exemplos de aplicação de recursos públicos, como o Cepop, a Cidade da Criança, o granito da Praça do Santíssimo Salvador, os escândalos de corrupção em investigação. SJB nem uma obra grande, com recursos próprios, conseguiu fazer. Além disso, faltou incentivos para acabar com a dependência.
Os royalties agora estão em risco, já que o Supremo Tribunal Federal (STF) vai julgar a liminar que mantém o atual sistema de distribuição. Além disso, é um bem finito, e tende a entrar em declínio natural para a região. O passado não tem como consertar, nem há como trazer de volta o que o mar levou de Atafona. SJB tem em seu território o Porto do Açu, um alento no ainda complicado cenário econômico nacional. A força do porto já faz, e fará ainda mais, o município melhorar suas receitas próprias.
O caso da contenção do avanço do mar em Atafona é um clássico do que poderia ter sido aplicado recursos dos royalties, mas não houve esse planejamento. Agora, com movimentos de luta que somem e aparecem ao mesmo tempo que muda a força da maré, é até injusto querer colocar a responsabilidade só nos políticos ou no poder público. Todo mundo, que some quando o mar recua e aparece quando avança, tem sua responsabilidade ao ver cada pedaço de Atafona ser levado pelas águas.
Publicado na edição desse domingo (12) na Folha da Manhã

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    Arnaldo Neto

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