A Educação Brasileira: Desafios Contemporâneos e Possibilidade de Novos Percursos
*Inês Cabral Ururahy de Souza - Atualizado em 20/09/2018 18:43
Inês Cabral Ururahy é reitora do Uniflu e membro da ACL
Inês Cabral Ururahy é reitora do Uniflu e membro da ACL / Divulgação
A educação, no Brasil, chega à segunda metade do século XXI vivendo um dos seus momentos mais críticos: ensino básico deficitário; ausência de vagas para todas as crianças na faixa etária de frequentar as creches; defasagem em tecnologia educacional em comparação com outros países; índices de analfabetismo estacionários; baixa qualidade na formação inicial e continuada dos professores; ensino universitário não acessível a todos os jovens concluintes do Ensino Médio; retirada de recursos destinados às pesquisas científicas das Universidades; além de muitos outros fatores determinantes que apontam para a situação do ensino brasileiro.
Este quadro, se por um lado, reflete o descaso das autoridades com a educação ao longo da história; por outro, explica as dificuldades enfrentadas pelo país no tocante ao seu desenvolvimento, pois, conforme análise de vários estudiosos, em momentos de crise e incertezas, o investimento em educação é crucial, na medida em que o conhecimento abre portas, perspectivas e oportunidades criativas de emancipação econômica, cultural, social, humana.
As desigualdades sociais, que fazem parte da realidade brasileira, ganham dimensão maior quando se analisa a extensão de uma nação marcada pela diversidade cultural, climática, espacial, acrescidos os fatores socioeconômicos que definem a divisão política dos estados e regiões. Como um país de grandes dimensões territoriais e locais de forte aglomeração urbana, fica difícil pensar em formas de ensino, que não levem em consideração essas questões.
Um ponto a ser analisado é que o processo de globalização e a presença do país entre as economias emergentes do mundo contemporâneo fizeram com que o Brasil importasse modelos educacionais de países europeus. Sabe-se que, na reforma de ensino, houve forte influência da reforma espanhola e mesmo de experiências de outros países.
Segundo analistas atuais, a realidade tem mostrado que as decisões legais e políticas sobre a educação, geralmente, partem de especialistas e membros de gabinete, que pouco conhecem do cotidiano, vivido pelos que efetivamente fazem a educação acontecer: os professores dos vários níveis de ensino. Em uma democracia, que deveria ouvir várias vozes, a categoria dos que exercitam a docência e terão que cumprir leis, propostas curriculares, princípios educacionais, é sempre colocada em segundo plano e, quando o segmento desses profissionais é representado, na maior parte das vezes, é por professores, militantes de bandeiras políticas, ou partidárias.
A questão central que se coloca neste momento de mudanças é a seguinte: como os professores e os sistemas de ensino vão enfrentar transformações curriculares, convivendo cotidianamente com um conjunto de problemas estruturais e com a qualidade do trabalho pedagógico, além das questões de natureza social que nunca aparecem entre os fatores educacionais que inviabilizam uma aprendizagem significativa para todos.
Se todas essas questões analisadas não bastassem à educação, além do saber técnico e acadêmico, constitucionalmente tem que se preparar cidadãos, que sejam conscientes dos seus direitos e deveres, comportando-se socialmente como seres éticos e capazes de exercer diferentes papéis na sociedade, sempre em busca da dignidade humana e do respeito às leis e aos seus semelhantes. Em um país marcado por políticos não confiáveis, exemplos negativos de gestão, a educação permanece encurralada, como que evocando valores vazios e um discurso obsoleto.
Na prática, os problemas vivenciados na escola básica refletem-se na universidade, que atualmente representa o microcosmo social, como palco das diferenças presentes na sociedade brasileira. O número de jovens que chega à universidade ainda é muito pequeno se comparado com outros países latino-americanos, pois, diante da precariedade da educação básica e com a diferença de qualidade do ensino nas diversas regiões, poucos alcançam os saberes necessários à entrada nas grandes instituições de ensino superior.
Por outro lado, as universidades particulares lutam para se manter nesse contexto de crise, pois dependem diretamente dos recursos provenientes do pagamento das mensalidades pelos alunos. Muitas delas não conseguem trabalhar com qualidade, estimulando a iniciativa científica e investindo em pesquisa, na medida em que os professores, diante da desvalorização salarial, acabam se dividindo com outras Instituições em busca de uma renda digna.
São poucas as Instituições de ensino superior que, conforme defendia Darcy Ribeiro, podem ter professores dedicados em tempo integral, com compromisso de realizar não só o preparo acadêmico com conhecimento, fruto de análise crítica, mas também, realizar os trabalhos de extensão junto às comunidades, completando com pesquisas que trazem benefício à sociedade.
Todas essas questões mostram que é mais do que urgente que a educação repense toda a sua trajetória da última década, não só para detectar falhas estruturais e obstáculos, mas para buscar espaços para uma ampla discussão coletiva, que traga à tona as mazelas deixadas por modelos equivocados, por formações deficitárias e principalmente ouçam os professores que estão na ponta e possam reivindicar, de forma sistemática, o que consideram importante para mudar a realidade. São muitas as frentes, a começar pela tomada de consciência de que os professores, como bem diz Nóvoa, ex- Reitor da Universidade de Lisboa, são gestores de suas práticas, de seus destinos e devem se comprometer com o futuro daqueles que educam.
A educação brasileira necessita de pessoas que, além de títulos e da experiência, visualizem os processos de ensino a partir do momento histórico em que vivem, no qual o conhecimento, cada vez mais,é dependente das novas tecnologias. Por esse motivo, deve-se buscar o equilíbrio entre a formação cidadã de fundamentos humanos e as competências técnicas de um ensino que, ao utilizar as tecnologias, não abra mão da investigação e do pensamento crítico-reflexivo.
A sociedade brasileira precisa de gente que, ao exercitar sua humanidade, seja capaz de agir socialmente com ética, justiça e respeito ao direito dos diferentes. Se a educação contribuir para formar cidadãos que valorizem essas questões essenciais da formação humana, nós, educadores, teremos cumprido a missão de educar.

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