"Venda do Futuro" interfere na política cultural da cidade
Jhonattan Reis e Celso Cordeiro Filho 01/07/2017 13:57 - Atualizado em 06/07/2017 12:18
Diante dos problemas causados pela “Venda do Futuro” — desde a última segunda-feira (27), caiu a liminar da Justiça Federal que permitia a Campos pagar apenas 10% dos royalties de petróleo recebidos pelo município, em relação ao empréstimo feito pelo governo de Rosinha Garotinho junto à Caixa Econômica Federal, assunto que foi alvo de entrevista com o prefeito Rafael Diniz —, a máquina municipal provavelmente terá que enfrentar tempos de diminuição de recursos financeiros, sendo uma cidade que já enfrentava problemas com orçamento. Em meio a isso, pessoas ligadas à cultura se preocupam com a forma como ficará a área cultural, que foi descrita por personalidades como “a que sempre vem no fim da fila”.
Adriano Moura
Adriano Moura / Rodrigo Silveira
O professor e escritor Adriano Moura ressaltou que “em Campos nunca houve política de cultura”.
— Independente de ter dinheiro ou não, tenho que observar isso. O que há, em vários governos ao longo desses anos, é cultura de eventos com shows milionários. Nunca houve a preocupação de se fazer parcerias com organismos, por exemplo, como a Funarte, que faz parte do Ministério da Cultura. Até agora não houve nenhum aceno de como vai ser a política cultural do atual governo. Mais importante que recursos é ter uma política cultura efetiva que não dependa exclusivamente de recursos públicos.
Fernando Rossi
Fernando Rossi / Folha da Manhã
Já o diretor do Teatro de Bolso Procópio Ferreira, Fernando Rossi, lembrou que a cultura vem sempre “no fim da fila”.
— A cultura é sempre a primeira a receber cortes e a ser enxugada. Todos nós estamos muito apreensivos com esta situação, que influencia muito no futuro da cidade. Esse problema (da “Venda do Futuro”) é lastimável. Acho que o estrago vai ser enorme. Estamos apreensivos e aguardando direcionamentos. Enquanto artista, a gente vislumbra algo melhor. Porém, estamos vivendo um estado de impacto. Lógico que saúde e educação têm que vir em primeiro plano, mas esperamos que cultura não fique, como sempre, em último. Quem sabe a gente não pode se unir e buscar soluções e saídas?
Aristides Soffiati
Aristides Soffiati / Divulgação
A questão foi, também, apontada pelo professor, pesquisador e crítico de cinema Aristides Soffiati.
— Quanto à cultura, em qualquer governo, infelizmente, não é prioridade. O meu temor é com relação ao Museu Histórico e ao Arquivo Público, uma vez que a Biblioteca Municipal foi desativada em consequência da falta de pagamento do aluguel onde estava instalada. O seu acervo foi espalhado por vários lugares. Enfim, é grande a preocupação com o futuro que nos reserva. Essa bomba já estava anunciada e explodiria em qualquer prefeito. Resta a Rafael Diniz negociar da melhor forma possível para evitar consequências danosas ao município.
Cristina Lima
Cristina Lima / Rodrigo Silveira
Presidente da Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima (FCJOL), Cristina Lima ressaltou que a área já está, na verdade, trabalhando sem recursos.
— Estamos há seis meses trabalhando com as mesmas questões: usando de parcerias e de criatividade, porque estamos sem investimentos. Agora, claro, com essa situação realmente se concretizando, a gente vai ter que, cada vez mais, buscar parcerias. A luta vai ser maior. O Trianon, por exemplo, é uma fonte de recursos próprios e poderia ser um escape. Porém, isso é muito relativo, porque a crise, quando chega, chega para todo mundo. A gente tem que aguardar para ver como isso vai ser gerido — falou Cristina, que ainda apontou que a cultura já está acostumada a ter pouco dinheiro.
— O município já teve épocas de riqueza, como nos últimos oito anos, em que havia dinheiro, mas não foram feitos investimentos na área da cultura. Agora, sem dinheiro, vamos ver o que conseguiremos fazer — relatou.
João de Oliveira
João de Oliveira / Folha da Manhã
O artista plástico João de Oliveira usou a palavra “covardia” para descrever a “Venda do Futuro”.
— Na realidade, isso foi uma grande covardia que foi feita, uma herança deixada pelo antigo governo Rosinha. Acho que a Caixa Econômica deveria rever essa última decisão dela em prol exatamente da cultura e da cidade. Com isso, ela daria um aval a mais para o novo prefeito. Acho que o município de Campos merece essa oportunidade de se levantar, porque sem isso a cidade vai enfrentar um caos.
Negociação com a Caixa Econômica
Carlos Freitas
Carlos Freitas / Folha da Manhã
— Na realidade, a cultura é o primo pobre de todas secretariais e fundações. Então, algumas das primeiras coisas a serem cortadas serão na área da cultura. Todos temos o entendimento de que educação e saúde têm que ser prioridade. Não estou falando que a cultura tem que vir antes de tudo, mas sim que ela está sempre em último lugar — disse o diretor do Arquivo Público Municipal Waldir Pinto de Carvalho, Carlos Freitas. Ele comentou, ainda, sobre a situação em que se encontra a prefeitura.
— Está numa situação muito difícil por causa da conjuntura do Estado e do país como um todo. Esse problema vai influenciar em todos os sistemas de trabalho da prefeitura. É uma questão muito difícil e a situação da população vai ficar pior cada vez mais. Ficou uma dívida muito alta para ser paga e, nessa fase de encolhimento de recebimento de imposto, fica muito difícil gerir o município. Espero que o prefeito consiga resolver esta situação o mais rápido possível para que o município não fique cada vez mais mal servido de recursos.
Marcelo Sampaio
Marcelo Sampaio / Rodrigo Silveira
Na visão do professor e pesquisador Marcelo Sampaio, cultura é essencial para a formação de um ser humano melhor.
— Através dela se consegue ter avanços em outras áreas, como a saúde e educação. Desta maneira, entendo que a cultura deve ter total prioridade numa ação do governo — falou Sampaio, complementando: — A atual gestão precisa ter habilidade para renegociar esta dívida com a Caixa Econômica Federal, pois nas bases atuais causa um estrago enorme às finanças municipais. Os governos, de um modo geral, já dão prioridade a outras áreas, que não a cultura. Sem dinheiro, então, seria o caos.
Lucia Talabi
Lucia Talabi / Divulgação
Já para a superintendente de Igualdade Racial, Lucia Talabi, a população precisa não ficar parada.
— A população tem todo o direito de fazer as suas reivindicações, orientar propostas e apresentar soluções, e deve fazer isso. Acho necessário agora que todos se mobilizem. Não houve transição e as coisas estão aparecendo agora. Não dá para achar que isso tudo vai ser revertido de uma hora para outra. Então, é preciso correr atrás, pois isso vai influenciar a nossa vida como um todo — comentou ela, que disse, ainda, que a população, de certa forma, já imaginava que a situação poderia acontecer.
— Toda a população acompanhou o desfecho da situação na época em que a gestão anterior estava fazendo essa negociação, que acho nefasta. E a gente já sabia que as consequências seriam drásticas no dia em que essa conta viesse. Acho que a pressão que agora estamos sofrendo já era esperada por toda a sociedade, por todos que já estavam acompanhando o desenrolar da situação política em 2015 e 2016.

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