Guilherme Belido Escreve - No Brasil, o risco Trump
Guilherme Belido 29/04/2017 17:09 - Atualizado em 01/05/2017 12:18
Tem americano que está comemorando os 100 dias de governo Trump não pelas realizações ou avanços, mas por ele não ter (“ainda”) detonado o país.
Atingindo os píncaros da bizarrice, uma parte da população receava que a coisa lá pudesse estar bem pior. Assim, retrocesso político, Coréia do Norte, questão nuclear, contramão ambiental, redução de direitos das mulheres e muita inconsistência ainda estão ‘de bom tamanho’.
Mas... o que isso teria a ver conosco? – perguntaria o leitor. Tentando responder: Donald Trump é a soma de todos os ressentimentos. A alternativa errada, de endurecimento, mas que se contrapôs a um projeto de governo que não alcançou o sucesso prometido e frustrou parte do povo. Enfim, a decepção do “Yes, we can” (Sim, nós podemos) não ter ido além de slogan de campanha e tampouco virado realidade.
O Brasil, por motivos diferentes, pode cair no mesmo buraco: o descontentamento com a classe política acabar estimulando soluções heterodoxas de regressão.
Por isso a Lava Jato – um marco histórico que expôs a corrupção e revelou o lado mais nefasto da propina – precisa concluir seus trabalhos para que o País retome a normalidade. Mas nada disso é fácil.
No país mais sólido do mundo, construído sob rígido conceito de liberdade democrática e respeito aos direitos individuais, um presidente exótico não cumpre as promessas que fez e sistematicamente vem sendo derrotado nas medidas que tenta implantar.
De ‘quebra’, apresenta planos que não vão a lugar algum e dispara mísseis com o mesmo desleixo que pelo twitter dispara bobagens.
Mas essa quase-tragédia estadunidense veio das urnas, como resposta de fatia de ressentidos que foi buscar na extrema direita soluções para os problemas que o equilibrado e Barack Obama não conseguiu resolver.
O modernismo do jovem de Obama, eleito aos 47 anos, foi uma onda que logo virou marolinha. Passou longe das expectativas e não deu em nada. Ou melhor: deu em Trump, eleito aos 70 anos.
Curiosidade 1 – O candidato que poderia ter vencido o republicano e entregue o que Hillary não conseguiu, também não era – não é – um jovem, mas um senhor de 75 anos: Bernie Sanders. Só que ao contrário do reacionário Trump, um progressista.
Curiosidade 2 – Trump, com seus muros, preconceitos e intolerâncias típicas dos anos 50 do século XX, não venceu as eleições com uma campanha tradicional, mas com as ferramentas mais agudas e ‘viralizantes’ do século 21: as redes sociais.
O risco do Brasil buscar atalhos perigoso
Por aqui, o gigante continental da América do Sul precisa estar atento para que a dose ministrada para vencer o câncer da corrupção não acabe por matar o paciente, numa espécie de morte pela cura.
Em três anos, a Força Tarefa da Lava Jato desbaratou um esquema de propina que nem de longe se desconfiava pudesse ser tão absurdamente extenso e tão desumanamente trágico para o povo, – em particular os mais pobres. E esses criminosos, figurões da política e do setor privado, estão indo para a cadeia.
Contudo, o País precisa que a Lava Jato acelere e que a Justiça julgue os denunciados. Precisa, ainda, avançar do ciclo de delações para não aprofundar a crise econômica que não deu causa, mas que involuntariamente oxigena.
Mal se digeriu a delação Odebrechet, e vem aí a do Palocci, que pelo simples ‘anúncio’ trouxe mais incerteza e insegurança ao mercado. E depois? A do Cunha, do Cabral, do Eike... Evidente que sim. Afinal, a investigação vai aonde tiver que ir e tampouco é aceitável que se puna uns enquanto outros, igualmente criminosos, fiquem de fora por estar passando muito tempo.
É uma situação de alta complexidade, mas que precisa apontar uma luz no fim do túnel. Não há como concluir tudo num piscar de olhos – é verdade. Mas, talvez, em etapas; com desfechos parciais; ou fatiada, para que uma parte se veja encerada.
Respostas – O que se quer evitar é o risco do Brasil encontrar seu destino numa estrada que pegou para evitá-lo. As figuras públicas que saquearam o País precisam ser punidas. Mas a descrença da sociedade na classe política, pela qual se sente cada vez menos representada, pode levar a soluções de recrudescimento e consequente opção por regimes radicais, não democráticos; ou via intervenção.
Foi o que fez o povo americano: elegeu um nome de extrema direita em contraponto ao governo que metade da população, de certa forma, rejeitou como seu representante. Por isso, o órfão de representação precisa ter respostas para continuar acreditando num Brasil livre da corrupção e ainda democrático.
Enquanto amanhã... Nada a comemorar
No Dia do Trabalho de amanhã, vai se comemorar o quê? 14 milhões de desempregados? Então, quando se olha lá atrás, para os anos 1950, vê-se Getúlio Vargas, um ditador progressista, anunciando medidas e mais medidas em favor dos trabalhadores e o festejado reajuste do Salário Mínimo.
Hoje, temos um Lula da Silva desmascarado, lutando para não ir parar na cadeia; sua sucessora – sem comentários – um zero à esquerda, para dizer o mínimo; e Temer, que parece enxergar um Brasil diferente da realidade. O discurso é o de que os ‘remédios amargos’ são necessários... Fala em 49 anos de contribuição (que faria com que, em média, o cidadão se aposentasse em torno dos 75 anos), enquanto ele se aposentou aos 55, com mais de R$ 30 mil.
Fala, ainda, em sacrifícios que empobrecem ainda mais os menos favorecidos, mas não mexe com os super-salários.
Matéria da Folha de S. Paulo de 6ª-feira revelou que 97% do MP paulista recebe acima do teto do funcionalismo, estipulado em R$ 33,7 mil, graças aos ‘penduricalhos’ de gratificações, auxílios e indenizações.
Em outros setores públicos, servidores que residem em casa própria recebem auxílio-moradia (???). E marido e mulher que trabalham no mesmo segmento recebem dois benefícios, mesmo morando na mesma casa. Conforme dois auxílios-educação, para os mesmos filhos.
Enfim, os “sacrifícios” continuam alcançando a maioria extremamente pobre, mas passam longe da minoria de ricos.

ÚLTIMAS NOTÍCIAS