Guilherme Belido Escreve - A Era Rivotril
23/04/2017 12:13 - Atualizado em 25/04/2017 14:10
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Kim Jong / Divulgação
Numa esquisitice de dá dó, depois de pronta, mudou-se a introdução desta matéria. De cunho político, tomou-se como partida o governo Trump, que em apenas três meses conseguiu retroceder a agenda nuclear ao século passado, desenterrar a Guerra Fria com a Rússia e ainda dar ouvidos ao mini ditador da Coreia do Norte, pondo-se às portas de conflito armado com um país que não tem energia elétrica, mas tem bomba atômica.
O texto mostraria, ainda, a Venezuela como exemplo nefasto de regime ditatorial, enfoques outros, até chegar à necessidade da Lava Jato concluir suas investigações e livrar de vez o Brasil das amarras da corrupção que o prendem à crise política.
Só que as linhas ganharam vida própria e a matéria acabou por comparar mazelas do século passado com as dos nossos dias. Paciência! A política perdeu a vez e fica para o próximo domingo.
São assustadoras as reflexões de como o século XXI, que deixaria para trás a insanidade de regimes ditatoriais, os horrores de duas guerras mundiais, a discriminação e a desigualdade que tomava como normal que um ser humano pudesse ser superior a outro... e que prometia, ainda, abrir grandes frentes de combate à fome, à miséria, ao preconceito, à injustiça e à intolerância, – pudesse cair em armadilhas próprias de seu tempo.
Num mundo altamente tecnológico, em que as redes sociais são a grande vedete, todos parecem conectados ao isolamento e ao individualismo.
Numa época em que nunca se viu tanta recomendação e restrição a alimentos, a obesidade come solta.
Em tempos, ainda, de verdadeiros manuais de como viver bem e de propaganda maciça das práticas saudáveis, colhemos uma legião de obsessivos-compulsivos.
O problema é o ‘pacote inteiro’, com direito a ‘jogo da baleia azul’
Bem entendido, não que o jovem século XXI não trouxera nada de bom. Muito ao contrário, a explosão de modernidade, de facilidade e a determinação em abolir práticas inaceitáveis representam notável avanço. O problema é que a reboque das coisas boas, veio o pacote inteiro.
Seria [se me permite o leitor a comparação chula] aquele bate-papo informal, numa rodinha do clube da Luluzinha, onde alguém, de brincadeira, lembra a velha piada, a qual por conta de uma......, tem-se que levar o porco inteiro.
Aliás, piada que na prática não raro se mostra verdadeira em desfavor das mulheres. (Só espero não ser mal interpretado... Afinal, hoje, tudo pode ser perigoso: escrever um texto, compor uma música, fazer uma brincadeira, contar uma piada, externar um comentário, etc. Mas, neste caso, só se for apontado como antimachista).
Curiosidade – Sobre toda essa questão, é interessante observar os filmes brasileiros dos anos 70/80, época das pornochanchadas. A despeito de serem péssimos – produção, direção, enredo... tudo horrível – quase todos, hoje, seriam acusados de preconceituosos, de bullying, de racialmente ofensivos, racistas, opressivos, machistas, de apologia ao assédio e mais uma longa lista de mau comportamento que felizmente o novo século vem erradicando ao prestigiar o bom senso e rotular de inadmissível constrangimento que antes era, erradamente, tolerado.
Já o ‘politicamente correto’, é dose
Em recente entrevista, o apresentador Carlos Alberto Nobrega, do alto de seus 81 anos – mais de 60 de profissão – disse que o “politicamente correto” está acabando com o humorismo no Brasil: “A gente não pode nada! Tudo é proibido! Tudo vira processo”.
E não dá para negar o patrulhamento insuportável, que dita regras duríssimas sobre temas de pouca importância, enquanto o que de grave acontece no Brasil potencializa-se em si mesmo sem que nada seja feito.
Resta reconhecer, ironicamente, a ascensão triunfante do tal do politicamente correto, com seu enciclopédico e didático livro de ‘leis’ e normas onde, antes de dar um passo ou dizer uma palavra, consultamos para saber, acuados, o que podemos ou não podemos fazer e falar. Melhor ainda, vamos direto à lista do que é permitido, visto ser bem menor.
Festejemos! Afinal, antes só havia o proibido por lei e o não recomendado pelas normas sociais e costumes. Fora disso, tudo era permitido. Agora, temos o ‘politicamente correto’, que nos poupa esforço e trabalho, levando em conta que não podemos quase nada. Uma verdadeira economia de ação.
Somos todos geração Rivotril
Como dispõe a introdução vista no alto desta página, pretendia-se um texto político. Mas não deu. Desandou para outros cantos e não teve espaço. Fica para a próxima.
Deixa-se claro, contudo, que não se deseja crucificar o adolescente século 21, de apenas 17 anos. Longe disso, o que se espera é que haja humanidade, paz, justiça social, segurança e qualidade de vida.
O dilema é que em se tratando do século XX, o que trouxe de infame, de cruel e de horror, já sabemos. E ponto. Enquanto que no jovem sec. XXI, ainda com longo percurso à frente, o que se viu em menos de duas décadas é de arrepiar os cabelos.
É bem provável que se não houver mudança de hábitos e costumes, podemos ter, no futuro, uma geração transtornada, dividida entre os contidamente alienados e os exasperadamente incendiários. Uma multidão de depressivos, dependentes e afinados num só coro: Rivotril!
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