O amargo gosto da guerra
paulavigneron 18/09/2016 23:10
[caption id="attachment_117" align="aligncenter" width="475"]A fotografia do jornalista estampou a edição 26 da revista Realidade A fotografia do jornalista estampou a edição 26 da revista Realidade[/caption]  

Em 1968, o repórter José Hamilton Ribeiro foi escalado para cobrir a Guerra do Vietnã pela revista Realidade. Nenhum correspondente brasileiro havia ido até o país, e Hamilton aceitou o convite feito pelo veículo de comunicação. Batalhou para conseguir o visto e instalou-se, inicialmente, em Saigon, capital do Vietnã do Sul, poucos dias depois da ofensiva do Tet, que deixou arrasada a cidade.

Hamilton foi enviado para cobrir 40 dias da guerra, mas, convidado pelo fotógrafo Shimamoto a ficar mais um dia, permaneceu para acompanhar uma missão das tropas americanas na Estrada Sem Alegria. A ida trouxe uma grande consequência para o jornalista: a perda da perna esquerda. O acidente o levou a questionar diversos assuntos, incluindo a profissão, durante o tempo em que ficou internado. Em contrapartida, o repórter de guerra é, ainda hoje, considerado um dos maiores profissionais da imprensa brasileira. Suas experiências culminaram no livro O Gosto da Guerra, relançado em 2005 pela editora Objetiva.

Durante sua estada no Vietnã do Sul, Hamilton apresentou detalhes do comportamento dos soldados americanos, analisados por ele nos quarenta dias em que ficou hospedado nos quartéis dos estadunidenses e foi, por eles, escoltado em missões e investidas contra os vietcongues. Cumprindo a regra jornalística que determina a necessidade de escutar os dois lados para a produção de uma reportagem, ele tentou ir ao Vietnã do Norte, mas a viagem foi impossibilitada porque lhe foi negado o visto. Nas memórias do repórter, entretanto, são narradas histórias relacionadas à ocasião e ao rápido encontro do homem com um vietcongue.

As narrativas da guerra oferecem um panorama sobre o conflito que se estendeu de 1955 a 1975 e, também, sobre a cultura e costumes locais. A luta das mulheres ao lado dos vietcongues e da Frente Nacional para a Libertação (FNL), visando combater os inimigos e a opressão a que eram submetidas, e os ritos religiosos como forma de se aproximar das divindades e obter os pedidos desejados (apresentados a partir do excelente exercício de estranhamento, possibilitado pelo distanciamento natural, feito pelo autor) são alguns pontos abordados por Hamilton, entre as recordações de sua passagem pelos hospitais do Vietnã.

Táticas e atos militares dos Estados Unidos, morte indiscriminada de habitantes das regiões durante os confrontos, o papel dos americanos na derrota de seu país, vinculados à comprometida busca pela informação, levam o leitor a uma ampla compreensão acerca da Guerra do Vietnã, sob o ponto de vista de Hamilton, que experimentou, segundo suas próprias palavras, o amargo gosto da guerra.

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