__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ O Casal Perfeito da TV se separa. Depois de ver a notícia divulgada pessoalmente pelos dois, Clarinha olhou para dentro de si mesma e pensou no próprio casamento. Há 20 anos com Marcoantônio, teve altos e baixos na relação, diria até que mais baixadas do que altiplanos. Há muito não faziam amor como antigamente, não viajavam, não riam mais das velhas piadas, não ouviam as mesmas músicas, algo se quebrara devagar dentro do relógio do amor de ambos. Mas em nome dos dois filhos, ela e ele seguraram sem nunca discutirem. Foram virando amigos e logo, irmãos. Se ele a traia, não se preocupara em saber, ela tinha a certeza dela: jamais fizera. Mesmo tendo oportunidades, cantadas, propostas e até sentido atração por um técnico de informática, soube segurar. Namorados do passado, paqueras do presente, Clarinha resistia a tudo e todos, seu zap-zap e facebook viviam cheios de elogios. Aos 40 anos, estava inteira e bela como sempre.

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Agora, ali diante dos seus cílios longos e arrebitados, estava a notícia do fim do casamento perfeito do Casal Perfeito. Se eles que pareciam viver em um mar de maravilhas, um par de celebridades sorridentes em fotos com os trigêmeos se separavam, porque ela teria de viver naquela maresia silenciosa a enferrujar lentamente os desejos e os sonhos que um dia teve com o Marcoantônio? Era o momento de uma decisão. Vestiu sua mais nova roupa, maquiou-se, ligou para o marido com a voz mais sensual que sabia ter. Disse que naquela noite não dormiria em casa. Ele se assustou. Ela sorriu. E convidou-o para jantar no Quem-Quem. Fazia tempos não iam lá. Chegaram, pediram o melhor vinho, o melhor prato. Ela misteriosa, ele cheio de dedos, preocupado, estranhando tudo. Quando a terceira taça do chileno bateu em seus lábios e começou a tonteirinha gostosa provocada pelo sabor das uvas no ponto certo, ela perguntou de supetão: -Soube do fim do casamento do  William Bonner e da Fátima Bernardes? Ele disse que não sabia. Ela continuou: -Pois é, pensei muito sobre isso e sobre o nosso casamento. Você sabe que não estamos bem há um bom tempo. Que a magia se perdeu na luta para comprarmos a nossa casa, seu curso, meu curso, nossos filhos, a empresa... vencemos materialmente e perdemos no amor. Ele se retesou na cadeira. Ela falava baixinho, estava mais linda naquela noite. Amigos chegavam, cumprimentavam e saiam batidos, pois percebia-se um clima diferente. Nem mesmo os chatos existentes em toda a parte da cidade, apareceram para incomodar. Era uma cena de um casal comemorando algo especial. Ele foi ficando inquieto. Uma lágrima sem pudor desceu do olho esquerdo. Era homem valente, mas não para essas coisas, o vinho derrubando o raciocínio, o coração pipocando na panela do peito. Preparou-se para o pior. Outra lágrima desceu. Ela sorriu ao perceber. Parecia fria e vingativa. Seria isso? Teria ela preparado alguma vingança sobre algo desconhecido para ele? Clarinha sorriu, falando bem devagar: -Meu amor, se eles se separaram depois de 26 anos, se eles podem... eu não posso, nós não podemos, pois nós não somos eles. Eu sou eu,  você é você, o único da minha vida. Eu não quero mais continuar nessa rotina, podemos e devemos mudar. Eu quero continuar junto de você e meus filhos. As coisas do mundo não me seduzem, a vida das celebridades não vai influenciar a nossa... eu te amo. Marcoanônio não se conteve, as meninas dos olhos, cada uma delas um dos clubes da cidade: o Ilha Cysne e o Itapuã.  Levantou-se, abraçou-a ali mesmo e sussurrou o quanto a amava. Pagou a conta e saíram para a noite. Para as muitas noites diferentes a serem vividas. E olhando para as estrelas, agradeceu a Deus a mulher sábia, a rara mulher ao seu lado.