Fonte Jornalística Proteção, Ética e Segredo Absoluto
Nino Bellieny 06/07/2016 10:49

A importância da proteção das fontes de informação jornalística

Por Aidan White
Reproduzido do site da Ethical Journalism Network (Rede para um Jornalismo Ético) / Tradução: Jô Amado-Observatório da Impresa
Boas fontes são o sangue da vida do jornalismo. Se não houvessem pessoas dispostas a falar conosco ou responder às nossas perguntas, o jornalismo não iria sobreviver. Os jornalistas podem se orgulhar da eloquência com que contam uma história, mas até os melhores repórteres sabem que eles são apenas tão bons quanto suas fontes. A proteção das fontes é o ponto de referência fundamental para um jornalismo ético; tem uma posição crítica em relação a criar um ambiente para reportagens que exerçam o papel de vigilância. Garante às pessoas que trabalham dentro de organizações políticas ou grandes empresas que elas podem se sentir confiantes de que se denunciarem corrupção não serão arroladas como vítimas. Quando a proteção é frágil, há menos reportagens jornalísticas sobre a praga da hipocrisia e da duplicidade na vida pública. Inevitavelmente, a democracia paga o preço: o governo se torna complacente, as regras da lei se tornam arbitrárias; e a desigualdade na sociedade aumenta. A história do jornalismo, das grandes matérias do passado – como Watergate e Vietnã – às manchetes dos dias de hoje, sobre a Fifa e revelações de espionagem global por governos intrometidos, consiste de grandes reportagens levantadas por vozes corajosas de dentro das estruturas do poder. Como uma fonte pode facilmente ser identificada Embora o jornalismo venha atravessando um período difícil, ainda há, a cada ano, milhares de matérias relatadas por repórteres obstinados que constantemente derrubam políticos corruptos e expõem a sordidez desses negócios, mas ultimamente a proteção das fontes vem sofrendo mais pressões. O mundo pode estar mais conectado do que antes, mas novas ameaças vêm surgindo, como por exemlo: – há um aumento na vigilância e monitoramento das comunicações das pessoas por parte do Estado. Todo mundo, inclusive os jornalistas e suas fontes, é rastreado e seguido – os e-mails e as mensagens pela internet são de fácil acesso tanto ao Estado, quanto às agências corporativas; – na nova era do terrorismo e das redes criminosas globais, os governos implantaram a obrigatoriedade na coleta e retenção de dados  – inclusive bilhões de conversas por telefone e por e-mail – em nome do antiterrorismo, do combate à corrupção e da lavagem de dinheiro; – as ferramentas que usamos – aparelhos móveis, smartphones e computadores – são dispositivos rastreadores que podem identificar com quem estamos a falar assim como localizar onde estamos a qualquer hora. Podem ser facilmente acessados por terceiros com ferramentas sofisticadas que têm a arrepiante capacidade de desvendar nossos arquivos e rastrear o histórico de nossas comunicações; – há menos respeito público pela privacidade, um amplo abuso do direito ao anonimato e as salvaguardas legais são frágeis devido a leis obsoletas que são mais adequadas à era analógica do que à digital. Essas questões são destacadas num recente estudo feito pela Unesco. Por exemplo, este aplicativo criado pelo Guardian mostra como uma fonte jornalística pode facilmente ser identificada na Austrália, país em que o governo aprovou leis de retenção de dados que obrigam as empresas de telecomunicações a reter números de telefone e metadados da internet. Em quanto tempo você encontra a fonte? 56 A maioria das pessoas já abriu mão de sua privacidade As conclusões preliminares do estudo da Unesco – que foi apresentado na conferência da Associação Mundial de Jornais em Washington, a 2 de junho – indicam que a escolha de fontes como alvos desencadeia disfarces e destruição de informação, à medida que novas ameaças legais e as fontes de informação vão desaparecendo. Em última instância, há a ameaça de um aumento de autocensura. Em consequência disso, muitos veículos, que já são vítimas da crise econômica, têm menos disposição a correr riscos em função de matérias que podem levar a batalhas pela proteção de fontes. Alguns repórteres, cada vez mais conscientes dos riscos que enfrentam, vêm adotando a criptografia ou voltando ao papel e lápis como ferramentas essenciais ao seu ofício. A conversa cara a cara está se tornando mais importante que o intercâmbio virtual. Vivemos num mundo em que a maioria das pessoas já abriu mão de parte de sua própria privacidade para receber serviços gratuitos de empresas da internet, como Google, Amazon,Facebook e YouTube. Manipulação da mídia com vazamentos Atualmente, as empresas mais importantes – assim como as agências de segurança do governo – coletam, analisam e exploram gratuitamente um grande número de informações sobre o cotidiano de nossas vidas: se dizem respeito a pessoas em nossos círculos sociais; sobre nossos hábitos de compras; e do que gostamos e não gostamos, seja em termos de moda, de esporte ou de política. Considerando esta franqueza, como é que os jornalistas justificam as promessas de anonimato a pessoas que realmente o necessitam, quando nós próprios vimos sendo vítimas de uma bisbilhotice cada vez maior em casa e no trabalho? Essa questão estava no centro das discussões na conferência anual de repórteres e editores investigativos realizada em Filadélfia, no dia 4 de junho, da qual participaram mais de 1.700 repórteres. As sessões incluíram entrevistas com o veterano jornalista Seymour Hersh, que passou dicas sobre proteção de fontes, e a Ethical Journalism Network – EJN participou de uma palestra sobre a ética ao tratar com fontes. A discussão abrangeu vários desafios da mídia, inclusive como tratar com informantes politicamente ativos e com seus próprios objetivos e com pessoas que querem vender informação e que sabem que veículos com pouco dinheiro estão sempre dispostos a pagar por informações exclusivas. Discutiram como pessoas politicamente experientes podem manipular a mídia com vazamentos cuidadosamente planejados e podem fazer parecer tolos mesmo jornalistas famosos quando seu disfarce é descoberto (Judith Miller, a infeliz repórter do New York Times a quem passaram informações exclusivas sobre armas de destruição em massa no Iraque foi um das vítimas). Um evento global sobre jornalismo investigativo Por outro lado, pessoas podem perder seus empregos se forem expostas por divulgar segredos que revelam a imoralidade ou a negligência das grandes empresas. Outras correm o risco de serem perseguidas, ou de ameaças à sua segurança física, por terem feito denúncias. É o caso de Edward Snowden, que revelou o escândalo do programa de espionagem global dos Estados Unidos. Ele continua foragido e atualmente está exilado em Moscou. Muito frequentemente, as fontes podem ser pessoas vulneráveis, vítimas de traficantes, por exemplo, ou vítimas da pobreza, das guerras e de refugiados sociais. Podem precisar de apoio e de orientação para que, inadvertidamente, não se coloquem em risco através de revelações apressadas ou mal avaliadas. Os bons repórteres, conscientes de seu poder, irão sempre proteger as pessoas contra si próprias. No mundo atual, a proteção de fontes tornou-se uma das mais urgentes batalhas para a sobrevivência do jornalismo de interesse público. É por isso que a Ethical Journalism Network vem trabalhando para desenvolver uma nova campanha global que fortaleça a proteção das fontes em cooperação com alguns dos principais grupos de jornalismo investigativo. Vamos ouvindo jornalistas investigativos por todo o mundo – este mês, em Filadélfia; no mês que vem, estaremos no Brasil, com colegas da Abraji, uma importante rede investigativa; e no final do ano estaremos organizando uma sessão especial num evento global sobre jornalismo investigativo na Noruega. Dar confiança a quem genuinamente precisa de proteção Nossa mensagem é de que, embora os tempos estejam difíceis, as organizações jornalísticas e grupos de jornalistas deveriam agir mais para reforçar a proteção das fontes. Precisamos de um espaço privado mais protegido em redações e precisamos ter certeza que os jornalistas estejam melhor preparados para enfrentar os desafios que são colocados pela comunicação digital, tanto no que se refere a checar as fontes e os dados enviados pela internet, quanto na aplicação de sistemas de criptografia para nossas comunicações internas. Um estudo do Centro de Pesquisas Pew que foi publicado no início deste ano diz que metade das pessoas que responderam à pesquisa não adotou quaisquer ferramentas de segurança digital para proteger seus aparelhos eletrônicos, embora ferramentas como o Tor possam ser facilmente utilizadas. Também há questões importantes sobre como fortalecer o debate sobre políticas públicas em relação às leis de proteção e o direito ao anonimato e privacidade. O grande público, e não apenas os jornalistas, deve ser incentivado a fazer retroceder a vigilância de empresas e do Estado e a manipulação enganosa de informações e dados pessoais. Um passo limitado na direção certa foi tomado nos Estados Unidos com a recente decisão do Congresso de trazer de volta as liberdades civis para a agenda política e diminuir a influência da Agência de Segurança Nacional [NSA, na sigla em inglês] depois das revelações feitas por Edward Snowden sobre sua espionagem global generalizada. Uma questão mais imediata é a que enfrentam legisladores e juízes do mundo todo quando tentam aplicar salvaguardas legais às denúncias – quem, exatamente, é o jornalista, numa época de informação aberta? E quem, portanto, tem o direito à proteção legal na proteção das fontes? O estudo da Unesco a que nos referimos também deixa claro que as “leis do jornalismo” deveriam ser protegidas. E isso é um assunto de que já falei na discussão da Ethical Journalism Network sobre quem é considerado um jornalista nos dias de hoje. Precisamos mais reconhecimento por parte do público da necessidade de um jornalismo responsável, de comunicações éticas e de um jornalismo ético que possam ser uma inspiração para ganhar o argumento sobre o espaço aberto de informação. Mas para que isso aconteça, as pessoas dentro do jornalismo têm que promover a superioridade dos bons veículos jornalísticos para garantir que as pessoas que precisam de proteção a recebam e temos que treinar nossos repórteres e editores para capacitá-los para a arte da negociação com fontes, para dar confiança a quem genuinamente precisa de proteção e manter longe os trapaceiros e vigaristas que tornam disponível, por determinado preço, uma informação. 58
A OPINIÃO DO BNB Jornalista que revela fonte não é jornalista, é rótulo de água mineral.  Por mais pressões que venha a receber, um profissional da comunicação jamais deve revelar quem lhe passou determinada informação. Feito isso uma única vez, perderá toda a credibilidade do público, das outras fontes e dos colegas. Negociar esse tipo de dados é nítida fraqueza moral, uma mancha de caráter. E infelizmente, acontece, pouco mas acontece. Nos grandes veículos de comunicação isso é inadmissível e nem mesmo os superiores hierárquicos podem saber quem é fonte de quem. Seria o fim do verdadeiro jornalismo e a institucionalização da fofoca. Portanto nem mesmo perante juízo deve o jornalista entregar seu manancial. UM CASO AMERICANO ONDE NEM MESMO SOB AMEAÇA DE PRISÃO A FONTE FOI REVELADA Por Euler de França Belém
O jornalista americano James Risen, do “New York Times”, escreveu uma reportagem mostrando que a CIA tentou sabotar o programa nuclear do Irã. Empresários, municiados pela Central de Inteligência dos Estados Unidos, ofereceram plantas nucleares falsas com o objetivo de travar o programa iraniano. A ação fracassou. A notícia era verdadeira e baseada em informações do próprio governo. Agora, James Risen está sob pressão do governo do presidente Barack Obama. O detalhe curioso é que o repórter não conseguiu convencer a então editora do “New York Times”, Jill Abramson, da gravidade da denúncia. Supostamente sob pressão de Condoleezza Rice, na época conselheira de segurança nacional, Abramson abortou a publicação do texto (a editora se arrepende do equívoco, pois admite que é um profissional “sólido como uma rocha”). Em 2006, com o material quente nas mãos, o jornalista publicou-o no livro “State of War”, que se tornou best seller e balançou o governo e a CIA. O Ministério Público tentou um acordo com James Risen, para que revele a fonte de sua informação. Como no caso da Petrobrás, o governo de Barack Obama não quer saber se a informação divulgada pelo repórter era verdadeira ou não. Nada havia de incorreto. O repórter disse, por meio de seu advogado, que, mesmo se for intimado, não vai prestar qualquer depoimento no julgamento de Jeffrey Sterling, oficial da CIA que é acusado pelo governo americano de ter fornecido informações confidenciais, in­clusive para James Risen. Noutras palavras, não revela o nome da fonte, nem sob ameaça de prisão, que poderá ser decretada. O governo alega que está preocupado com a segurança dos Estados Unidos. Fonte deste último texto: Jornal Opção
 

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