Triste realidade
José Paes 25/04/2016 08:50

Infelizmente, o que se viu no último domingo, durante o julgamento da admissibilidade do processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff, na Câmara dos Deputados, foi um espetáculo vergonhoso, um retrato fiel do estado lastimável em que se encontra a política brasileira, ou melhor dizendo, a nossa sociedade como um todo.

Antes mesmo da votação do pedido de impeachment, já havia me manifestado a favor do afastamento da Presidente, por entender estarem satisfeitos os requisitos para tanto. Mas independentemente do posicionamento de cada um sobre o assunto, contra ou a favor, não se pode admitir como normal aquilo que se viu durante a sessão de domingo.

Voto após voto, aqueles que ainda tinham dúvidas acerca da qualificação da nossa representação no Congresso Nacional, puderam constatar o quão baixo os representantes do povo podem chegar. Poucos, naquele momento, tinham a dimensão da importância daquela sessão para o futuro da nossa nação.

Importante lembrar, contudo, que aquelas pessoas não estão lá por conta do acaso. Fomos nós quem os colocamos lá, através do nosso voto. E não adianta dizer que isso é coisa de pobre, de gente pouco esclarecida. Basta recordar quantos votos a elite do Estado do Rio de Janeiro depositou nas urnas em nome de Jair Bolsonaro.

Falando em Bolsonaro, não se pode tolerar o que foi dito por ele durante a manifestação do seu voto. Como dito em nota pelo Conselho Federal da OAB, não é aceitável que figuras públicas, no exercício de um poder delegado pelo povo, se utilizem da imunidade parlamentar para fazer esse tipo de manifestação num claro desrespeito aos direitos humanos e ao Estado Democrático de Direito. Tudo o que foi dito pelos demais deputados parece pequeno diante da inadmissível exaltação de um torturador. Tudo na vida tem limite, até mesmo as sandices de um palhaço em busca de perpetuação no poder. Sequer o direito à vida é absoluto, que dirá a imunidade parlamentar, que não pode servir de guarida para apologia à crimes contra a humanidade.

Muitos vão dizer, mas e a cusparada do Jean Wyllys? Não concordo com absolutamente nada do que ele defende mas, sinceramente, sem meias palavras, por mais indecoroso que seja, aquilo parece até pouco diante do que foi dito por Bolsonaro. Talvez as pessoas não tenham a dimensão do ocorrido, mas é como se um Deputado alemão subisse à tribuna para exaltar Hitler e seus feitos. Algo completamente intolerável.

Enfim, o que se viu é digno de pena. Pode parecer clichê, mas enquanto não houver uma reforma política de verdade nesse país, infelizmente, nada mudará. Digo mais, enquanto não recriarmos nossa própria sociedade, continuaremos a vivenciar noites como aquela. Triste realidade.

Artigo publicado na versão impressa da Folha de 21/04.

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