Carta aberta dos professores do Liceu
Christiano 29/03/2016 18:57

O tradicional Liceu de Humanidades de Campos, do qual fui aluno, com muito orgulho, vem sofrendo, como várias outras escolas estaduais, com a grave crise financeira que assola o Estado do Rio. As precárias condições e a total falta de segurança no Liceu, aliados a antigas carências, levou 85 professores da escola a decidirem pelo estado de greve e a emitirem uma carta aberta à comunidade.

Confira:

“É melhor tentar e falhar, que se preocupar e ver a vida passar.   É melhor tentar, ainda que em vão que se sentar, fazendo nada até o final.   Eu prefiro na chuva caminhar, a em dias frios em casa me esconder.   Prefiro ser feliz embora louco, a em conformidade viver.”         Martin Luther King (adaptado)

Carta aberta dos professores em greve do Liceu de Humanidades de Campos

Todos os dias, devemos nos lembrar de que nossa vida interior e exterior depende dos trabalhos de outros homens, vivos ou mortos; mas que construíram uma história viva de luta e de dignidade, e que devo me esforçar a fim de devolver na mesma medida aquilo que recebi da sua luta. E, caso o homem de hoje tenha negado algo que me é de direito, agora sim, eu devo lutar. Segundo Rui Barbosa “Bom mesmo é ir à luta com determinação,/ abraçar a vida com paixão,/ perder com classe/ e vencer com ousadia,/ porque o mundo pertence a quem se atreve/ e a vida é muito para ser insignificante./Melhor lutar por algo, do que viver para nada.”. De tal modo, não é surpresa afirmar que a história da sociedade, até hoje, é de luta de classes. E nela estamos! Diante do cenário atual, em que se vive a (des)educação, viu-se necessária a greve, aquela tão adiada por nós. Mas que, atualmente, é a única e disponível forma de protesto do trabalhador, a fim de “implorar” às autoridades o atendimento de suas reivindicações; sejam elas com o propósito de reajuste de salário, de benefícios ou qualquer outra cobrança, que se faça necessária, para melhoria nas condições que entendam prejudiciais aos seus interesses e, no caso, também, de nossos educandos. E assim, estamos aqui para mostrar a vocês que a nossa greve é um apelo e até mesmo uma súplica diante da situação que nos impuseram. Podemos, sobretudo, garantir-lhes que nos retiraram o mínimo para desempenhar a nossa Missão de Educadores. É fundamental destacar que a proteção integral da criança e do adolescente é uma obrigação que se impõe a todos. Isso implica garantir um ambiente socialmente saudável, que propicie condições indispensáveis para que meninos e meninas, em fase de formação, possam ampliar seus horizontes, trabalhar suas aptidões e expressar seus interesses, tornando-se cidadãs e cidadãos aptos a participar – de maneira ativa, pacífica e produtiva – dos diversos aspectos da vida social. Todavia não é o que constatamos nas nossas escolas. Fato não só constatado por nós, como também pela Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva da Infância e Juventude que, após receber denúncia da precariedade e da falta de segurança na nossa escola, abriu o inquérito Civil nº32/2016 e, logo em seguida, visitou a unidade escolar— Liceu de Humanidades de Campos—, e confirmou a falta de estrutura física e a ausência de segurança a que estão submetidos nossos alunos. De acordo com a Promotoria, ajuizou-se ação civil de obrigação de fazer contra o Estado do Rio de Janeiro, a fim de sanar as irregularidades, sendo estabelecido um prazo de vinte dias para resolução do problema. Entretanto, até o momento, nossos educandos permanecem no mesmo ambiente de outrora, sem nenhuma segurança. O que constatamos é que nossos alunos estão sendo privados dos direitos acima, pois não encontram, sequer, proteção dentro das escolas onde faltam porteiros, inspetores e ventilação adequada. Sendo assim, há de se entender que acontece um “fingimento” por parte do poder público, pois ao retirar os direitos dos alunos furtam deles, também, o direito a uma educação de qualidade. Senhores, essa é uma das nossas lutas, acabar com a hipocrisia de que existe uma escola de qualidade, porque o que conhecemos é uma escola de quantidade. Estamos lutando por trazer de volta uma educação de aprendizado. Ainda se faz pertinente destacar, diante de algumas situações delicadas que têm acontecido, que, segundo a lei federal n. 9394/96 em seu artigo 24, inciso VI: ” — o controle de frequência fica a cargo da escola, conforme o disposto no seu regimento e nas normas do respectivo sistema de ensino, exigida a frequência mínima de setenta e cinco por cento do total de horas letivas para aprovação”. Significa dizer que o controle de frequência não é sobre cada disciplina e sim sobre o total de horas letivas determinadas na Matriz Curricular de cada escola. Portanto, se haverá reposição das aulas, pelos professores grevistas, e sendo esses mais de 70% do total de educadores, achamos improvável haver repetência por faltas. Já que, em algumas turmas, todos os professores estão em greve. Observamos que a Secretária de Educação do Estado do Rio de Janeiro estabelece a carga horária mínima de 800 (oitocentas) horas anuais, distribuídas por um mínimo de 200 (duzentos) dias de efetivo trabalho escolar (Lei 9394/96, art. 24). Reiterando, o aluno deve ter no mínimo 75% de frequência no total anual de horas letivas.  Entretanto, o que acontece é que muitas escolas “confundem” e acabam usando uma regra antiga que é computar falta por disciplina e não se trata disso, conforme a lei federal n. 9394/96. Nós, professores, estamos lutando, também, para derrubar esse “faz-de-conta” em que se transformou a educação do Rio de Janeiro, em um faz-de-conta que te ensino, você faz-de-conta que aprende e o governo faz-de-conta que nos paga… Estamos na luta, pois temos certeza de que professores, pais, alunos e sociedade não irão aceitar mais essa MENTIRA, essa FARSA! Aos colegas que, por algum motivo, não puderam aderir ao movimento, pedimos prudência e sabedoria, pois a nossa luta, também, é por vocês. Estamos em um mesmo ambiente de trabalho, fadado pelo descaso. Somos nós, todos, sem exceção, vítimas da violência que está nos roubando a dignidade. Você, professor(a), que fez, no mínimo, uma Graduação sabe que não é  justo receber um pouquinho mais de um salário mínimo. Tem plena certeza de que não é digno(a) desse valor, pela responsabilidade, pelo compromisso e pelo comprometimento que tens em sala de aula. Não podemos nos sentir envergonhados de falar que somos professores, o governo é que deve sentir vergonha de nos pagar uns “trocadinhos” a mais do que um salário mínimo. Nem um salário e meio, muito longe disso! O jornalista Alexandre Garcia, outro dia, tão bem declarou que: O prefeito, os vereadores, que oferecem pouco ao professor, talvez não tenham tido professores dedicados.(...)O vereador pode até fazer leis, mas não faz um país com saber, com conhecimento, com futuro. Isso é o professor que faz. O professor é o construtor do país, do futuro, precisa de salário que lhe dê tranquilidade para viver e lecionar preparado, para que possa se vestir dignamente, à altura da nobreza da profissão. Aliás, qual seria a mais nobre das profissões? A do advogado, que não deixa o inocente ser condenado? A do engenheiro, que não deixa o viaduto cair? A do médico, que não deixa o paciente morrer? Ou a do professor, que não deixa definhar o futuro? (...) Professor é missão.” Encorajados pelas palavras do jornalista e pela atual situação de abandono, que nos faz perder a dignidade, terminamos o nosso texto pedindo compreensão e apoio na luta, pois ela é de todos os envolvidos: docente, discente, pais, responsáveis e administrativo. Assim, amigos, fechamos com uma reflexão a você: “tem gente que pensa que faz alguma falta, mas tem gente que nem imagina a falta que faz...”.

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    Christiano Abreu Barbosa

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