Árvore genealógica
Mariana Luiza 22/01/2017 01:21 - Atualizado em 19/05/2020 16:03
Sempre tive inveja daqueles que têm árvore genealógica. Dos que encontram o sobrenome da família no museu da imigração ou são capazes de contar com detalhes a viagem imigratória do bisavô no final do século XIX. Por motivos óbvios, por muito tempo, me foi negada a possibilidade de investigação da minha origem. Hoje, com testes de DNA, não sei a qual custo, é possível saber de qual país na África origina parte do meu material genético. É um avanço. Não posso negar. Mas ainda assim, nunca vou poder dizer que o avô do meu bisavô veio num navio negreiro originário de onde hoje conhecemos como Angola, e foi escravizado numa fazenda extrativista de ouro nas proximidades de Vila Rica. Eu não sei absolutamente nada sobre a pessoa que veio trazida para o desconhecido contra sua própria vontade. Mesmo sabendo de onde, nunca será me garantido o direito de investigar quem eram estas pessoas. Elas eram mercadorias. E mercadorias não têm árvore genealógica. Não vieram porque fugiam da guerra ou da fome. Não vieram porque queriam se aventurar pelo novo mundo em busca de uma vida mais farta. Foram trazidos sem registro e tiveram seus nomes e origens adulterados o que impossibilita uma investigação mais precisa. Soube que meu bisavô por parte de mãe era português, que além dele haviam indígenas e obviamente os negros, determinantes do fenótipo da maioria de nossa família. A origem indígena não é tratada com importância por nenhum membro da família. Não se sabe a etinia, desconhece-se o gênero e a posição desta pessoa na árvore genealógica. Talvez minha paixão por milho e mandioca seja um outro indicador latente no meu DNA. Talvez seja apenas mais uma das minhas loucas ideias de me inventar uma origem. Do lado do meu pai, a história tinha tudo para ser um pouco mais fácil. Nomes judaicos de origem portuguesa facilitariam o início da pesquisa. No auge da minha investigação, descobri que meu avô paterno, por razões desconhecidas, mudou o sobrenome da família para Macedo. Alguns de meus tios afirmam ter ouvido algo do tipo Damaceno. Mas não há documentos que comprovem o palpite. Minha única alegria nisso tudo, foi concluir que não poderia ser parente direta do bispo Macedo um medo que sempre carreguei. Foi então, que eu desisti de investigar. Semanas atrás, durante uma viagem, descobri Antonio Maceo. Um dos heróis da história da independência cubana. Comandante do exército, Maceo é citado em alguns livros de história com um homem determinado e corajoso. Conhecido pelo apelido de Titan de Bronze, devido ao tom marrom de sua pele, Maceo reunia numa só pessoa as poucas características que consegui confirmar sobre a minha árvore genealógica. Além da cor da pele, sua mãe se chamava Mariana e o sobrenome Maceo era por apenas um D, diferente do meu. Resolvi então me considerar descendente deste homem arretado que libertou pessoas escravizadas das lavouras da cana-de-açúcar e lutou até sua morte pela independência da colônia espanhola. Reconheço que um homem que tem o sobrenome parecido com o da família do meu pai, e as ascendências africanas da família da minha mãe não teria lugar definido na minha árvore genealógica. Reconheço também que o parentesco com Maceo seria impossível por questões históricas e geográficas. E mais, acredito que a ele também foi negado o direito de saber sobre seus ancestrais africanos e mais uma vez um ramo de nossa árvore estaria incompleto. Mas isso pouco importa. O que me interessa agora é pouquinho de ilusão e conforto nesse coração descrente e aflito. Obrigada, Maceo.

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