Ainda a requisição da Santa Casa
José Paes 06/11/2015 09:09

Diante da sua relevância, mais uma vez abordarei a questão envolvendo o Poder público municipal e a Santa Casa de Misericórdia. Dessa vez, sob um olhar um pouco mais jurídico, notadamente no que diz respeito à requisição administrativa do hospital pelo Município.

Não é meu objetivo, em respeito a ética profissional pregada e exigida pelo Código de ética da OAB, discutir o mérito da requisição administrativa em si, se juridicamente possível ou não. Isso é tarefa dos profissionais que representam os interesses do Município e da Santa Casa, bem como do Ministério Público. Do mesmo modo, não pretendo adentrar na conveniência política da medida, algo que já fiz a exaustão nas duas últimas semanas.

O que se pretende esclarecer é quais são os efeitos práticos da requisição, a partir da sua confirmação pelo Tribunal de Justiça. O que acontecerá a partir de então? O que isso muda no funcionamento do Hospital?

Requisição é o instrumento de intervenção estatal mediante o qual, em situação de perigo público iminente, o Estado utiliza bens móveis, imóveis ou serviços particulares com indenização ulterior, se houver dano. De modo bastante singelo, até mesmo para que os leitores que não têm ligação com o mundo jurídico possam compreender, a requisição seria uma espécie de “desapropriação provisória”. Ou seja, durante a vigência da requisição, passa o ente público a ter a posse dos bens móveis e/ou imóveis, bem como a gerir os serviços requisitados.

No caso da Santa Casa, portanto, a partir do momento em que requisita os seus bens e serviços, o Município passa a geri-los, retirando, ainda que provisoriamente, o poder de gestão do hospital da junta interventora. Teria o Município, portanto, que comprar materiais, remédios, assumir a gestão dos recursos humanos, enfim, praticar os atos de gestão dos bens e serviços requisitados.

Talvez por ter tomado conhecimento desses aspectos, é que o Executivo não tenha feito a festa esperada quando conseguiu restabelecer os efeitos do decreto de requisição. Talvez por isso não tenha tomado novamente o salão nobre do hospital para dizer que a bagunça tinha acabado. Talvez por ter tomado conhecimento que, nos dois dias em que a requisição vigorou, antes da sua suspensão inicial pela 1ª vara cível de Campos, fornecedores tenham se recusado a entregar produtos de todas as espécies ao Hospital e que médicos ameaçaram cruzar os braços, tenha dado um passo atrás, mesmo amparado por decisão do Tribunal de Justiça.

Como se vê, uma requisição administrativa é muito mais que uma peça de teatro. Há obrigações e deveres a serem assumidos que, acredito, o Poder Público municipal não tenha condições, muito menos a intenção de assumir. Por isso, repito, não será na marra que os problemas criados pelo próprio Poder público serão resolvidos. É preciso diálogo, humildade e competência.

Artigo na versão impressa da Folha de ontem (05/11).

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