Pouco, muito e muitíssimo
Marcos Almeida 27/10/2015 05:42

tumblr_nv2p7nmdLk1s5qw8jo1_540Artigo atual e interessante sobre níveis de atividade física preconizados e o equilíbrio necessário para não passar do ponto. Reflexão interessante sobre realidades distintas de cada um onde na sua essência faz a interessante colocação: muito é melhor que pouco; pouco é melhor que nenhum; e o muitíssimo? Boa leitura e bons treinos!

Excetuando a interrupção do tabagismo, possivelmente nenhuma outra conduta supera a atividade física na prevenção primária e secundária de diversas doenças, particularmente as cardiovasculares.

Estudos prévios indicam que programas de reabilitação cardíaca, com foco central nos exercícios físicos, seriam capazes de reduzir a mortalidade total em 27% e a mortalidade cardiovascular em 31%.1 Recente revisão sistemática, também da Cochrane, envolvendo 148 estudos controlados com 97.487 pacientes, ratificou que programas de reabilitação cardíaca reduzem a admissão hospitalar, melhoram a qualidade de vida e reduzem a mortalidade, identificando-os como seguros e efetivos.2 Portanto, os estudos que expressam o valor da atividade física tornam-na indiscutivelmente essencial no tratamento preventivo primário e secundário da maioria das cardiopatias. Situar-se abaixo ou acima da condição aeróbica máxima prevista para a idade e sexo implica, respectivamente, em maior ou menor mortalidade por qualquer causa. Portanto, elevar o consumo máximo de oxigênio, entre vários outros aspectos favoráveis que também são possibilitados pelo exercício físico regular, deve ser um dos objetivos a ser alcançado.3

A atividade física durante o lazer ou na prática de esportes contribui decisivamente para o aumento da condição aeróbica máxima. Entretanto, estudos recentes têm associado o exercício exaustivo, muito intenso e muito frequente, não com um acréscimo na expectativa de vida, mas com uma ausência adicional de benefício em relação àquele de intensidade leve e moderada ou levemente intenso, ou seja, exercícios extremos ou realizados em número de horas excessivas não acrescentariam redução da mortalidade em relação aos menos intensos, podendo, inclusive, predispor a elevação do risco cardiovascular.5-12

O mínimo de atividade física preconizada é de 150 minutos semanais, ou seja, 30 minutos, cinco dias por semana, em intensidade moderada. Estudos apontam que este mínimo recomendado é capaz de reduzir em 14% o surgimento da doença coronariana e em 20%, no caso de 300 minutos por semana.13

Por outro lado, acima de dez vezes este mínimo recomendado, os benefícios parecem reduzir, evidenciando que a relação da resposta benéfica ocorre até uma determinada dose, não ocorrendo uma adequada relação dose-resposta nas frequências mais elevadas de exercício (Figura 1).4

Curva com característica morfológica com alguma semelhança nos foi apresentada em outra publicação recente. Intensidades leve e moderada de exercício, avaliadas em relação ao tempo, a distância percorrida, a frequência semanal, a intensidade e a velocidade da caminhada ou corrida, reduziram, na prevenção primária, a mortalidade total e cardiovascular, porém os benefícios se reduziram com o exercício exaustivo (Figura 2).5

Avaliando o número de horas de atividades intensas semanais realizadas nos momentos de lazer de pacientes com doença coronariana estável ficou evidente que o grande benefício obtido em um menor número de horas de exercício se reduz quando um bem maior número de horas é realizado (Figuras 3 e 4).8

Outro estudo recente mostrou, uma vez mais, a maior mortalidade em cardiopatas que realizam caminhadas ou corridas de maior intensidade em contraste com a evidente redução da mortalidade nas atividades de intensidades leve e moderada (Figura 5).9

O The Copenhagen City Heart Study, cujos resultados foram recentemente publicados, uma vez mais apontou para uma queda da redução da mortalidade da corrida extenuante em relação àquelas de intensidade leve e moderada, Os autores não encontraram diferença na mortalidade entre os corredores de alta intensidade em relação aos sedentários, inversamente àquelas de leve e moderada (Figura 6).7

Necessita-se de novas pesquisas que ratifiquem esses resultados e, principalmente, os mecanismos fisiopatológicos que os justifiquem. O aumento do átrio esquerdo do atleta, inserido no conceito do denominado “coração do atleta”, de algum modo parece contribuir para o desenvolvimento de condições adversas, como a fibrilação atrial.10 Entretanto, as câmaras cardíacas direitas, notadamente o ventrículo direito (CAVD), parecem ser o local que se considera como o mais intensamente comprometido pelo exercício exaustivo frequente. Embora de origem basicamente genética, a cardiomiopatia arritmogênica do VD, ou condição semelhante, de algum modo parece se desenvolver nestas condições.14,15 A figura 7, objetivamente, expressa os mecanismos fisiopatológicos que parecem iniciar as condições que determinam a redução dos benefícios do exercício quando realizado com muita frequência, muito longa duração e intensidade próxima a exaustão. Embora estejamos em um momento de necessidade do preenchimento da lacuna do conhecimento em relação ao tema central deste artigo, vários estudos recentes apontam limites de intensidades acima das quais não se recomendariam ser ultrapassadas (Quadro 1).7

Os possíveis riscos que podem ocorrer com os exercícios muito intensos, assim como eventuais discussões que possam advir sobre o tema, não devem trazer algum aspecto que possa interferir no conceito dos inúmeros e indiscutíveis aspectos benéficos – e a redução da mortalidade é somente um deles – que o exercício físico proporciona à imensa maioria dos saudáveis e dos cardiopatas. O estímulo ao exercício e a inclusão de pacientes em programas de reabilitação cardíaca deve ser intensamente incrementado, pois sabemos que ainda poucos pacientes dela participam e o índice de absenteísmo às sessões é internacionalmente elevado, principalmente nos idosos.16

Mesmo paciente obeso com riscos maiores, como portador de cardiopatia arritmogênica do ventrículo direito, com bloqueio atrioventricular total, relato de morte súbita abortada, em uso de cardiodesfibrilador e marcapasso, pode ter redução do peso corporal e expressiva melhora da sua condição aeróbica e da tolerância ao exercício incremental obtidas em programas de reabilitação cardiovascular realizado em ambiente hospitalar na intensidade compatível com a sensação REFERêNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
  1. Jolliffe JA. Rees K, Taylor RS. Exercise-based rehabilitation for coronary heart disease. C ochrane Database Syst Rev. 2001. In: Circulation 2003;107:3109-3116.
  2. Anderson LJ, Taylor RS. Cardiac rehabilitation for people with heart disease: na overview of Cochrane systematic reviews. Int J Cardiol 2014;177(2):348-361.
  3. Gulati M, Black HR, Shaw LJ, Amsdorf MF, Merz CN, Lauer MS et al. The prognostic value of nomogram for exercise capacity in women. N Engl J Med 2005;353(5):468-475.
  4. Aren Hannah, Moore S, Patel A, Hartge P, Gonzalez AB et al. Leisure time physical activity and mortality. JAMA Intern Med. Published online April 6, 2015.
  5. Lavie CJ, Arena R, Swift DL, Johannsen M, Sui X, Lee D et al. Exercise and cardiovascular system. Circ Res 2015;117:207-219.
  6. O’Keefe JH, Patil MD, Lavie CJ, Magalski A, Vogel A, McCullough PA et al. Potential Adverse Cardiovascular Effects From ExcessiveEndurance Exercise. Mayo Clin Proc. 2012;87(6):587-595.
  7. Schnohr P, O ?Keefe JH, Marott JL, Lange P, Jensen GB. Dose of jogging and long-term mortality. The Copenhagen City HeartStudy. J Am Coll Cardiol 2015;65(5);411-419.
8. Mons U, Hahmann H, Brenner H. A reverse I-shaped association of leisures time physicl activy with prognosis in patients with stable coronary heart disease> evidence from a large cohort with repeated measurements. Heart 2014;100(13):1043-1049. 9. Williams PT, Thompson PD. Increase cardiovascular disease mortality associated with excessive exercise in heart attack survivors. Mayo Clin Proc 2014;89(9):1187-1194. 10. Lavie CJ, Keefe JH, Sallis RE. Exercise and the heart: the harm of too litle and too much. Curr Sports Med Rep. 2015;14(2):104-109. 11.La Gerche A, Burns AT, Mooney D. Exercise-induced right ventricular dysfunction and structural remodeling in endurance athets. Eur Heart J 2012;33:998-1006. 12.Iskander A, Mujtaba MT, Thompson P. Left atrium size elte athetes. J Am Coll Cardiol Img 2015;8(7):753-762. 13. Sattelmair J, Perman J, Ding EL, Kohl III HW, Haskell W, Lee I-Min. Dose response between physical activity and risk of coronary heart disease. A meta-analysis. Circulation. 2011;124:789-795. 14.La Gerche A, Claessen G, Dymarkowski S, Voigt JU, Buck F, Vanhees L. Exercise-induced right ventricular dysfunction is associated with ventricular arrhytmias in endurance athetes. Eur Heart J: on line published June, 2, 2015.

15. Heidbuchel H, La Gerche A. The right heart in athletes. Evidence for exercise-induced arrhytmogenic right ventricular cardiomiopaty. Herzschrittmacherther Elektrophysiol 2012;23(2):82-86.

16. Doll JA, Hellkamp A, Ho PM, Kontos MC, Whooley MA, Peterson ED, Wang TY. Participation in cardiac rehabilitation programs among older patients after acute myocardial infarction. JAMA Inter Med. Online August 03, 2015.

17. Mendes FRS, Cunha TB, Tomelin MLS, Serra SM. Evidências de melhoras funcionais em paciente com cardiomiopatia arritmogênica do ventrículo direito, bloqueio atrioventricular total e morte súbita abortada submetida a programa de reabilitação. 2015, tema livre apresentado no 70o Congresso da Sociedade Brasileira de Cardiologia.

Fonte: Revista do Derc

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    Marcos Almeida

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    Marcos Almeida é assessor esportivo, especialista em Ciência da Musculação e mestre em Ciência da Motricidade Humana.

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