Onde não deveria morar ninguém
09/08/2015 13:08

Júlio César Barreto
Foto: Michelle Richa

Um baú de caminhão sem nenhuma ventilação, com uma cesta que assume a função de guarda-roupas, mantimentos amontoados pelo chão e um fogão velho. Assim é a “casa” de uma família da localidade de Santa Rita, que fica às margens da RJ 224, em São Francisco de Itabapoana. Na residência improvisada — que foi doada, como a maioria das coisas dentro dela — moram há seis meses Lenice Barreto Gonçalves, 23 anos, Charles Soares Almeida, 30 anos, e os dois filhos do casal, uma menina de quatros anos e um menino de três.

Quando a equipe de reportagem chegou ao local, Lenice tomava banho, de roupa e com uma bacia. Ela contou que conheceu seu esposo com 13 anos, casou aos 15 e não separou mais de Charles. Durante alguns meses o casal morou em uma casa alugada na praia de Santa Clara, até não terem mais condições de pagar. Depois, eles foram morar com ciganos, em acampamentos na praia de Guaxindiba. Com o tempo vieram os desentendimentos com as pessoas do acampamento. Então, a família não tinha mais onde morar, ficando por várias semanas sem abrigo no Centro de São Francisco.

Charles relatou que, enquanto eles viviam na rua, a mãe de Lenice, que possui terrenos em Santa Rita, doou uma parte para a família construir uma casa. Mesmo sem condições financeiras para iniciar a construção, eles foram para o terreno e com a ajuda de um vizinho conseguiram uma lona, que serviu de moradia para a família, por alguns dias.

A moradia improvisada teve fim devido a um acidente, que, por sorte, não deixou nenhum ferido. O casal fez uma fogueira dentro da barraca, na tentativa de diminuir a grande quantidade de mosquitos, mas a lona pegou fogo. Mais uma vez a família ficou sem “moradia”, até a doação do baú de caminhão. “Chegamos aqui sem nada e ainda continuamos”, disse Charles.

Apesar da situação de pobreza, Lenice conserva um constante sorriso nos lábios. “Deus me faz sorrir, independente de qual for a situação”, relatou. A família sobrevive com a ajuda do povo e os benefícios sociais oferecidos pelo governo, mas não é o suficiente.

— A nossa família, mesmo recebendo uma quantia do Bolsa Família, precisa de ajuda. Ofereceram um emprego ao meu marido de entregador de água e espero que seja uma oportunidade boa. Agora com as duas crianças na creche também poderei trabalhar e espero construir nossa casa — disse Lenice.

O calor do baú sem ventilação usada como moradia e o medo da violência não deixam Lenice dormir direito. As dificuldades, no entanto, não tiram a vaidade da jovem mulher, que sente falta de ir ao salão de beleza e comprar roupas para a família. “Mas se eu comprar, vamos ficar sem comer”, conluiu.

Caso sensibilizou população sanfranciscana

O casal conta com a ajuda da população. Uma das declarações mais recorrentes é que “os mais pobres, aqueles que não têm muitas condições, são os que mais ajudam”.

— Quando um empresário do Centro da cidade ficou sabendo da situação que estamos passando e que queremos construir uma casa, ele nos ajudou com 1.500 tijolos. Na segunda-feira, um homem passou por aqui e nos ajudou com R$ 200. Nesta quarta-feira, uma senhora nos ajudou com biscoitos — disse Lenice, acrescentando que também recebeu algumas cestas básicas.

Agentes da Secretaria Municipal do Trabalho da Assistência e Promoção Social (SMTAPS) já estiveram no local, mas, segundo Lenice, nenhuma ação concreta teria sido feita. A Prefeitura de SFI, no entanto, informou que “a família foi atendida com benefícios eventuais como: Cesta Básica e Cobertores, encaminhamento para creche, além de orientações acerca da marcação da consulta médica e agendamento de veículos para tal procedimento. A partir do atendimento emergencial, a SMTAPS deu início aos trâmites administrativos para viabilizar a inclusão da família no Programa Municipal de Renda Mínima, que já foi disponibilizado, e a família contará com um salário mensal do referido programa, mais R$ 200,00 do Programa Bolsa Família para buscar sua autonomia, com ênfase a solucionar sua situação habitacional”.

Outra reclamação da família diz respeito à falta de especialidades médicas, como endocrinologista, já que a filha precisa desse tipo de atendimento. A Prefeitura, no entanto, informou que “o município mantém um setor ambulatorial com diversas especialidades médicas funcionando normalmente, inclusive com endocrinologista”.
 

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