OAB é contra a redução da maioridade penal
José Paes 06/04/2015 11:14

A OAB Nacional, reafirmando o entendimento histórico do seu Conselho Pleno, de março de 2007, manifesta sua contrariedade à decisão da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, que aprovou nesta terça-feira (31) a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos.

A criminalidade envolvendo crianças e adolescentes requer atenção especial das autoridades e de toda a sociedade, mas não se deve deixar que a comoção leve a caminhos que não irão resolver o problema, mas apenas agravá-lo. A Constituição fixa a maioridade penal em 18 anos. Para a Ordem, esta é uma cláusula pétrea, que não pode ser modificada. Além disso, há dados que mostram que essa medida seria inócua.

Segundo dados divulgados recentemente pela imprensa, somente em São Paulo o número de crianças e adolescentes internados por crimes e contravenções cresceu 67% nos últimos dez anos, registrando 40 casos por dia que chegam às Varas da Infância e Juventude.

Ao mesmo tempo, um levantamento do Conselho Nacional de Justiça aponta que 47% dos internos em centros de reabilitação têm entre 16 a 17 anos e 42%, de 14 a 15 anos. Os crimes que eles cometem são praticamente do mesmo tipo. Portanto, apenas baixar a idade penal para 16 anos não resolverá completamente o problema.

O entendimento da OAB é de que o Estado brasileiro deve primeiro cumprir suas funções sociais antes de remeter a culpa pela falta de segurança ao sistema de maioridade penal.

O simples aumento do número de encarcerados, e a consequente ampliação da lotação dos presídios, em nada irá diminuir a violência. A OAB não descarta ingressar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, caso a proposta prospere no Congresso Nacional.

O que precisa ser feito por todos, Legislativo, Executivo e Judiciário, e por toda a sociedade civil organizada, é buscar meios de melhorar as condições de vida dos adolescentes, principalmente os mais pobres. Se eles não têm escola, não têm educação profissionalizante, não têm esporte, não são acolhidos pelo Estado, podem ser atraídos para o tráfico, além do estabelecimento de um sistema de internação que efetivamente ressocialize.

É fato que toda a sociedade brasileira quer um país mais justo e com menos criminalidade, mas a redução pura e simples da maioridade penal não vai trazer os benefícios esperados pela sociedade. Sem receberem o tratamento adequado, esses seres humanos acabam virando peças vulneráveis para o cometimento de infrações e sentem-se acolhidos nas instituições criminosas.

Fonte: OAB Nacional

Na última semana, em artigo publicado na versão impressa da Folha, expus meu entendimento sobre a questão, que também publico neste espaço. Inobstante a divergência, em parte, do entendimento da OAB Nacional, convergimos no sentido de que não será a redução da maioridade penal que resolverá a grave crise de violência que vivemos.

"Reflexões sobre a maioridade penal

A questão da maioridade penal voltou ao centro dos debates nacionais nessa semana, após a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos deputados ter dado parecer favorável a tramitação naquela Casa de projeto de lei que propõe a redução da maioridade penal dos atuais 18 (dezoito) para 16 (dezesseis) anos.

Confesso que sou favorável à redução, mas não da forma ampla e irrestrita que o referido projeto de lei propõe. Na minha visão, apenas em casos específicos, em especial os crimes hediondos, é que se apresentaria justa e viável a redução da maioridade para 16 (dezesseis) anos, desde que garantido aos adolescentes tratamento adequado e diferenciado dentro do sistema carcerário. A generalização e introdução desses jovens no sistema carcerário comum me parece perigosa e, certamente, trariam consequências negativas, não só para o nosso sistema penal mas, sobretudo, para a sociedade.

Longe de mim fundamentar meu posicionamento ao argumento de que a redução em casos específicos seria um instrumento eficaz de combate à criminalidade. Como bem disse o Ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, em recente entrevista, cadeia não conserta ninguém e não é justo dar a sociedade a falsa esperança de que a redução da maioridade penal, por si só, ajudará a reverter o grave problema de criminalidade que enfrentamos.

Por outro lado, não me parece razoável perpetuar na sociedade o sentimento de impunidade, diante de situações excepcionais – mas que a cada dia acontecem mais – em que jovens praticam barbaridades e acabam não sendo responsabilizados da forma como deveriam. Esse sentimento de impunidade, assim como a generalização da redução da maioridade, também vem causando inúmeras consequências negativas para a nossa sociedade e precisa ser combatido.

O importante, nesse caso, é ter em mente que a questão da criminalidade não deve ser tratada como um simples problema de responsabilização penal. Vivemos, talvez desde o início da nossa existência enquanto nação, uma tragédia social, fruto da brutal desigualdade que nos permeia. É sobre isso que devemos nos debruçar prioritariamente. Não será a cadeia ou a idade dos que lá estiverem que irá resolver o nosso conflito social. Precisamos tratar das causas e não apenas dos reflexos da falência social do nosso país.

A discussão acerca da redução ou não da maioridade penal deve ser feita, mas não podemos nos descuidar dos verdadeiros temas que poderão nos tirar desse atoleiro social que vivemos, como valorização da educação pública, combate à desigualdade, combate à corrupção, dentre inúmeras outras questões. É preciso, portanto, combatermos determinadas mazelas, mas sem perdermos o foco, o ponto nodal da questão".

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