Fantasias
Mariana Luiza 22/01/2017 01:20 - Atualizado em 19/05/2020 10:48
Acreditei em Papai Noel até meus 11 anos. Fui a última da minha turma de colégio. E todo ano era sempre a mesma história: quando algum motivo logístico ou falta de mão de obra natalícia impedia a chegada do bom velhinho, meu pai nos mandava pro chuveiro. “Papai Noel nunca visita crianças sujas” –dizia ele. Enquanto eu e meu irmão tomávamos um banho caprichado, as renas pousavam próximo à janela do apartamento e o bom velhinho, sempre apressado, jogava os presentes ao pé da árvore de natal, que na maioria dos anos era feita de galho seco catado na Floresta da Tijuca, adornado com chumaços de algodão e bolinhas de vidro vermelhas e douradas.
Por muito anos acreditei naquele truque do banho, pressa e presentes ao pé da árvore. Até uma noite em que me questionei. Como o bom velhinho fez para passar a bicicleta pelas janelas gradeadas?
Eu tinha muitas dúvidas a respeito da existência daquele senhor que parecia um deus dezembrino onipresente em todos os shoppings e galerias. Tinha dúvidas sobre sua terra natal, sobre andar de renas num país tão quente como Brasil. Nutria desconfianças se ele podia mesmo fazê-las voar, no espaço e no tempo. Mas pior do que minhas próprias dúvidas, era ter que conviver com as certezas das minhas amigas. Todas, sem exceção, insistiam em me convencer que Papai Noel era só um truque dos pais para forçarem as crianças a se comportarem bem durante o ano.
Papai Noel não existe. O Papai Noel é o seu pai!”
Teve um ano que finalmente o Papai Noel bateu em minha porta quando eu e meu irmão já estávamos de banho tomado para recebê-lo. A visita durou quase uma hora. Eu tinha muitas perguntas e a necessidade de convencer meus amigos se tornara maior do que a curiosidade em ganhar os presentes do saco vermelho.
Porquê vocês só ficam em shoppings? Não seria melhor uma pracinha?
Como você consegue estar em vários lugares ao mesmo tempo?
Se você tem esse poder, será que não pode esperar um pouco a gente terminar de tomar banho?
Aqui é quente demais para as renas... Não seria melhor o senhor vir de avião?
Pra que essa roupa quente no verão de 40 graus? Isso desidrata.
Depois de algumas respostas nada convincentes, o bom velhinho posou para a foto ao lado do meu pai. Eu esperei ansiosa pelo fim de Janeiro e metade de Fevereiro para começar o ano letivo e finalmente mostrar as minhas amigas a fotografia dos papais lado a lado.  
Sim, ele existe. E não é meu pai!
Mas se não é seu pai é outra pessoa... Seu tio, seu vizinho, seu porteiro.
Naquele dia, eu percebi que há pessoas que gostam da fantasia e há aqueles que se conformam com a realidade. Eu, definitivamente, não fazia parte do segundo grupo. A minha verdade era acreditar em histórias da carochinha. E eu não precisava das asserções alheias.
Com 12 anos, quando já não dava mais para defender sua existência, eu resolvi trocar de fantasias. Talvez seja este o motivo de eu gostar tanto de carnaval. Uma festa mais verossímil e adequada para crenças juvenis e adultas. No carnaval eu acredito em Heroínas, Coelhos da Páscoa e Sereias. E o melhor, nenhum adulto descrente tenta me convencer do contrário.

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