Prova de Amor
Mariana Luiza 22/01/2017 01:20 - Atualizado em 19/05/2020 10:42
- Eu estive em Porto Alegre há trinta anos. Ainda havia bonde!
- Mas bah!
- Meu pai era torcedor fanático do Flamengo. Onde o time jogava, lá estava ele comigo a tiracolo. Eu viajei o Brasil inteiro acompanhando, meu pai, Marco Aurélio, Murilo, Onça, Liminha, Paulo Henrique, Clóvis, Dionísio, César, Luís Carlos e tantos outros que passaram pelo Flamengo no final dos anos 60, início da década de 70. Fui ao Beira-Rio poucos meses depois da inauguração do estádio. O Flamengo ganhou de 2 x 1 do Inter. Tempos depois lá estávamos lá de novo: Flamengo e Grêmio. Eu gostei de Porto Alegre.
- Precisa voltar, tchê.
- Por muitos anos da minha infância, não houve um estádio deste Brasil que eu não conhecesse. Onde o Flamengo jogasse lá estaria eu e meu pai na arquibancada. Teve um ano.... Não sei se te falei... Mas meu pai era funcionário da Light... Daí... Teve um jogo no Maracanã... Flamengo e Cruzeiro. Dia três de Março de 1968. Lembro como se fosse hoje. Meu pai comprou os ingressos para mim e pra minha mãe. Deu as instruções de praxe. Explicou qual era o lugar certinho pra gente sentar e esperar por ele. Nessa época meu pai trabalhava na sessão do Alto da Boa Vista. Muita mata, muitas árvores. Você sabe como é, né?
Nós fomos. Chegamos com duas horas de antecedência. Exatamente como ele recomendou. E sentamos no lugar determinado. Bem de frente pro meio de campo. Você sabe como são as chuvas de verão, né? Pode cair um dilúvio em Copacabana e você no Centro da cidade não perceber nada. O Flamengo fez um jogo memorável naquela noite. Ganhou de 5 a 1 do Cruzeiro. Mas meu pai não apareceu para ver a vitória. Uma tempestade de chuvas e ventos destruiu árvores e derrubou postes bem na região que ele fazia plantão. No fim do jogo, o vento levou a chuva para o campo da vitória rubro-negra. E todo o redor do estádio ficou debaixo d’água. Não se sabia mais o que era rua, o que era rio. Minha mãe me colocou nos ombros e atravessou aquele mar de água comigo dependurado. Não tinha celular, né? Então você imagina a preocupação. Onde andava meu pai que não tinha chegado pro jogo? O que havia acontecido com ele? O jogo terminou por volta das dez da noite, mas nós só chegamos a casa às três da manhã. E assim que abrimos a porta da sala, completamente ensopados. Meu pai, com um copo de agua na mão perguntou: Vocês viram o jogo?
- Mas bah, qual o seu jogador predileto? Qual seu craque?
- Garrincha.
- É mesmo... Nem me lembrava. O Garrincha jogou uma temporada pequena no Flamengo, não é?
- É. Mas eu sou botafoguense. Todos os meus irmãos são flamenguistas. Doentes. Minha filha também é. Mas eu nunca consegui gostar daquela camisa vermelha e preta. Preto não combina com vermelho. Eu torço pro Botafogo desde pequenininho. Mas meu pai morreu sem saber disso.

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