A crise vai passar e o ouro negro continuará reinando
Alexandre Bastos 17/12/2014 11:19

*Por Ranulfo Vidigal

O filme “Sangue Negro” (The will be blood) conta a saga da exploração do petróleo na início do século XX, no Texas americano. Um misto de pioneirismo, ambição, riqueza, traição e empreendedorismo nos primeiros passos da sociedade baseada no consumo de um novo tipo de energia que ainda hoje domina o mundo.

No Brasil, a saga do petróleo ganhou contornos em 1953, quando Vargas criou a Petrobrás. Com o choque ocorrido no início dos anos 1970, a exploração se expandiu e a atividade começa sua história no Estado do Rio de Janeiro. Na semana em que o IBGE anunciou a novidade segundo a qual, a participação do Estado do Rio do Janeiro expandiu-se para 11,6% do PIB nacional em 2012 - por influência da participação do petróleo na atividade industrial extrativa fluminense observamos dois movimentos e ambos devem exigir cuidados adicionais para as lideranças políticas e empresariais da segunda economia do país.

Na esteira da crise profunda que atinge países do Primeiro Mundo, e do rearranjo das forças geopolíticas mundiais, os preços do petróleo sofrem grandes desvalorizações impactando a expectativa futura de rentabilidade desse segmento. Ao mesmo tempo, reduz a capacidade de atratividade de investimentos em alternativas energéticas menos intensivas em carbono, como as energias solar, eólica, ou biocombustíveis.

Ao mesmo tempo cresce de importância na sociedade, a agenda ambiental, bem com as pressões para a implantação de uma economia de baixo carbono, num horizonte de médio prazo diante das mudanças climáticas. Isso fortalece os setores contrários aos combustíveis fósseis para um novo acordo do clima que ocorrerá em Paris em 2015 apontando na direção de uma gradativa mudança na matriz energética mundial.

O petróleo reduzindo sua cotação para níveis entre 50 e 60 dólares por barril gera uma capacidade adicional de consumo para o americano médio e uma queda nos custos industriais para a indústria chinesa. Favorece também países europeus e o Japão – importadores de energia. Por outro lado desequilibra financeiramente países com a chamada “doença holandesa”, como é o caso de Rússia e Venezuela, cujas moedas e títulos de dívida soberana já sofrem forte desvalorização. Alguns cálculos estimam em 1 trilhão, o valor da transferência de renda entre produtores e consumidores de energia, diante do novo quadro que se instala nessa virada de ano.

No Estado do Rio de Janeiro, especificamente, a indústria extrativa representa 30% do PIB estimado 550 bilhões de reais. Além disso, emprega diretamente 50 mil trabalhadores altamente qualificados – a maioria com escolaridade superior e pós-graduação praticando remuneração equivalente a 15 salários mínimos mensais (cinco vezes mais, em relação à media estadual). Ainda transfere para o orçamento estadual e de vários municípios produtores cerca de 12 bilhões de reais por ano em royalties.

A crise de governança da Petrobrás (que reduziu seu valor de mercado) e o choque de preços tendem a esfriar a indústria de óleo e gás sem, contudo, representar risco de reversão do cenário de fortalecimento industrial tanto do Rio, quanto do Brasil. A incerteza quanto à condução dos negócios da maior empresa de petróleo brasileira afeta toda cadeia produtiva do setor, que começa na extração nos poços em alto mar, passa pelos oleodutos e navios, antes do refino e finalmente chega ao consumo, através de uma rede de revendedores por todo o país.

A extração do pré-sal - que hoje representa 40% da produção brasileira tende a subir e levar a participação do petróleo no PIB nacional a 20%, em 2020. Além de fortalecer a cadeia produtiva industrial vai financiar políticas públicas de saúde e educação aumentando a produtividade da força de trabalho do país.

Por se tratar de uma commodity altamente politizada, o petróleo vai apresentar momentos de euforia e fases de estagnação nos seus preços. Do total de investimentos previstos pela FIRJAN para 2014-2016 no Estado do Rio de Janeiro de 236 bilhões de reais 60% são destinados a petróleo e gás. Destaca-se aí a implantação do COMPERJ em Itaboraí e seu efeito multiplicador sobre os segmentos da construção civil, serviços e comércio.

A crise vai passar, os ajustes vão acontecer e no futuro temos que aproveitar a era do petróleo evitando a “maldição dos recursos abundantes” e a “doença holandesa” expandindo a industrialização fluminense e brasileira, agregando valor ao petróleo bruto e ao gás e assegurando recursos para combater pobreza, proteção da biodiversidade e assegurar maior qualidade na educação e saúde pública.

*Ranulfo Vidigal é economista, mestre e doutorando em políticas públicas, estratégias e desenvolvimento pelo Instituto de Economia da UFRJ.

* O artigo foi publicado no portal Viu Online (aqui)

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