Há nove anos, nossa mãe é só lembrança. Só lembrança? Bobagem minha. É a lembrança mais presente, mais real, mais palpável. Impossível não ver os traços dela na família que gerou. Na minha irmã, o jeito acolhedor que faz a casa estar sempre cheia, comida à mesa, todos de corações e barrigas cheias. Na minha sobrinha, a meiguice, a ternura, a capacidade de sempre fazer amigos. No meu sobrinho, o bom coração, o semblante sereno, a boa conversa, o carinho. Na minha filha, além do próprio nome e do semblante, a obstinação, o não chorar, apesar de sofrer, o se manter firme. Em mim, sempre procuro algo dela e, vez por outra, me vejo falando e é o som de sua voz que escuto, são os seus ensinamentos que repasso, é o seu sorriso que aprendi a manter, mesmo quando a situação exige lágrimas. Queria ser um pouco da mãe que ela foi (e ainda é, pois seus conselhos vem sempre quando preciso): amorosa, paciente, carinhosa, acolhedora, amiga.
Quem a conheceu está aí para confirmar: Maria Helena, minha mãe, era um ser único, iluminado, que aquecia o coração de tal forma que a sua saudade não carrega culpas, desespero ou dor. É repleta de agradecimento pela benção que foi o tempo em que estivemos juntas, pelo aprendizado e pela certeza da família íntegra e única que ela criou.
Mas, em dias como hoje, é difícil não lembrar Drummond:
"Por que Deus permite
que as mães vão-se embora?
Mãe não tem limite,
é tempo sem hora,
luz que não apaga
quando sopra o vento
e chuva desaba,
veludo escondido
na pele enrugada,
água pura, ar puro,
puro pensamento.
Morrer acontece
com o que é breve e passa
sem deixar vestígio.
Mãe, na sua graça,
é eternidade.
Por que Deus se lembra
- mistério profundo -
de tirá-la um dia?
Fosse eu Rei do Mundo,
baixava uma lei:
Mãe não morre nunca,
mãe ficará sempre
junto de seu filho
e ele, velho embora,
será pequenino
feito grão de milho¨.