Na Curva: Quem matou Bernardo?
Suzy 27/04/2014 23:30
  Quem matou Bernardo?   No município de Três Passos, no Rio Grande do Sul, um menino há anos vagava horas pelas ruas. Não era um “pivete”, um menor abandonado. Esse mesmo menino pulava o muro – alto - para entrar em casa, a maioria das vezes à noite. Não era um adolescente rebelde, um menor infrator, alguém que nós, sociedade, optamos por ignorar. No município de Três Passos, com cerca de 24 mil habitantes, todos sabiam da maneira, no mínimo estranha, como Bernardo era tratado. Ninguém fez nada. Ministério Público, Justiça foram avisados, segundo o advogado da família materna, dos abusos pelos quais o menino passava. Tem cópia de email, houve depoimento, se demonstra que não houve oitiva de possíveis testemunhas, que poderiam comprovar ou, ao menos, reforçar a semente da dúvida. Um juiz acabou convencido que o pai de Bernardo merecia uma segunda chance e poderia ficar com o menino. Ninguém fez nada. A mãe de Bernardo, pouco antes de assinar um divórcio milionário, teria se matado no consultório do marido.  O que a levou a isso, especula-se, mas não é muito difícil mesmo imaginar. O pai de Bernardo já tinha um caso, para algumas pessoas a perda de um amor é insustentável... Se foi suicídio, o que se sabe é que ninguém fez nada para amparar Bernardo depois que foi abandonado à própria sorte. Ninguém fez nada antes. Agora, depois que o corpo de Bernardo foi encontrado em uma cova, em meio à lama e sujeira, no meio do mato, todo mundo de Três Passos sabia de alguma coisa. Todos estão chocados, escandalizados. Só Bernardo está morto. Segundo a polícia, a madrasta e uma amiga executaram o crime, praticado com injeção letal. Há suspeita que Bernardo tenha sido enterrado ainda vivo. Pobre Bernardo. Nem sendo de uma família de projeção, conhecida, reconhecida, alguém conseguiu sair do lamento para a prática. Claro que nem nos mais tenebrosos pesadelos uma pessoa normal pode imaginar que outra, que cria, mora, viu uma criança pequena. Ou não, que a tenha visto uma única vez, possa fazer uma atrocidade dessas. Se o pai está envolvido? De alguma forma, sim, na minha opinião. Dentro de casa, mesmo trabalhando muito, não percebia o que acontecia? Não criou uma relação de proximidade com o filho ao ponto de perceber os sinais? Mas, se nem Bernardo conseguiu ser salvo, que diremos das milhares de vítimas que sofrem caladas, quase invisíveis nas periferias, nos cantos sem projeção. Isso incluem as mulheres também vítimas de violência domésticas, cujos gritos de socorro são ignorados. Somente quando viram somente corpos, aparece alguém para dizer que havia um registro de ocorrência, que nunca saiu de uma gaveta. O Brasil, que parece estar em uma era de mudança, tem que mudar para valer. Repensar nossas leis, a forma de atuação da Justiça, nosso próprio olhar. Deixar de lado o só falar e partir para a prática. Mudanças reais nas leis, que influenciam os três poderes. Mudanças reais em nós, que, muitas vezes por omissão, compactuamos com o que está errado. Todos que sabiam e não fizeram são também responsáveis pela morte de Bernardo.

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    Suzy Monteiro

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