Peregrino de Almas...
bethlandim 11/04/2014 21:59

“Um dia lá no Oriente de onde tudo começa, partiu meu povo contente, caminhando sem ter pressa. Quando partiu? Ninguém sabe. Por que partiu? Ninguém diz. Partiu quando deu vontade. Por que partiu? Porque quis. Então aqui aparecemos, sem nunca saber quem fomos. Nosso passado esquecemos, só interessa o que somos. O ontem sempre é passado, o amanhã sempre é futuro, vivemos despreocupados, o hoje que é mais seguro. Dizer que pátria não temos é uma grande insensatez. A nossa pátria sabemos, é maior que a de vocês. Sua pátria é um país somente, a nossa é toda esta terra, que Deus nos deu de presente, por nunca fazermos guerra. Somos um povo que canta, feliz por saber viver. O por do sol nos encanta, amamos o amanhecer. E assim, sempre de partida, ora no campo ou cidade, amamos a nossa vida, somos reis da Liberdade!”

Poesia A Romá do cigano Zurka Sbano que chegou ao Brasil entre o final do século XIX e começo do século XX. Ele registrou com precisão e riqueza de detalhes, manuscrito a lápis, a rica, pulsante e viva tradição oral Zurka. Os ciganos representam o estrangeiro por excelência. A definição internacional defendida pela ONU - Organização das Nações Unidas - os coloca como um povo de origem única, disperso por vontade própria por entre as nações. Auto denominam-se Rom, Sinti, Manouche, Calon. Optam pelo título de cidadãos do mundo, com o carimbo no passaporte até poucas décadas, registrando em muitos países, apenas: estrangeiro. Para a cultura ocidental estes eternos estrangeiros, nômades apátridas por opção, errantes por toda a Terra, são e estão à parte. A rejeição quase que institucionalizada do diferente é característica das sociedades hegemônicas majoritárias. O anonimato, o distanciamento, a presença invisível em relação aos gadjé, é um eficiente mecanismo de defesa que propicia os mistérios ciganos, garantindo privacidade e inacessibilidade. Porém o mesmo anonimato que os protege, pode ameaçar. O desconhecimento é uma das grandes fontes do preconceito. A palavra cigano é muito forte. As pessoas têm preconceito sem ao menos  conhecer a cultura cigana. Fazer-se conhecer por si mesmo como um povo, uma etnia, com cultura e costumes próprios, e ao mesmo tempo ver assegurado o genuíno direito à soberania de seus traços próprios e peculiares, preservando o que lhes pareça essencial, transitar por entre as muitas fronteiras e mistérios do ser... e permanecer.

Todo povo é  em parte o que os nossos ancestrais nos delegaram...

Falando nos ciganos me remeto ao nosso querido Padre Murialdo e transcrevo um trecho da reportagem do Jornal do Brasil de 05/05/1991...

Três seminaristas gaúchos, de 22 a 24 anos, fizeram opção pelos marginalizados, trocaram o conforto de um seminário em Porto Alegre pela dureza de um acampamento de barracas de lona em São Paulo, à margem do poluído rio Tietê, onde estudam, rezam e trabalham sob a direção de Renato Rosso, um padre italiano. Murialdo Gasparetti, Jorge Pierozan e Reni Zanotto chegaram à capital paulista (a pouco tempo…). Sujos, às vezes cheirando mal, eles deixam o acampamento bem cedo para, de ônibus ou a pé, chegarem às 8 horas no Instituto Teológico Pio XIX, no alto da Lapa, a sete quilômetros de distância.  A Comunidade de Nômades Charles de Foucauld, nome que deram ao seminário de lona, começou a funcionar este ano e é a primeira iniciativa desse tipo no Brasil…Ali estão acampadas 30 famílias, com 102 adultos e 46 crianças. Moram em barracas de lona e trailers, sob as ordens do capitão Zurka Sbano, de 69 anos, neto de ciganos do sul da Itália, que abandonou o picadeiro e viagens para fixar sua tenda num terreno baldio. É sob o abrigo da barraca do capitão Zurka Sbano que o padre Renato celebra a missa comunitária, a cada quinzena, sempre às terças-feiras. O visual cigano afasta as pessoas, muitas não acreditam que os rapazes vão mesmo ser padres. A reação começou pela família. Os parentes escrevem para a gente desistir dessa vida, conta Murialdo falando pelos companheiros. Nas ruas de São Paulo, eles são obrigados a mostrar os documentos com freqüência, sempre confundidos com marginais. “No metrô, os passageiros fogem do vagão, quando a gente embarca, porque a roupa suja e o mau-cheiro os incomodam, revela... O modo de vida dos ciganos exige que a gente viva assim.”

Neste tempo de Quaresma e de conversão é tempo também de agradecer. Hoje quero agradecer a presença deste Pastor de Almas, Padre Murialdo Gasparetti, que tem sua essência marcada pela ausência de preconceito, pela escuta sempre apurada, pelo discernimento sempre em suas ações, pela alma cigana de percorrer todos os espaços como um nômade, com o único objetivo de levar a palavra de Jesus. Padre Murialdo é exemplo vivo de doação, de juventude, de sabedoria e de encontro com Deus. Neste encontro e em todos os momentos, sempre busca despertar nos jovens a fé, a vida, a justiça e o sabor de se sentir amado por Deus. Campos agradece a sua presença tão bem-vinda, como um peregrino que está sempre a caminhar olhando para os lados e acolhendo a tudo e a  todos ao longo do seu caminho.

Você, Padre Murialdo, é na essência da palavra um “Peregrino de Almas”.

Com afeto,

Beth Landim

 

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