A polêmica do mensalão no STF
Christiano 19/09/2013 16:42

Confira abaixo o texto sobre a polêmica votação no Supremo Tribunal Federal ocorrida ontem, que aceitou a possibilidade de parte dos condenados no mensalão conseguirem recorrer da decisão através de embargos infringentes. O texto foi enviado por Tiago Abud da Fonseca, defensor público na Comarca de Campos, mas que assinou como um cidadão brasileiro, exprimindo a sua opinião sobre a polêmica decisão.

A lição do Supremo Tribunal Federal e o direito para os humildes

Tiago Abud da Fonseca[1] O Supremo Tribunal Federal, ao apreciar a possibilidade do cabimento ou não de embargos infringentes nas ações penais originárias, decidiu, por apertada maioria, com o voto desempate do Ministro Celso de Mello, pelo cabimento de tal recurso, dando ênfase ao direito ao duplo grau de jurisdição, isto é, ao direito que o processado tem de recorrer da decisão judicial que lhe seja desfavorável. Sentenciou o decano da Corte Maior, que ninguém pode ser tolhido do seu direito de defesa ainda que se revele antagônico o sentimento da coletividade. Primeiro, deve ser assentado que com tal possibilidade o Supremo Tribunal Federal abriu a oportunidade para alguns dos condenados(somente aqueles que tinham quatro votos favoráveis a uma de suas teses) de rediscutir o juízo majoritário desfavorável emitido pela Corte. Isso não quer dizer que a tese dos réus será acatada, isto é, que terão sucesso no recurso que será interposto. Uma coisa é o direito ao recurso, outra o direito que se pleiteia através da impugnação. Noutras palavras, ganharam alguns dos réus o direito de recorrer, mas não significa que a tese referente a inexistência do crime tenha a mesma sorte. Pode, ao fim e ao cabo, ser mantida a condenação nos termos que está. O leigo perguntará: mas qual o sentido de admitir o recurso se é para negá-lo? O Brasil é signatário de tratados internacionais que garantem o direito de recorrer. Ao réu julgado em única instância deve ser garantido tal direito, que não foi reconhecido pelo fato de terem sido opostos os embargos de declaração, já que esta insurgência visa simplesmente sanar obscuridade, omissão, contradição ou dúvida na decisão, ou seja, não tem o poder de reexaminar as questões de fato que levaram ao juízo de condenação. Assim é que, se o Estado brasileiro não permitisse tal recurso, poderia ser questionado perante a Comissão e à Corte Interamericana de Direitos Humanos, politizando tal discussão, o que é de todo prejudicial para uma decisão que deve ser estritamente jurídica e não política, afinal de contas se está julgando alguém e o levando para a cadeia, o que deve ser alijado de valores políticos, mas tomado pela rédea do Direito. Inibe-se o argumento de que será levado à cadeia fulano ou beltrano por perseguição política, ficando evidente que quem irá para o novo presídio que está sendo construído(veja, o próprio executivo espera a condenação), assim será porque cometeu crime. Que fique claro. Aliás, alguns dos réus sinalizaram em questionar a decisão suprema em tais órgãos internacionais. Por isso talvez a serenidade do voto desempate esconda a preocupação de garantir o direito de defesa para que a decisão final seja inquestionável. Ou poderão debater os réus que o STF lhes foi duro ou que o julgamento foi político? Noutros termos, pode o Supremo Tribunal ter dado com uma mão para retirar com a outra. Para quem leu o Código da Vida, se verdadeira a história contada por Saulo Ramos, percebe que o tempo fez bem ao Ministro Celso de Mello. Aliás, a respeito dos benefícios do tempo, o processo deve ter a duração razoável, o que significa que não pode ser lento demais, de modo a tardar a justiça, como não pode ser por demais breve, de forma ao julgamento se transformar em justiçamento. Quantas vezes não agimos em curto circuito e não nos arrependemos? Só que o magistrado não pode consertar seu erro, uma vez prolatada a decisão, daí porque o tempo de maturação para tomada de decisão também se faz imprescindível. Contudo, fica a lição dada pela Corte Suprema em tal julgamento. Tomara que esses direitos reconhecidos no chamado mensalão sejam estendidos aos pretos, pobres e desdentados que são as figurinhas carimbadas das varas criminais Brasil afora, como, por exemplo, o direito de responder o processo e de recorrer em liberdade, bem assim o direito ao próprio sistema recursal. Não significa, contudo, que no fim das contas ficarão estes impunes. Mas o direito distribuído de forma igualitária, independente da cor da pele e da classe social, amaina a sensação(falsa) de impunidade que surge do posicionamento do Supremo Tribunal Federal. Só o futuro dirá qual caminho adotará a justiça brasileira. Contudo, não podemos nos esquecer de Cícero quando sentenciou: “Lembremos que se deve observar a justiça até em relação aos humildes” (De Officis, Livro I, XIII, 41) [1] O autor é cidadão brasileiro.

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    Christiano Abreu Barbosa

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