Evolução
Marcos Almeida 04/06/2013 12:27

Vale até a pergunta sobre a relação com o movimento. E eu, humildemente, respondo: tudo! O cérebro passou de um simples "resfriador de sangue' para o mais importante "organizador" das nossas ações, sentidos, aprendizagens até a nossa estupenda evolução. E claro, quem se movimenta é muito mais inteligente.  Fica a dica desta entrevista muito legal sobre este órgão fantástico com uma especialista no assunto ao qual sou fã.

Neurocientista da UFRJ, Suzana Herculano-Houzel é a primeira brasileira a participar da TED (Tecnologia, Entretenimento e Design, em português) — prestigiada série de conferências que reúne grandes nomes das mais diversas áreas do conhecimento para debater novas ideias. Suzana falará no dia 12 de junho, sob o tema “Ouça a natureza”, e destacará suas descobertas únicas sobre o cérebro humano.

Sobre o que vai falar na TED?

Vou falar sobre o cérebro humano e mostrar como ele não é um cérebro especial, uma exceção à regra. Nossas pesquisas nos revelaram que se trata apenas de um cérebro de primata grande. O notável é que passamos a ter um cérebro enorme, do tamanho que nenhum outro primata tem, nem os maiores, porque inventamos o cozimento dos alimentos e, com isso, passamos a ter um número enorme de neurônios.

O cozimento foi fundamental para nos tornarmos humanos?

Sim, burlamos a limitação energética imposta pela dieta crua. E a implicação bacana e irônica é que, com isso, conseguimos liberar tempo no cérebro para nos dedicarmos a outras coisas (que não buscar alimentos), como criar a agricultura, as civilizações, a geladeira e a eletricidade. Até o ponto em que conseguir comida cozida e calorias em excesso ficou tão fácil que, agora, temos o problema inverso: estamos comendo demais. Por isso, voltamos à saladinha.

Se alimentarmos orangotangos e gorilas com comida cozida eles serão tão inteligentes quanto nós?

Sim, porque não seriam limitados pelo número reduzido de calorias que conseguem com a comida crua. Claro que nós fizemos uma inovação cultural ao inventar a cozinha. Tem uma diferença entre dar comida cozida para o animal e ele ter o desenvolvimento cultural do cozimento. Mas, ainda assim, se em todas as refeições eles tiverem acesso à comida cozida, daqui a 200 mil ou 300 mil anos eles terão o cérebro maior. Com a alimentação que têm hoje, não é possível terem um cérebro maior dado o corpo grande que têm. É uma coisa ou outra.

Somos especiais?

A gente não é especial coisa alguma. Somos apenas um primata que burlou as regras energéticas e conseguiu botar mais neurônios no cérebro de um jeito que nenhum outro animal conseguiu. Por isso estudamos os outros animais e não o contrário.

Persistem ainda mitos sobre o cérebro? Como o dos 100 bilhões de neurônios, que seus estudos demonstraram que são, na verdade, 86 bilhões?

Sim, eles continuam existindo, mesmo na neurociência. O nosso trabalho já é muito citado como referência. As coisas estão mudando. E o mais legal é que é por conta da ciência tupiniquim, o que eu acho maravilhoso. Mas vemos que é um processo, que ainda tem muita gente que insiste no número antigo.

O novo manual de diagnóstico de doenças mentais dos EUA (que serve de referência para todo o mundo, inclusive para a OMS) foi lançado na semana passada em meio à controvérsia. Especialistas acham que são tantos transtornos que praticamente não resta mais nenhum espaço para a normalidade. Qual a sua opinião?

Acho que essa discussão é muito necessária, justamente para reconhecermos o que são as variações ao redor do normal e quais são os extremos problemáticos e doentios de fato. Então, a discussão é importante, ótima a qualquer momento. Mas acho também que há muita informação errada e sensacionalista circulando, sobretudo sobre o déficit de atenção. As estatísticas variam muito de país para país, às vezes porque varia o número de médicos que reconhece a criança como portadora do distúrbio. E acho que ainda há um problema enorme, um medo enorme do estereótipo da doença mental. Até hoje ainda existe uma resistência louca em ir a um psiquiatra. E acho que, pelo contrário, ganhamos muito reconhecendo que existem transtornos e que eles podem ser tratados.

Ainda há muito estigma?

O maior problema hoje em dia é que é feio ter um distúrbio no cérebro. Perceba que nem estou falando em transtorno mental. Precisar de remédio para o cérebro é terrível. E temos tanto a ganhar reconhecendo os problemas, fazendo os diagnósticos. O cérebro é tão complexo, tem tanta coisa para dar errado, que o espantoso é que não dê problema em todo mundo sempre. Então, acho normal que boa parte da população tenha algum problema, não me espanta nem um pouco. E, uma vez que se reconhece o problema, que se faz o diagnóstico, há a opção de poder tratar. Se dispomos de um tratamento, por que não usar?

O presidente dos EUA, Barack Obama, recentemente anunciou uma inédita iniciativa de reunir pesquisadores dos mais diversos centros para estudar exclusivamente o cérebro. O que podemos esperar de tamanho esforço científico?

Não só o cérebro, mas o cérebro em atividade. Obama quer ir além do que já tinham feito — estudar a função de diferentes áreas — e entender como se conectam, como falam umas com as outras, ter ideia desse funcionamento integrado, dessa interação. Essa é uma das grandes lacunas do conhecimento: entender como as várias partes do cérebro funcionam ao mesmo tempo. Não sabemos como o cérebro funciona como um todo; é uma das fronteiras finais do conhecimento.

Não sabemos como o cérebro funciona?

Como um todo, não. Sabemos o que as partes fazem, mas não sabemos como se dá a conversa entre elas. Não sabemos a origem da consciência, da sensação do “eu estou aqui agora”. Que áreas são fundamentais para isso? É esse tipo de conhecimento que se está buscando, do cérebro funcionando ao vivo e em cores, em tempo real.

O objetivo não é estudar doenças, então?

Não, o grande objetivo é estudar consciência, memória; entender como o cérebro reúne emoção e lógica, coisas que são fruto da ação coordenada de várias partes. Claro que desse conhecimento todo podem surgir implicações para o Alzheimer e outras doenças. Mas, na verdade, falar em doenças é uma roupagem usada pela divulgação do programa para o público assimilar melhor. Existe esse preconceito de que a ciência só vale quando resolve uma doença.

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    Marcos Almeida

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    Marcos Almeida é assessor esportivo, especialista em Ciência da Musculação e mestre em Ciência da Motricidade Humana.

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