Shakespeare & árabes, Folha na Flip 2012
lucianaportinho 18/07/2012 16:05
Dois momentos na Flip 1 – “Quando não houver império britânico, nem norte-americano, haverá Shakespeare” (Drummond) Na mesa “O Mundo de Shakespeare” dois respeitados especialistas, Stephen Greenblatt e James Shapiro apresentaram razões fundamentadas pelas quais não sobram dúvidas de que um indivíduo chamado William Shakespeare (1564-1616) de fato escreveu obras-primas como Hamlet ou Rei Lear. “Tudo isso é bobagem” ambos garantem. Ainda que a dúvida tenha habitado mentes lucidas como as de um Henry James, um Mark Twain ou um Francis Bacon. Voltaire achava Shakespeare “vulgar”. Tolstoi implicava com o inglês. Já Freud foi particularmente obcecado com a questão da possibilidade da existência de um Shakespeare real. [caption id="attachment_4335" align="aligncenter" width="500" caption="Ft.flip.org.br"][/caption]

 

Greenblatt parte da premissa de que o ator, dramaturgo e empresário de teatro Shakespeare era um gênio que nunca fez peças do nada. “Ele foi colaborativo e reescreveu sim, só que era tão superior aos demais que quando o fazia, o dele era tão melhor que obscurecia o outro. Não havia direito intelectual e ele reescrevia também. Foi um artista incrivelmente criativo, poderoso, que se coloca inteiro na história. A visão dele é perceptível, ele enxergava o que tinha força de ser levado ao palco. Há sinais de que reescrevia compulsivamente as suas próprias obras”, disse. Sobre a alegada falta de documentos de época, Greenblatt explicou: “Embora vivesse numa época muito burocrática, em que havia uma preocupação em registrar todos os passos de certas pessoas, Shakespeare não era uma dessas pessoas: era apenas um ator e dramaturgo, sem importância alguma.” Além disso, acrescentou, “A Inglaterra já era oficialmente protestante, mas a mãe de Shakespeare era católica e, na verdade, quase todo mundo era católico. Como o catolicismo de então era equivalente à Al-Qaeda de hoje”, ele não tinha interesse algum em deixar uma trilha de documentos sobre suas origens ou suas ideias. “Shakespeare voava abaixo da linha do radar, tinha uma profunda aversão à prisão”, garantiu em tom brincalhão. Ambos, Greenblatt  e Shapiro trouxeram seus livros a Flip: pela Companhia das Letras, A Virada, de Greenblatt, que foi professor da Universidade da Califórnia em Berkeley e, em seguida, de Harvard; e pela Editora Planeta, 1599 – Um ano na vida de William Shakespeare, de Shapiro, professor da Universidade Colúmbia. 2- “Os americanos não entendem absolutamente nada de cultura árabe” ao assegurar isso o poeta Adonis - nascido sírio e com o nome Ali Ahmad Said Esber – junto do prestigiado escritor franco-libanês que foi admitido na Academia Francesa de Letras em 2011 Amin Maalouf, deu o norte de sua intervenção na mesa intitulada “Literatura e Liberdade”. Apresentados à plateia como “filhos do mundo mediterrâneo - do pão, do azeite e do vinho-, que misturou judeus, cristãos e muçulmanos por pelo menos nove séculos” a moderadora e jornalista portuguesa (correspondente no Oriente Médio por muitos anos) Alexandra Lucas Coelho abriu a sessão. Os dois escritores têm um pé no Ocidente e outro no Oriente, na literatura e na militância política e social, cada um à sua maneira. Amim, que se define como um otimista inquieto deixa claro: “Não faço diferença entre fontes ocidentais e orientais. Vivi ao meio onde tentávamos beber em todas as duas. Nunca hesitei em me dirigir aos autores ocidentais e tentar aprender com eles. Sou um pouco de tudo isso”. Já Adonis esclarece que a cultura árabe repousa sobre dois pilares: a religião e a poesia. “Não há um único grande poeta árabe que seja religioso”, a despeito de que “religião e cultura estão estreitamente ligadas no mundo árabe”. “No contexto da religião, o ser humano só pode crer, obedecer e praticar a religião. Não tem nada a acrescentar. Nem Deus pode acrescentar algo, porque já disse sua última palavra ao seu último profeta. É por isso que precisamos refazer o passado e questionar nossa moral, nossas tradições, nossa religião. Nem sequer é possível haver literatura, porque esta propõe visões diversas e cria novas relações, o que é impossível quando a última palavra já foi dita. A maioria dos problemas do mundo de hoje é de ordem cultural”. Amin concorda. “O século XXI será o século da cultura ou não será”. E salienta que não por acaso as tiranias desconfiam da ficção. [caption id="attachment_4316" align="alignleft" width="300" caption="Ft.Luciana Portinho"][/caption] [caption id="attachment_4317" align="alignright" width="300" caption="Ft.Luciana Portinho"][/caption]
Matéria publicada domingo (15/07) no caderno especial, página 3, Folha na Flip 2012.
Luciana Portinho

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