Pesquisadores da Uenf identificam Cianobactérias na água tratada em Campos
Esdras 18/03/2012 14:13
Sinal de alerta Presença de cianobactérias do tipo cinecosiste, em material recolhido da água tratada, confirmada por pesquisadores da Uenf Já falamos sobre os percalços do professor Marcos Pedlowski, da Uenf, com a concessionária “Águas do Paraíba”. Primeiro, o Prof. Marcos Pedlowski recebeu, perplexo, o fato de que estava inadimplente, e ficou ainda mais espantado com o valor estratosférico que lhe era cobrado na fatura. Porém, após pagar e aguardar um momento em que pudesse comparecer à sede da “Águas do Paraíba” para reclamar do valor da fatura de fevereiro, o Prof. Pedlowski acabou tendo seu abastecimento suspenso em função de problemas causados pelas obras de infra-estrutura em curso na Avenida Sete de Setembro. Quando tudo parecia ter se normalizado e a água voltado, o rosário de problemas do Prof. Pedlowski continuou a aumentar, pois a água que chegava da rua parou de encher o reservatório existente no telhado de sua residência. Ao subir até o local e verificar qual era o problema, aí veio a surpresa maior. Apesar de haver o imaginado problema com a bóia da caixa d’água, o Prof. Pedlowski encontrou uma grande quantidade de um material gelatinoso e com cheiro semelhante ao produzido por algas, entupindo o cano por onde a água chegava. Dada a farta quantidade do material e o seu cheiro peculiar, o Prof. Marcos Pedlowski decidiu, então, enviar o mesmo para ser analisado no Laboratório de Ciências Ambientais (Uenf) para verificar o que de fato é, e qual é a sua composição bioquímica. Uma das preocupações que levaram o Prof. Pedlowski a tomar esta decisão de analisar o material é o fato de que algumas algas produzem toxinas que podem ser cancerígenas. O resultado dos exames de laboratório, surpreendentemente, revelaram que o material que entupiu o cano de abastecimento do professor era um aglomerado de algas de cianobactérias do tipo cinecosiste, potencialmente perigosas à saúde da população. Diante do quadro de alerta, a equipe da Somonouviu os pesquisadores Dra. Marina Suzuki e Dr. Carlos Rezende, dois pesquisadores da Uenf, especialistas em água. Leia abaixo alguns trechos da preocupante entrevista publicada na íntegra na Revista Somos desse domingo: Dra. Marina Suzuki (Mestrado em Ecologia e Recursos Naturais pela UFSC e Doutorado em Biociências e Biotecnologia pela Uenf), atua no LCA-CBB-UENF) Somos: Doutora, quando vimos as fotos desse material encontrado na caixa d’água de um consumidor, ficamos muito curiosos em saber o que seria. O que é isso? Marina: Isso é um aglomerado de micro-algas, que já observei ao microscópio, e são algas unicelulares, formadas por uma única célula de tamanho extremamente diminuto, mas que se associaram e se agregaram formando essa maçaroca. Somos: Qual é família dessas algas? Marina: Eu não posso dar o nome e o sobrenome desse organismo porque teria que fazer o ensaio bioquímico, mas ele é uma cianobactéria do tipo cinecosiste. Somos: Já ouvi falar das cianobactérias. Marina: Elas são bastante conhecidas, porque são organismos fitoplanctônicos que aparecem em ambientes poluídos. Nos ambientes aquáticos mais poluídos normalmente se observa o desenvolvimento de cianobactéria. Possivelmente, como essa alga veio através da tubulação de água potável... uma coisa é certa, esse organismo só se desenvolve em local que tem luz, ele precisa de luz pra se desenvolver, e pelo formato desse agregado, ele estava numa tubulação. Veio através de uma tubulação e recebia luz de alguma forma, uma tubulação transparente ou alguma coisa assim. Somos: Para chegar até o cano onde se desenvolveu foi porque veio de algum lugar. Marina: Veio provavelmente da estação de tratamento de água. Somos: E em relação à saúde? Marina: As cianobactérias são bem conhecidas na mídia porque trazem problemas de saúde pública. Elas são conhecidas como algas potencialmente tóxicas. Não que elas sempre produzam toxina, mas sob determinadas condições elas podem começar a produzir. Somos: Então, se a pessoa prepara alimentos com essa água... Marina: Também corre risco. Mesmo fervendo a água as cianotoxinas não se degradam. Elas só são retiradas com filtro de carvão ativado, com um processo muito fino. E as hepatotoxinas são mais persistentes no sistema do que as neurotoxinas. As neurotoxinas, mesmo em concentrações baixíssimas, podem causar problemas ao organismo. Mas elas se degradam mais rápido, em questão de algumas horas, ou em poucos dias, enquanto as hepatotoxinas podem ser mais persistentes, podem durar alguns dias no sistema. Somos: É normal encontrar esse tipo de alga em água que teria que ser potável? Marina: Não, deveria ser zero. Somos: Normalmente, quando existe esse tipo de achado, a concessionária alega que essa contaminação veio dos canos dos consumidores. Marina: Dos consumidores eu não posso jurar, mas veio de cano. Somos: Mas pra chegar ao cano dos consumidores... Marina: É porque passou pela estação de tratamento. Prof. Dr. Carlos Eduardo de Rezende - (atua em Biogeoquímica na área de Sistemas Aquáticos - Graduação em Ciências Biológicas - Especialização em Oceanografia Química - Mestrado em Geociências - Doutorado em Ciências UFRJ) “O problema é quando você tem o efeito crônico e quando você detecta a disfunção hepática, aí já era” Somos: Encontrar essa alga num sistema de água tratada é surpreendente? Dr. Carlos: Eu diria que sim, porque primeiro a alga precisa de luz para crescer, ou seja, essa alga deve estar crescendo em algum lugar e ela estava se depositando ali. A alga tem um ciclo de vida muito curto. Em 24 horas ela cresce, e é um crescimento exponencial, uma célula se replica em várias. Somos: Uma infestação dessa alga pode ser considerada um caso de saúde pública? Dr. Carlos: É uma alga que produz neuro e hepatotoxina, ou seja, se ela produz neurotoxina potencialmente, o fato dela estar ali não significa que ela esteja produzindo toxina, mas potencialmente ela é produtora de neuro e hepatotoxina. Se ela aparece, e aparece em quantidade, o sinal amarelo, pelo menos, tem que ser aceso. O vermelho só se acenderia se você tivesse a comprovação de que ela esteja realmente produzindo neuro ou hepatotoxina. Somos: Se alguém ficar doente... Dr. Carlos: É, mas aí já é fato consumado, se a gente pega alguém doente com uma crise hepática ou com algum problema. Aí se você constata que teve uma intoxicação proveniente dessas toxinas, é o sinal vermelho, é o pior do mundo. Um aparecimento de uma cianobactéria tem que ser investigado porque pode haver essa possibilidade. Somos: A Dra. Marina disse que essa alga não é a pior, mas que também oferece risco. Dr. Carlos: Essas substâncias, se estiverem em concentração elevada, podem te gerar um efeito agudo de momento, mas o pior não é nem isso, porque no efeito agudo você pode ter um problema e rapidamente consertar; o problema é quando você tem o efeito crônico e quando você detecta a disfunção hepática, aí já era. É igual quando você tem uma dor de barriga rápida e seu organismo fica limpo. Outra coisa é quando, ao longo do tempo, fica uma toxina sendo incorporada. O fígado é um órgão vital, o cérebro, outro; uma neurotoxina e uma hepatotoxina. Lembra de fato que ocorreu em Caruaru, onde muita gente que fazia hemodiálise morreu? (*NOTA DO BLOG: O acidente ocorrido no Instituto de Doenças Renais (IDR) em Caruaru, PE, durante o mês de fevereiro de 1996, transformou a história e a prática clínica da hemodiálise. A contaminação da água utilizada para hemodiálise com microcistina, uma toxina de cianobactéria, causando a morte de 65 pacientes trouxe várias lições à comunidade médica e à sociedade civil.) Dr. Carlos: O sistema de tratamento de água da região não segurava isso, e as pessoas usavam a água pra fazer o processo de hemodiálise. Ao invés de só limpar o sangue do pessoal, eles limpavam e jogavam aquela substância no fígado e muitas pessoas morreram. Foi quando houve um sinal de alerta pra isso, e começou um grande mapeamento de ocorrência de cianobactéria no Brasil. Somos: Os campistas vêm tendo problemas com essa água. Substâncias incríveis têm sido encontradas nessa água servida à população. Existe como melhorar essa filtragem para acabar isso? Dr. Carlos: Olha, já existem técnicas, mas são caras... Leia mais na edição da Somos desta semana, nas bancas.

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