É TUDO ou Nunca mais
Mariana Luiza 22/01/2017 01:18 - Atualizado em 15/05/2020 15:00

No mês do nascimento de Santo Antônio, e meu aniversário, um conto antigo, que ganhou um prêmio de literatura.

 

 “Promessa Infalível para Santo Antônio”

Toda terça-feira acender uma vela, rezar três Pai Nosso, três Ave Maria, fazer o pedido com fé e dar um nó na fita azul que acompanha este folheto. São treze semanas, treze nós e um pedido realizado. Esta promessa é tão infalível que antes do quinto nó ser dado, seu pedido será realizado.

Ela era uma mulher que amava demais. Amava como Cazuza, exageradamente e adorava um amor inventado. Ele também amava demais. Não em intensidade, em quantidade de mulheres. Amava uma aqui, outra ali, uma hoje, outra amanhã e às vezes até duas no mesmo dia. Foi então que Eles se conheceram. Numa festa do trabalho. Eram de departamentos diferentes, mas isso não fez nenhuma diferença. Um mês depois, já estavam saindo juntos. E Ela, como era de se esperar, acabou se apaixonando por Ele. Mesmo sabendo que Ele já tinha “passado o rodo” em todas as mulheres de seu departamento e agora dava vôo por outros setores da empresa.

A faxineira do andar Dele, era quem passava as informações para Ela. E aconselhou: “Homens desse tipo, gostam de desafio. Dá uma esnobada que ele come na tua mão”.

E assim Ela fez, mas logo percebeu que se esnobasse demais acabaria perdendo. Depois de alguns encontros Ela se entregou a Ele. De corpo, coração e alma. Para Ele foi excelente, mas o fim de mais um caso. Para Ela, maravilhoso e o início de uma longa história. Agora era Ele quem esnobava, mas não para Ela correr atrás, muito pelo contrário. Ele não queria mais nada. Ela queria seu amor.  Ela queria demais.

Depois de um tempo afastados Eles se reencontraram. Em outra festa da empresa. Ela, sozinha. Ele sozinho. Conversaram, trocaram charme, mas Ele não queria mais nada. E Ela, queria demais. “Tenta se aproximar. Vira amiga dele, sem pressão. Homem detesta ser pressionado. Vá com calma e você vai ver, logo, logo Ele se apaixona.”

Novamente, Ela seguiu os conselhos da faxineira. Fingiu sentimentos, escondeu o amor que sentia e se tornou a melhor amiga do homem que amava. Ela achava que com o tempo Ele iria se apaixonar, mas a tática da amizade não funcionou.

Foi então, que um dia, dentro da caixa de correio, junto de suas correspondências Ela encontrou um folheto com uma fita azul.

“Promessa Infalível para Santo Antônio”

Era um sinal. Era a solução.

Primeira Terça-feira. Um nó na fita: “Santo Antônio, faça Ele se apaixonar por mim. Três Pai Nosso, três Ave Maria.”

Primeiro encontro após a promessa. No elevador. Os dois trocam olhares e sorrisos.

“Parece estar funcionando”.

Segunda Terça-feira. Dois nós na fita e o mesmo pedido: “Santo Antônio, eu lhe rogo que Ele se apaixone por mim”. Três Pai Nosso, três Ave Maria e um empurrãozinho ao destino: Naquela mesma terça, Ela passou sem querer, pelo departamento dele.

“Não posso deixar tudo nas mãos do Santo. Preciso lhe dar uma ajudinha”.

Ele não estava na empresa. Tinha feito uma viagem de negócio, assim, às pressas, sem avisar. Terceira Terça-feira. Três nós na fita e o mesmo pedido, cada vez mais suplicante: “Santo Antônio, eu lhe peço, eu lhe imploro, faça com que Ele se apaixone por mim. Por tudo que é mais sagrado.”

Antes de sair para o trabalho deu uma caprichada no visual: Vestido na altura do joelho, cabelos soltos. Salto alto. Ele ainda não tinha voltado da viagem.

Antes do quinto nó ser dado, seu pedido será realizado...

Quarta Terça-feira. Quatro nós na fita. O mesmo pedido...

Ele liga convidando para sair. Um jantarzinho romântico num restaurante na Lagoa. E depois...quem sabe... Algo mais. Ela aceita. E comemora eufórica.

No fim do encontro, início da madrugada. Ele se despede com um até logo... nem tão logo assim...

Antes do quinto nó ser dado, seu pedido será realizado...

Quinta Terça-feira. Cinco nós na fita. E o pedido não realizado. E Ele ainda não se apaixonou. “Talvez Ele esteja apaixonado, mas não se declarou ainda... Afinal eu pedi ao Santo que Ele se apaixonasse, mas me esqueci de pedir uma declaração. Será que Ele vai ficar nesta paixão enrustida? Tenho de me insinuar, deixar de me fazer de amiga.”

Dez pai Nosso, Dez Ave Maria. E muitas súplicas. “Meu santinho, será que posso reformular meu pedido? É que junto com a paixão eu também quero uma declaração. Faça Ele se declarar!”

Antes da Sexta Terça-feira. Decepção. Ele está namorando a secretária. A boazuda do departamento Dela.

“Que decepção hein, Santo Antônio. Tanto tempo de investimento e esta aí nem precisou fazer nada que já está namorando Ele.”

Apesar da quase falta de esperança, Ela não desistiu e confiou no Santo.

Décima Primeira Terça-feira. Onze nós na fita. E o mesmo pedido... Um pouco modificado: “Meu Santo, pelo amor de Deus, faça Ele terminar com a secretária e se apaixonar por mim, com declaração, por favor!!”

Décima Segunda Terça-feira. Doze nós na fita. Alegria e ansiedade no pedido. “Meu Santinho, falta apenas um nó. Obrigada por fazer Ele terminar com Ela. Obrigada por Ele ter descoberto que tipo de mulher era aquela secretária. Agora falta só o Senhor me ajudar... Não se esqueça da minha declaração. Não me desaponte, hein!”

Quinta-feira. happy hour  no barzinho perto da empresa. Eles se reencontram. Ela sorri timidamente. Ele escancara os dentes. Ela acena, Ele se aproxima e diz assim, na lata, na frente de todo mundo: “Eu estou apaixonado por você. Não consigo, nem posso sufocar tudo que estou sentindo. E fico me perguntando por que só agora pude perceber o quanto você é importante pra mim. Como deixei passar tanto tempo? Vamos ficar junto?”

Santo Antônio havia caprichado na declaração. Com direito a platéia e tudo. O dono do bar ficou tão emocionado que mandou descer uma rodada de cerveja por conta da casa. Só pra comemorar o pedido de namoro.

E ela...Disse não.

“Você só me quer porque Santo Antônio interveio, se eu não tivesse feito a promessa, se eu não tivesse suplicado por um milagre, você não teria se apaixonado. Assim eu não quero. Eu queria que você se apaixonasse por livre e espontânea vontade e não por pressão de um Santo. Vê se me esquece.”

A rodada de cerveja foi cancelada. E o pedido ao santo também.

Primeira Terça-feira livre da promessa. Ela conhece outro colega de trabalho. De outro departamento.

Ele está saindo com a única mulher que ainda não tinha “passado o rodo”. A faxineira do seu andar.                                                   

                                                                                 

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