O melhor lugar do mundo é aqui... e agora! (Será?)
Mariana Luiza 22/01/2017 01:17 - Atualizado em 15/05/2020 14:58
Quando fiz 15 anos, meus pais me deram de presente uma viagem pela Europa. Foram 35 dias “mochilando”, com uma amiga de infância, pelo velho continente. Era a minha primeira viagem ao exterior e a primeira vez que viajava sem meus pais ou algum responsável. Promessa de muita aventura e boas lembranças. Eu quase não comprei souvenirs ou bugigangas, mas gastei uma fortuna em filmes fotográficos registrando os detalhes de cada futura saudade.
Amigas, em Rotterdam 1998
Amigas, em Rotterdam 1998
Foram 41 rolos de 36 poses. Um total de 1460 fotografias e um prejuízo na conta bancária dos meus pais, numa época em que a fotografia digital era assunto de filmes de ficção científica. Quando as fotos ficaram prontas, eu comprei uma caixa de papelão que continha seis pequenos álbuns, um pouco maiores do que uma foto 10x15. Todos os álbuns, inclusive a caixa, estampavam um mapa-múndi do final do século XVIII com tons envelhecidos de amarelo, azul e verde. Eu arrumei as fotos em seqüência e depois de um tempo, guardei a caixa na parte superior do meu armário junto com uns papéis antigos da escola e malas vazias. É engraçado, porque embora eu desse tanta importância àquelas fotografias, posso contar nos dedos quantas vezes abria a caixa e revisitei os retratos. Na verdade, eu tinha até me esquecido de alguns momentos da viagem e só voltei a pensar nisso, na semana passada, quando ouvi num programa de rádio, uma psiquiatra discursar sobre os malefícios da saudade. A médica contava histórias de pessoas que viveram presas às boas e más lembranças do passado, e que por isso, fizeram do presente, um momento para lamentações ou esperanças desastrosas. Ela falou por quase vinte minutos e depois do intervalo para anúncios publicitários iniciou o segundo bloco da entrevista ensinando truques para driblar o pensamento da saudade e das expectativas futuras. Segundo a psiquiatra, o ideal para viver bem é pensar apenas no aqui e agora. Eu ouvi toda a entrevista tentando me convencer de que a médica, com mestrado e doutorado em universidades americanas de renome, tinha razão. E por um instante, me peguei anotando mentalmente as dicas para viver o presente com plenitude. “Quando as memórias tomarem conta do seu pensamento por mais de cinco minutos e você começar a sentir um misto de tristeza e alegria, pare, respire e mentalize o seu momento presente. Pense com positividade naquilo que está vivendo.” dizia ela. E lá estava eu, dirigindo, ouvindo o programa e mentalizando o momento presente. Nas semanas seguintes, eu respirei fundo e vivi o Carpem Diem com a tal plenitude exigida pela psiquiatra e acreditem: não foi bom. Depois de um tempo seguindo as dicas da psiquiatra, eu me dei conta que estava me tornando uma adepta a essa corrente que condena a saudade, que só olha pra frente. E viver o hoje o tempo todo foi para mim muito cansativo e angustiante.
amigas em Rotterdam, 1998
amigas em Rotterdam, 1998
Há tanta cobrança em relação ao presente, tantas sugestões do que fazer, de como aproveitar melhor o momento, de como não perder a única coisa que invariavelmente perdemos ao viver. A vida é uma constante perda de tempo. E no meio dessa ânsia pela felicidade momentânea é que eu me lembrei da minha primeira viagem pelo mundo e me toquei que eu precisava abrir a minha caixa de saudades mais vezes. Pra sentir por um rápido instante, uma dorzinha de vontade de ter 15 anos novamente.

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